
Terceira via
As pesquisas eleitorais mostram que uma parcela significativa dos brasileiros não quer votar em Lula nem em Bolsonaro, o que se manifesta na alta rejeição aos dois líderes da polarização política: 57% dos entrevistados afirmam que não votariam em Lula, e 56% não votariam em Bolsonaro, segundo a última pesquisa da Quest. Considerando esta rejeição consolidada dos dois polos – avalia Filipe Nunes, do instituto – o candidato anti-Lula tem um potencial de 40% de votos, e o candidato anti-Bolsonaro, um potencial de 45%. Deste modo, se não houver uma alternativa aos dois, a polarização se confirma, e os eleitores vão fazer uma escolha pela rejeição. Por outro lado, a mesma pesquisa mostra que 66% dos consultados acham que Lula não deveria se candidatar à reeleição, e 65% dizem que Bolsonaro não deveria ser candidato à Presidência (no Datafolha chega a 67%), o que indicaria que “os brasileiros estão cansados da polarização Lula x Bolsonaro” (Filipe Nunes).
Por outro lado, pesquisa do Instituto de Pesquisa DataSenado sobre o posicionamento político dos brasileiros conclui que 40% não se enquadram em nenhuma das três categorias ideológicas: 11% se consideram de Centro, 15% se enquadram como Esquerda, inclinando-se para Lula, e 29% como de direita – parte dos quais pode identificar-se com a extrema direita de Bolsonaro. O Centro tem o menor percentual de adesão porque, em última instância, também rejeita a direita e a esquerda, de modo que, somados aos 40% sem preferência ideológica, temos 51% que não têm interesse na polarização política e ideológica.
Se os brasileiros estão cansados da polarização, por que as mesmas pesquisas mostram que cerca de 30 a 40% dos eleitores ainda terminam escolhendo Lula, quando simulados cenários de primeiro turno com outros candidatos de direita ou de centro-direita (sem Jair Bolsonaro, que dificilmente pode candidatar-se)? Quase certamente porque falta um candidato que se diferencie de Lula e do bolsonarismo, e que se apresente como uma opção eleitoral viável para atrair os eleitores que não suportam mais a polarização. Para quebrar esta polarização (da qual os brasileiros estão cansados) as forças políticas que não concordam com nenhum dos dois polos devem convergir para um candidato que tenha capacidade de convencimento dos eleitores, especialmente os que não estão em nenhum dos dois lados, apresentando uma proposta política inovadora e diferenciada.
O candidato do centro-democrático deve procurar atrair parte da centro-esquerda, que não afina com Lula, e da direita civilizada, que rejeita o mentecapto Bolsonaro. A proposta política do candidato deve conter uma mensagem clara e firme de defesa da democracia e dos valores civilizatórios que estão sendo atacados pelo bolsonarismo. Por outro lado, diferencia-se da extrema direita bolsonarista, defendendo as instituições do Estado e o respeito à diversidade da sociedade brasileira e dos direitos humanos, o respeito às diferenças de opinião e de religião, evitando ser capturado pelo identitarismo. Coerente com esta posição, o candidato da despolarização deve ser um duro crítico dos governos autoritários de todas as tendências, e que violentam os direitos humanos: Trump, Natanyahu, Putin e Maduro, entre outros.
Com esta posição, de imediato, o candidato do centro-democrático diferencia-se também de Lula e do PT. Embora defenda os programas sociais já consolidados, o projeto político do candidato do centro-democrático deve entender que o Brasil não tem futuro, se continuar com 45% dos habitantes vulneráveis e dependentes da ajuda do Estado para sobreviver, ou seja, se não forem realizadas radicais redefinições de prioridades, para acabar, nos médio e longo prazos, com esta lamentável condição de miséria. O que o presidente Lula comemora – quase metade da população dependendo de assistência social – o candidato da despolarização deve lamentar, mostrar indignação com o fato de que tantos brasileiros não sejam capacitados para a geração da sua própria renda, e continuem dependentes do Estado para a sua sobrevivência. E lamentar o enorme desperdício das capacidades humanas destes brasileiros.
Enquanto o Brasil tem tantos pobres, o futuro presidente da República deve garantir a manutenção destes mecanismos de assistência social. Mas deve criticar o governo Lula, que prefere a manutenção do pobre dependente da assistência social, focando em medidas emergenciais e compensatórias, sem avançar em propostas ousadas de reformas estruturais, que mudem este cenário de vulnerabilidade e desperdício de capacidades humanas.
Em que consiste, enfim, um programa de mudança estrutural:
- Construção de um pacto nacional pela educação fundamental e média, para tirar o Brasil da indigência: quase 30% da população de 15 a 64 anos não têm capacidade de aplicar habilidades de leitura, escrita e matemática em tarefas cotidianas, e apenas 5% dos estudantes que terminam o ensino médio nas escolas públicas têm proficiência em matemática.
- Formação profissional em larga escala e voltada para as novas exigências do mercado de trabalho, focando especialmente nos jovens das famílias que dependem de assistência social, para prepará-las para o trabalho (e reciclagem dos trabalhadores em funções eliminadas pelas novas tecnologias)
- Recuperação dos jovens nem-nem (nem trabalham, nem estudam), que são vulneráveis ao crime organizado: mais de dez milhões de brasileiros jovens, de 15 a 29 anos, não trabalham nem estudam (21% da população nesta faixa etária) evidenciando um enorme e inaceitável desperdício de habilidades humanas
- Investimento concentrado no esgoto sanitário (parceria público-privada): metade dos domicílios brasileiros não tem acesso à rede de esgoto sanitário, vivendo em condições urbanas e humanas precárias e enfermiças (gasta-se muito em saúde para curar os pobres das doenças sanitárias)
- Negociação de um pacto nacional pela segurança pública, consolidando o Sistema Nacional de Segurança Pública, que combine ações preventivas, inteligência e repressão ao crime organizado, para retomada de território pelo Estado. Na Região Metropolitana do Rio de Janeiro, para citar o mais grave problema, 75% dos territórios são controlados pelo crime organizado, com poder de fogo e elevado rendimento, que vem entrando nas atividades legais para aumentar a renda dos negócios ilegais e para lavar o dinheiro sujo.
Tudo isto demanda um grande volume de recursos públicos (mesmo quando se consiga parcerias com o setor privado) e, como é sabido, o Estado brasileiro tem dificuldades fiscais graves. A proposta política deve defender o Arcabouço Fiscal do ministro Fernando Haddad e, adicionalmente, promover um entendimento político para uma reforma do Estado, que redefina receitas e despesas públicas, até para viabilizar o Arcabouço Fiscal, avançando na direção de um equilíbrio fiscal de médio prazo, evitando o aumento da carga tributária. Esta reforma do Estado tem que contemplar os seguintes pontos:
- Revisão da estrutura administrativa dos três poderes para racionalização e redução de superposições e de gastos e desperdícios excessivos, incluindo redefinição dos percentuais do orçamento para cada um dos poderes (o Judiciário brasileiro é considerado um dos mais caros do mundo, custando mais de 78 bilhões de reais por ano).
- Reformulação da política de cargos e salários dos três poderes, e eliminação total dos supersalários dos servidores públicos, principalmente do Judiciário, travestidos de penduricalhos.
- Privatização de parte das empresas estatais que atuam em áreas que não são exclusivas do Estado, combinando com concessões privadas de determinados serviços e formação de parcerias público-privadas.
- Nova reforma da previdência, para ajustar ao ritmo de envelhecimento da população, de modo a abrir um processo de redução continuada dos déficits acumulados: a Previdência Social (INSS e previdência do setor público) custa hoje um trilhão de reais, o que representa 40% de todas das despesas primárias, e a população acima de 65 anos vai crescer em uma média de 3,8% nos próximos dez anos, ampliando significativamente o número de beneficiários.
- Revisão dos incentivos fiscais (renúncia fiscal ou despesa tributária). Cerca de 600 bilhões de reais de incentivos fiscais em diversas áreas (Zona Franca de Manaus, Simples, incentivo à indústria automobilística, etc.) devem passar por uma reavaliação e revisão que levem a uma redução anual programada. A receita adicional decorrente desta redução dos incentivos fiscais deve ser destacada como um fundo adicional para o Pacto Nacional pela Educação.
Estas ideias preliminares servem apenas como uma tentativa de deliminar o que significaria o centro-democrático, ao diferenciar-se programaticamente dos dois nomes que polarizam a política brasileira. E só terão alguma validade se houver um candidato com capacidade para empolgar o eleitorado, mostrando que existe vida política para além do lulismo e do bolsonarismo.
Uma lição de Política, no seu sentido mais elevado, e um verdadeiro programa de governo.
Meus melhores cumprimentos, amigo Sérgio!
Sergio: qual a base para dizer que os brasileiros estao cansados da polarizacao, se 70% estao polarizados, de um lado ou outro? E como vao sair disto sem uma proposta altetnativa que os convença a apostar, nao em uma terceira via, mas em ima via alternativa que deixe a primeira e a segunda como oposicao? Esta proposta você sinaliza mas de forma muito generica. Nao é uma via altetnativa, apenas intencies que mesmo os dois polos apoiariam parte delas.
Alem disto, para se tranformar em sltrrnativas tëm que ter nitidez e virar tema de fala nas ruas. Por exemplo: