Apesar dos problemas sociais e, particularmente, da deterioração do sistema de saúde pública nas últimas décadas, o Brasil pode comemorar um contínuo e rápido aumento da expectativa de vida dos brasileiros. Em 1988, quando foi promulgada a Constituição, os brasileiros tinham uma esperança de vida ao nascer de 65,9 anos, e hoje, de acordo com o IBGE, os brasileiros vivem, em média, 75, onze anos mais do que viviam há quase 30 anos. Em compensação, a estrutura etária do país passou por uma profunda transformação que alterou a pirâmide, com redução drástica de crianças e adolescentes (até 15 anos) na base, e a expansão rápida da faixa de idosos no vértice. Dados do IBGE mostram que, de 2000 a 2016, a população brasileira cresceu 1,08% ao ano, sendo que a parcela de crianças e jovens sofreu uma redução de 0,63%, enquanto a população idosa (acima de 65 anos) teve um crescimento acelerado de 3,49%. Este movimento deve persistir no futuro, tornando o Brasil um país muito mais velho e com alta expectativa de vida. Segundo estimativa do IBGE, a expectativa de vida dos brasileiros alcançará 80 anos em 2040, e em apenas 24 anos os brasileiros viverão, em média, mais cinco anos. Esta, que é uma das melhores notícias do Brasil, decorre de uma variável sobre a qual não temos controle, e que define uma trajetória de grandes impactos na economia e na sociedade, exigindo mudanças radicais nas politicas públicas. Nos próximos 24 anos (2016 a 2040), a população brasileira deve crescer apenas 0,42% ao ano, mas a faixa dos idosos crescerá ao ritmo de 3,68%, ao mesmo tempo em que crianças e jovens registrarão um declínio anual de 1,15%. Em 2040, o Brasil terá mais idosos que crianças e adolescentes: 40,17 milhões dos brasileiros com mais de 65 anos, contra apenas 35,44 milhões com menos de 15. O Brasil terá mais facilidade para oferecer educação de qualidade, na medida em que as matrículas vão declinar com o número de crianças e jovens (de 2016 a 2040, esta faixa de população diminuirá em cerca de 11,33 milhões de pessoas), embora ainda tenha que fazer um grande esforço, devido à baixa qualidade atual. Mas, no mesmo período, o Brasil terá que absorver 23,28 milhões a mais de idosos (quase tanto quanto os atuais beneficiários da Previdência social), o que deve provocar uma implosão do sistema de previdência, e gerar uma forte demanda por saúde pública. Ignorar este determinante demográfico na reforma da Previdência e na formulação das políticas públicas é uma cegueira cognitiva, ou uma completa irresponsabilidade política.
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Todos sabemos que esses dados, que nos colocam em sintonia com os países mais avançados do que nós economicamente, referem-se a MÉDIAS. Em qualquer projeto de reforma previdenciária, vocês sabem disso, não se pode ignorar o outro lado da medalha: nosso país sofre historicamente de acentuada desigualdade de renda e privilégios, acumulados inclusive na previdência social. Mexer na previdência sem levar em conta, em primeiro lugar, esses privilégios, é inaceitável. Além de dar munição para as ruas, das quais a “Revista Será?”, outrora tão atenta, passa ao largo.
Caríssima Teresa:
A média também é uma forma de ver traços de uma realidade, quanto ao suposto distanciamento da Revista Será? do “clamor das ruas” tenho que dizer:
1º Você comete uma injustiça não apenas com os editores da Revista mas, indiretamente quando tenta pasteurizar todos os colaboradores numa mesma geleia ideológica que “passa ao largo” do clamor das ruas, atingindo pensadores independentes que, com muita honra, acolhemos como colaboradores;
2º Como nossa essência é, por meio da controvérsia e dos debates civilizados tentarmos revelar traços da realidade política, social e econômica da contemporaneidade, é necessário, muitas vezes, o intelectual não ser capturado pelo clamor das ruas, principalmente em meio a uma crise política e moral sem precedentes em nossa história. Mesmo que tenhamos um radical compromisso ético com a qualidade de vida e a consolidação dos processos democráticos, cabe ao intelectual por meio do conhecimento, apontar criticamente caminhos e soluções para as contradições sociais;
3º Para isso, quanto mais calcado no conhecimento e na reflexão, portanto, distante da histeria das ruas, maior a chance de acertarmos. O contrário é verdadeiro, como a história recente nos mostra, cito aqui apenas dois casos emblemáticos de grandes intelectuais que por se alinharem passionalmente ao clamor das ruas foram absolutamente capturados pela cegueira ideológica. Sarte com o stalinismo, quando Stalin com sua política de expurgo, em poucas décadas chacinou milhões de russos. O outro capturado “pelo clamor das ruas” foi Heidegger, um dos filósofos mais profundos do século XX, que era nazista de carteirinha, quando Hitler era aclamado por 90% da população alemã e Himmler já havia organizado uma força paramilitar de 4,5 milhões de homens.
Seguimos nossos passos comprometidos com a razão, fazendo uso do conhecimento e com radical compromisso em buscar discernir, numa realidade extremamente complexa que nos desafia a cada momento, onde reside o humanismo, a solidariedade e as transformações políticas, econômicas e sociais em favor da grande maioria da população.
Um forte abraço
Teresa
Você tem razão, a média sempre esconde muitas diferenças internas. Mas você também deve concordar que, desde uma abordagem agregada, a média nos permite demonstrar o tamanho do problema que, no entanto precisa ser detalhado para observar as diferenças e desigualdades. O editorial, você sabe muito bem, é um texto conciso que tem o objetivo de provocar discussão e, neste caso questionar o senso comum na sociedade brasileira que tende a ignorar alguns fatores centrais como a mudança demográfica e se posiciona em geral contra a reforma da Previdência. Eu não acho que seja papel da Revista Será refletir o movimento das ruas. O papel do intelectual, e temos a pretensão de ter uma revista que pensa, é estudar, pensar, analisar os fatos e as estruturas que não se expressam nos slogans simples e, muitas vezes, imediatistas das manifestações de rua. O editorial não discute a natureza e os conteúdos de uma reforma da previdência (nem sequer esta reforma no Congresso), o que o editorial tenta mostrar é que, sem uma reforma profunda, o Brasil vai entrar numa crise semelhante à da Grécia, para não ir tão longe, ao desastre do Rio de Janeiro (o Brasil pode ser o Rio de Janeiro amanhã). Seria interessante se você pudesse aprofundar a análise das desigualdades internas. Em alguns artigos mesmo publicados nesta Revista (e um pequeno ensaio intitulado “O nó da previdência”), eu tentei fazer isso. Aliás, eu acho que quem está contra a reforma da previdência contribui para a manutenção de privilégios que se escondem por trás das médias, como os servidores públicos e, principalmente, do judiciário, do ministério público e do legislativo que se aposentam mais cedo que os trabalhadores do INSS e têm benefícios bem superiores. Sérgio
E a reforma da previdência, meu caro João, e a reforma da previdência? Quanto às ruas, tomamos posição sim, e eu estava junto: em todas as manifestações contra o PT. Não precisa você ir tão longe com Heideggers, Stalins e Hitlers. A nossa revista nasceu para questionar o aqui e o agora. Parou de questionar quando Temer e seus ministros assumiram o poder.
Recordando:
“Pois não basta conduzir o Parlamento, é preciso driblar o Judiciário e o Ministério Público, e sobretudo, a mídia e a opinião pública. Basta o arranque da economia não pegar, os escândalos aumentarem, as ruas se manifestarem, e os atores começam a assumir outros papéis.”
Destruir a luta contra a corrupção salvando a classe política é o preço para estabilizar (se estabilizar) a economia e fazer as reformas ditas necessárias? Que encruzilhada, heim Elimar?
É necessário sim, João, olhar a sociedade em suas manifestações, concordemos ou não com elas. Será que é só o corporativismo que está por trás das manifestações contrárias a essa reforma da previdência proposta? Ou a evidência de manutenção dos privilégios? Repetindo mais uma vez o lúcido artigo de Elimar Nascimento, a história dirá.
Teresa,
Apenas um comentário pontual, pois os artigos de Sérgio têm dissecado essa matéria quase completamente, inclusive aqui na Revista. A fórmula mais segura para manter os privilégios atuais de certas categorias é obstaculizar a reforma da previdência, e deixar tudo como está. E dentro de alguns anos o sistema estará quebrado, insolvente e irrecuperável.
Mudando o sentido da famosa frase: é a política, meu caro Sérgio, é a política. Pensar a reforma da previdência baseada em fatores econômicos é apenas uma das pontas do iceberg que vem sendo questionado desde, pelo menos, o primeiro mandato de FHC. Os interesses corporativos, sindicais, claro, estão sempre impedindo e prorrogando as mudanças necessárias. A questão demográfica (lembre-se que fui editora por quatro anos da principal revista demográfica de nosso país, a Revista Brasileira de Estudos de População) é um elemento importante. Aliás, como você mesmo já chamou a atenção para isso, para o que os demógrafos estiveram atentos, perdemos uma oportunidade de ouro, quando o Brasil não aproveitou o tal bônus demográfico. Agora é tarde. Estamos envelhecendo, a pirâmide demográfica e nós próprios. Enquanto os que mais se locupletam dos privilégios da previdência, os parlamentares que discutem o projeto, o executivo, o judiciário, os funcionários públicos graduados (eu estou entre eles, professora aposentada da Unicamp) enquanto não cortarem na própria pele (não precisa você me dizer que não se mexe em direitos adquiridos, falo para frente mesmo), a patuléia, que sabe de tudo, todos farão coro a serem prejudicados quando os principais beneficiários continuam se locupletando. E essa não é linguagem panfletária não. É política. E política se faz com políticos.
Minha querida Teresa: Preciso de seu e-mail para oferecer-lhe uma bela surpresa! Falando pra frentemente, como você diz, e tendo por base a consciência de que não se pode falar em direitos adquiridos, você aceitaria discutir uma reforma do Sistema Previdenciário Nacional tendo como foco a UNIFICAÇÃO DO SISTEMA, através de um período de transição em condições a serem avaliadas ? e não conheço linguagem mais política que essa de defesa da corporação dos 58% dos pensionistas do INSS que recebem, apenas, a miséria de um salário-mínimo
Nisso você tem toda a razão, Teresa: política se faz com políticos. E por ser assim, não conseguiremos reformar a Previdência começando por cortar os privilégios do Congresso e do Judiciário, COM ESTE CONGRESSO. No próximo, talvez, pois, no mínimo, deverá estar depurado de um terço ou mais dos seus atuais ocupantes, por envolvimento com as irregularidades investigadas pela Lava a Jato. Portanto, estabelecer como condição de qualquer reforma o prévio fim dos privilégios é diversionismo das corporações e dos opositores intransigentes deste governo provisório, que querem cegamente derrubá-lo, a qualquer preço, e deixar tudo como está. Que a economia (estúpidos!) se afunde, que a administração vá ao caos, por não se poder ter, constitucionalmente, substituto melhor para a chefia do Executivo, eles não estão nem aí…
Mas nós, intelectuais, temos o dever de estar de olhos abertos, e fazer uma forcinha para abrir outros olhos, além dos nossos.
Meu caro Ivan. Não estivesse em outra empreitada com data para terminar, debruçar-me-ia (eita uma mesóclise, lembrando Jânio Quadros e Michel Temer, duas figuras antipáticas de nossa história política) sobre essa questão da previdência e aceitaria seu convite. A questão que você coloca é da maior relevância: “defesa da corporação dos 58% dos pensionistas do INSS que recebem, apenas, a miséria de um salário mínimo”. Porém, para regozijo meu, respondo a você e Clemente, assinando embaixo o artigo de Elimar Nascimento que a revista publicou hoje, 03 de abril, sem ter sido anunciado na sexta feira passada (possivelmente não foi enviado a tempo). Nesse artigo, “A incapacidade de mudar”, Elimar analisa com propriedade e competência o que eu apenas pontuei em comentários.
Estou embasbacada de encontrar apenas hoje na “Será?”, tão tardiamente, um debate mais que escorregadio a respeito da Previdência. O argumento de Teresa Sales, ao se colocar a favor das “ruas” que estariam contra a reforma da Previdência, não só é falacioso, como ignora os detalhes da reforma proposta. E que novidade é essa de que médias não têm mais significado estatístico? É demagogia dizer que não se pode reformar a Previdência sem tratar antes da desigualdade entre os aposentados. É claro que seria melhor ter um teto para as aposentadorias, e não só o piso. É claro que seria mais justo acabar de imediato, sem transição, com essa jabuticaba de que ainda temos um montão de funcionários públicos que, pela tese dos direitos adquiridos, têm aposentadoria igual ao salário integral – coisa que não existe em parte alguma do mundo. (A não ser quem sabe em Uagadugo…) Mas é mentira dizer que a atual proposta de reforma acentua as desigualdades. Quem recebe a aposentadoria mínima, igual ao salário mínimo, e que é a maioria, não terá a situação alterada. E os aposentados de menor renda já se aposentam aos 65, o limite vai atingir os aposentados de maior renda, funcionários públicos, que atualmente se apresentam mais cedo, e com frequência bem mais cedo. E é mentira, também, a tal frase que corre a internet, de que serão necessários 49 anos de contribuição para se aposentar.
Só um cego não enxerga que os atuais movimentos contra a reforma da Previdência têm clara marca corporativista. Além de serem inflados, evidentemente, pelo pessoal do “fora Temer”, o pessoal que saiu derrotado do impeachment e continua insistindo na mentira do golpe.
Acho que falo em desigualdade das aposentadorias há décadas: mais ou menos metade do que o Estado paga de aposentadorias vai para 10% dos aposentados (funcionários públicos e das estatais, é claro, que são os que agora esperneiam, e tentam manipular demagogicamente para sua causa os barnabés da aposentadoria mínima) . Isso continua porque são sempre protegidos os “direitos adquiridos”. Mas a reforma introduz mais igualdade no sistema previdenciário. É demagogia dizer que a “Será?” está passando ao largo dos mais frágeis. Desigualdade maior haverá se não se fizer uma reforma da Previdência, no mínimo a que está sendo proposta. Ou alguém acha que é mais igualitária a falência do Estado, como acontece no Rio de Janeiro e no Rio Grande do Sul quando pararam de pagar salários de funcionários públicos e aposentadorias? O “esquerdismo” é mesmo uma doença, é como um véu que tira nitidez aos dados e transforma tudo em retórica. É claro que é legítimo batalhar por igualdade neste nosso país desigual, mas ser contra a atual reforma da Previdência (ainda por cima em nome de algum ideal igualitário) é simplesmente defesa de um suicídio da Nação.
Bravo!