O presidente Lula da Silva colocou o Brasil no topo do mundo na reunião de chefes de Estado e de governo do G20 com as duas pautas fundamentais para o futuro – mudanças climáticas e combate à fome – de alguma forma interligadas. Depois de tantos equívocos na política externa, ele agora acertou o passo. O tema das mudanças climáticas vai voltar à discussão no próximo ano, também no Brasil, por ocasião da COP 30 que será realizada em Belém e que constitui o fórum mais adequado para decisões sobre os compromissos e metas de redução das emissões de gases de efeito estufa. Lula brilhou mesmo na constituição da Aliança Global contra a Fome e a Pobreza, resgatando a sua bandeira histórica e jogando o Brasil na liderança mundial num aspecto altamente sensível da humanidade. Por mais que as resoluções finais destes encontros sejam excessivamente gerais e inócuas, o presidente brasileiro conseguiu criar a aliança com a adesão de 86 países e avançou na aprovação da cobrança de uma taxação dos super-ricos para financiar o programa. Não se sabe como e por quem será cobrado, quem irá administrar, nem mesmo como será utilizada para enfrentar a pobreza e a fome. Mas a simples aprovação da taxa pela cúpula do G20 constitui ao menos um novo alerta da persistência das dramáticas desigualdades sociais do planeta, o mesmo que está diante da ameaça dos desastres climáticos.
Apesar do sucesso de Lula, difícil não ser cético em relação ao futuro. Vale lembrar que, em 2004, segundo ano do seu primeiro governo, o presidente Lula lançou uma iniciativa semelhante – a ação contra a fome e a pobreza – que ganhou a adesão de 107 países e não teve resultados concretos. Desde então, a pobreza e a fome caíram, independentemente da ação proposta por Lula. De acordo com a FAO – Organização das Nações Unidas para Alimentação e Agricultura, o número de pessoas com fome no mundo caiu cerca de 32% de 2005 a 2017 (de 798 milhões para 541 milhões). Este declínio coincidiu com a acelerada redução da pobreza na China ao longo do século XXI, resultado direto do boom econômico chinês que levou à retirada de 800 milhões de pessoas da pobreza. A economia mundial e mesmo da China dificilmente voltarão a crescer nos níveis da primeira década do século, e ainda parecem muito incertas a taxação dos super-ricos e a sua aplicação em políticas de desenvolvimento que vão além da transferência de renda. A Aliança tem duas novidades em relação à iniciativa de Lula, de vinte anos atrás: além da taxação, que pode ampliar os recursos mundiais no combate à fome, o G20 criou um escritório da Aliança no escritório da FAO, em Roma. Será que agora vai?
Não dá para ficar entusiasmada. Ai vai a frase final de Simon Schwartzman, depois de fazer uma análise de custo-beneficio da imensidão do gasto público com a reunião do Rio (“Bestializado”, Estadão, 22/22/2024, Opinião): ”Tomara que as recomendações da reunião do Rio de Janeiro se cumpram. Enquanto isso, se houver lugar, me candidato para trabalhar em Roma no escritório que o governo brasileiro vai abrir.”