O presidente Donald Trump começou o desmonte dos acordos, dos tratados e das instituições internacionais que foram negociadas e constituídas ao longo de décadas para acompanhar a intensa integração global e lidar com os problemas de escala mundial. O que está sendo anunciado como a “nova ordem mundial” representa, na verdade, um retorno a uma velha e caduca ordem mundial: a volta ao protecionismo comercial, num mundo altamente integrado por cadeias globais de valor; o impulso à indústria do petróleo e dos automóveis, na era do conhecimento e da economia digital; o abandono do Acordo do Clima, diante dos dramáticos eventos climáticos extremos, globais por excelência; a retirada da OMS-Organização Mundial de Saúde, organização fundamental para lidar com as pandemias de rápida propagação. Para não falar da xenofobia, evidenciada na deportação de onze milhões de imigrantes ilegais, que são parte importante da mão de obra integrada à economia dos Estados Unidos.
A ideologia chauvinista do atual presidente americano alimenta o sonho de uma velha hegemonia unipolar que não cabe mais no mundo, com novas potências emergentes e regionais e, principalmente, com a China ocupando posição de destaque na geopolítica global. Combinação estranha de isolacionismo – os Estados Unidos são tão poderosos que ignoram o mundo – e expansionismo – reivindicando a retomada do Canal do Panamá e outros delírios territoriais que não foram citados no discurso de posse. O narcisismo e a arrogância do Presidente, que são a expressão do norte-americano médio, levaram Trump a afirmar que os Estados Unidos não precisam da América Latina e do Brasil. “Não precisamos deles. Eles precisam de nós. Todos precisam de nós”. Os chineses agradecem e vão, sem o alarde do presidente falastrão norte-americano, ampliando alianças importantes no subcontinente. Como disse o representante da China, em Davos, a globalização é uma “tendência inevitável da História” e o protecionismo equivale a “se trancar em um quarto escuro”.
Num mundo globalizado e ainda perplexo diante da expansão da economia digital e da Inteligência Artificial, e assustado com os eventos climáticos extremos, Trump tenta empurrar os Estados Unidos para o passado. Para fazer um afago aos seus aliados das big techs, ele anunciou financiamento para o desenvolvimento da Inteligência Artificial e uma nova corrida espacial, outra lembrança do passado, para levar os Estados Unidos a Marte. O histriónico empresário Elon Musk deve imaginar-se pisando no planeta vermelho, ficando a bandeira no solo árido e repetindo para o universo a saudação nazista que fez na festa de posse de Trump. Todo este arsenal delirante de Trump pode transformar o sonho americano num pesadelo para os Estados Unidos, e para todo o planeta Terra.
Acrescente-se a tudo isso os preconceitos religiosos, a xenofobia, a misoginia, a “transfobia”, as ambições territoriais, que nos remetem à Idade Média, por um lado, e por outro à Alemanha Nazista. O gesto de Elon Musk foi mais do que emblemático.