Para mim, desde criança, o 1º de abril sempre foi o dia da mentira. Mas naquele 1º de abril de 1964, ninguém duvidou das notícias aterrorizantes sobre o golpe militar que já vinha sendo urdido pelas forças de direita há muito tempo com o apoio dos militares e da CIA, que via na política nacionalista brasileira um risco de repetição da experiência revolucionária de Cuba.
Nós, da política estudantil, estávamos entusiasmados com as reformas de base do Governo João Goulart, reestabelecendo o presidencialismo, limitando os subsídios das multinacionais, nacionalizando o petróleo, iniciando uma reforma agrária, estendendo aos trabalhadores rurais os mesmos direitos dos trabalhadores urbanos. O comício da Central do Brasil, realizado em 13 de março de 1964, reunindo mais de 150 mil pessoas, foi o marco do apoio popular às reformas e, ao mesmo tempo, estopim da resistência conservadora que se refletiu simbolicamente na “marcha de família com Deus pela liberdade”.
Todos sabiam dos riscos de uma democracia comprometida com os anseios populares, mas não havia clareza que os militares tomariam a iniciativa de implantar um regime de exceção, depondo o presidente da República e prendendo os principais líderes identificados com o Governo deposto, inclusive o nosso governador Miguel Arraes.
Na noite do dia 31 de março o golpe foi deflagrado e o dia amanheceu com as capitais dos estados ocupadas pelos militares, com a tropa armada, inclusive tomando de assalto as sedes das organizações populares. A sede da UNE (União Nacional dos Estudantes) foi invadida e incendiada para inibir na base a resistência estudantil.
Cedo da manhã, em Recife, estávamos no pátio da Escola de Engenharia da Rua do Hospício, quando começou a chegar estudantes das faculdades de Direito, de Química, de Economia e Administração; depois gente de todo canto. O movimento crescia e se mobilizava com a notícia de que o Governador Miguel Arraes estava resistindo ao cerco militar e precisava do apoio popular para se fortalecer. De repente, cresce a ideia de que deveríamos ir todos para o Palácio do Campo das Princesas para criar uma força de resistência junto ao Governador.
Saímos um grupo já bem grande, que ia crescendo a cada passo, para tomar a conde da Boa Vista, depois a Guararapes e entrar na Av. Dantas Barreto. Não sabíamos exatamente o que íamos fazer; não havia cultura política, nem estratégia de ação que permitisse racionalizar o processo. Erámos um grupo de jovens, envolvidos com as causas cívicas, guiados pelo idealismo democrático, mas mobilizados por atitudes ingênuas; puras, mas desprovidas de expertise em ações de massa. Historicamente, esta experiência não era nova, pois desde a revolução francesa as massas têm tido um papel importante na resistência à opressão.
Entramos na Dantas Barreto em direção ao Palácio, certos do que iríamos nos juntar ao Governador Arraes para resistirmos pacificamente ao golpe e à sua anunciada prisão. Éramos muitos. Nunca tive uma estimativa clara de quantos, mas fechávamos a rua com algumas colunas, todos gritando palavras de ordem contra o golpe e a favor das liberdades democráticas e das reformas de base. Ao avistarmos o palácio, todos de braços entrançados, formando cordões humanos em todo o largo da rua, avistamos no outro extremo os militares em formação de ataque, movendo-se em passo de ganso, os fuzis em posição de ataque.
Sentimos um sobressalto, pois não esperávamos aquilo. Mas continuamos marchando sem acreditar que os soldados, que considerávamos gente do povo, fossem atirar contra estudantes. “Eles não vão atirar … eles não vão atirar”. Continuamos marchando. De repente, o som dos tiros. “é festim … é festim”. Mais alguns passos e vimos as balas ricocheteando nas paredes, nos carros. Fiquei apavorado, nunca tive tanto medo. Corri para a direita entrando no beco do edifício JK para voltar para a pracinha dos Diários, com as costas contra a parede das lojas. De repente, vi um garoto cair atingido por uma bala a poucos passos de mim, ainda na linha de tiro.
Alguma coisa mudou na minha atitude de fuga. Nunca analisei este episódio, nem nas muitas sessões de psicanálise que tive na vida que se seguiu. Foi como essas coisas que se vêm hoje como efeitos especiais. Mudou a luz, mudou o enquadramento, os tiros deixaram de existir, o perigo sumiu. Sai tranquilamente do meu abrigo e fui tentar ajudar o companheiro atingido por um tiro que lhe arrancou o queixo. Mais duas pessoas estavam comigo, mas nunca soube seus nomes. Pela narrativa de Cristovam, um deles deveria ser o professor Brotas, que eu conhecia, mas não identifiquei nem procurei identificar na hora. Só muito tempo depois soube que o nosso companheiro ferido era Jonas. Passado aquele momento, tínhamos que sair do foco dos acontecimentos. Não sermos identificados, nem identificar ninguém.
Ao chegarmos à pracinha dos Diários carregando o companheiro ferido, surge um problema: como levá-lo para o Pronto Socorro. Na cena surreal, o espírito de combate havia sido assumido por todos nós. Pulei na frente de um jipe e gritei com a mão para o alto. O motorista parou espantado e lembro que lhe disse “este carro está sendo requisitado em nome da revolução; precisamos levar um ferido para o Pronto Socorro”. Mais surreal foi o motorista concordar em nos levar. Colocamos Jonas no banco de trás no colo de um colega e nos acomodamos como podíamos para cumprir a tarefa de salvar uma vida.
A rua estava cheia de carros e de gente, com guardas de trânsito impedindo a subida na ponte. Uma das pessoas que estava no jipe desceu e foi abrindo caminho até atravessar a ponte Duarte Coelho, a partir de onde pudemos desenvolver mais velocidade. Ao chegarmos ao Pronto Socorro vimos que ele tinha morrido. Lembro que, sentado no banco da frente, olhei para o rosto dele e vi uma cena que ainda hoje não esqueci os detalhes. Seu queixo havia sido arrancado pela bala, deixando um corte transversal no rosto jovem, bonito, com a barba de alguns dias; uma barba adolescente ferida pelo terror naquele 1º de abril. Um sentimento de horror e de frustração que foi definitivo para consolidar minha identidade política e meu compromisso com a luta revolucionária que carrego até os dias de hoje.
Este texto é parte da Série 1964 – Memórias de Abril, um resgate coletivo e fragmentado da história.
Aecio
Que depoimento emocionante! Estas narrativas da mudança da luz e do enquadramento diante de um companheiro ferido e o sentimento de horror ao ver o rosto do adolescente morto são muito comoventes.
O dia da mentira deveria ser comemorado caso os ditos revolucionários, que não passavam de uns coitados ingênuos, manipulados por professores barbudinhos metidos a espertos, tivessem ganho a batalha. Basta ver o que Cuba é hoje para vermos que nossas Forças Armadas agiram certo em defender a Nação destes oportunistas, que continuam se achando democráticos. Os métodos utlizizados pelas Forças Armadas é que são questionados até hoje, mas queriam que eles fizessem o que, se estavam em uma guerra urbana, que atirassem flores? Quantos inocentes não morreram por conta destes irresponsáveis? Viva o dia 31 de Msrço e mesmo estando proibidos (isto que é democracia) de comemorarem a data, não tem como apagá-la de nossa história.
Depoimentos como este do Sr. Iramar são importantes para se compreender que a lógica fascista da ditadura ainda não foi enterrada com a redemocratização e que a Comissão da Verdade tem uma dura tarefa pela frente.
Caro Aécio
Seu depoimento, mesmo para quem não viveu aqueles momentos, eu tinha apenas 10 anos, me emocionou. Destaco, acima de tudo, o gesto de generosidade próprio de um jovem idealista. Hoje, mesmo tendo uma democracia já consolidada, outros fatores impulsionam a força vigorosa da nova geração. Talvez, menos aparelhada intelectualmente (há o velho Marx…) questões como sustentabilidade ambiental do planeta, defesa dos direitos de minorias, etc..
O outro lado da moeda é a sociedade da indústria cultural com seu consumismo hediondo formando novas gerações impossibilitadas de se pensar modelos alternativos de sociedade e política. É aí onde reside o ovo da serpente do neofascismo como o de Iramar.
Finalmente, destaco sua alusão às sessões de análise, as quais serviram não para esquecer o fato traumático, mas sim para saber lidar com ele, forjando-o como adulto, ainda generoso e idealista.
Parabéns por compartilhar seu artigo com todos nós.
Forte abraço.
João, me desculpe mas você sabe muito bem o que é fascismo e o socialismo é que é seu semelhante, ao querer fazer o estado como o senhor de tudo. Sou um adepto do liberalismo e da democracia, onde o governo tem que fazer o seu dever de casa (que não faz) e cada um que aproveite as oportunidades e vença na vida. Não queremos um estado como babá do povo, querendo dizer o que cada um deve fazer e lhe concedendo esmolas, como é feito hoje por estes pseudo-democratas que estão no poder. Chamar-me de neofacista é uma ofensa. O ovo da serpente está nas universidades onde repito o que escrevi anteriormente, os professores barbudinhos continuam fazendo a cabeça de jovens vazios, usando-os como seus capachos, da mesma forma que fizeram para pegarem em armas, achando que estavam lutando por um mundo melhor. Taí o exemplo de mundo melhor em Cuba, Venezuela, Coréia do Norte e tantos outros paraísos.
Caro Iramar
Lhe conheço como empreendedor de valor, aquele que investe com inteligência toda sua energia, junto com esposa e filhos para produzir valor com sua empresa.
Seu outro lado, que eu desconhecia, é o de um perfil político conservador, calcado como dissestes, na visão de mundo liberal. Não tenho nada contra, aliás, o objetivo da revista é, através do confronto das ideias, enriquecermos nossa forma de vê as coisas do mundo. Isso de uma forma civilizada sem descambar para agressão, pois nesse terreno a paixão vai imperar impedindo que a razão produza algo de valor para ambas as partes.
Se tiver cuidado em nos ler vai perceber que este exercício da critica é vivo entre nós, os editores.
Com o seu grito “Viva o dia 31 de Março!” postado no texto Aécio, houve da sua parte uma extrapolação irada, sobre um tema delicado que foi a morte de um jovem e o esmagamento brutal, por parte de um Estado autoritário de duas gerações, pelo menos. Não estou aqui defendendo se o Estado autoritário é melhor de direita ou de esquerda, Ambos são retrocessos gravíssimos no processo civilizatório, impedindo a expressão criativa dos cidadãos, usando a tortura como método sistemático de investigação policial, Enfim, exaurindo a vida, deixando-a no seu estado mais abjeto de submissão do sujeito diante do Estado.
Retiro o termo neofascismo, posto que exagerado. Certamente uma resposta irada a uma critica irada.
Entretanto, sua atitude despertou em mim uma importante questão: Quantos Iramares, intrépidos empreendedores, mas com essa visão política conservadora tem em nossa sociedade? Que tipo de ideologia forjou-os? São muitos? Isso é parte relevante do mundo empresarial?
Tenho algumas pistas e uma delas você mesmo apontou que é a visão de um Estado Liberal ausente da produção onde na visão do empresário “O Governo deve fazer seu dever de casa e não faz”. Não existe essa figura de Estado, como também nunca existiu o Estado puro do proletariado, uma vez que os burocratas soviéticos passaram a ser a nova elite da revolução. A produção e seus meios (empresas, etc) é suportada pelo Estado e sua leis.
Esse Estado “ausente da produção” é o mesmo que estabelece um regime de leis que permite, por exemplo, a exploração, por parte do dono a da empresa da força de trabalho de seus trabalhadores. A suposta liberdade tão reclamada pelo empresário tem como contra ponto o aprisionamento do operário como objeto da sua linha de produção. É da força de trabalho dele – incluindo a do dono – que se produz o valor.
Como vês, estamos diante de um grande enigma sobre o papel do Estado na sociedade. Não há certeza, apenas dúvidas. O certo é que precisamos confrontar certas verdades, questioná-las, rever a história, mergulhar nos clássicos, atualizar-se com os temas atuais, para daí tentarmos jogar alguma luz nessa indevassável escuridão onde nossa humanidade está aprisionada.
Saudações,
Lógica fascista é a utilizada pelo socialismo, basta ver os exemplos no mundo todo onde esta ideologia foi implantada. Comissão da verdade de um lado só? Este é o modelo de democracia que estes oportunistas espertalhões sonham. Pensou diferente deles, paredão.
João.
Agradeço por suas palavras e peço desculpas se fui mal interpretado. Em momento algum ao enaltecer o dia 31 de março quis menosprezar a morte deste jovem idealista da época, mas enfatizar que achei correta a atuação das Forças Armadas em repudiar a tentativa de implantar uma ditadura socialista, que traria muito mais mortes com certeza. Também não sou adepto a nenhuma ditadura, mesmo que a chamem de ditabranda.
Falar em torturas usadas pelo militares também é relativo, pois foi também utilizada pelo outro lado, inclusive com assassinatos a sangue frio de ex-seguidores, mas no entanto, estas comissões só querem investigar um lado. Como poderemos confiar na isenção?
O que não consigo entender é com todos os exemplos que o mundo mostra, como pode haver pessoas inteligentes e esclarecidas, como as que escrevem por aqui e mesmo amigos e parentes, defendem com tanta veemência esta ideologia ultrapassada?
Como já disse anteriormente, acho que o governo deve fazer seu dever de casa, ao oferecer a todos serviços de qualidade em educação, saúde, segurança e infra estrutura, mas como não faz isto, começam a haver as desigualdades e que só pioram quando uns podem pagar por isto e outros não e não vai ser com medidas eleitoreiras através de cotas, bolsas e outras medidas absurdas que vão resolver isto. A meritocracia tem que existir.
Não sou contra as leis que são criadas para ordenar a sociedade e as cumpro, mesmo as que sou contra. Acho que o Estado tem que fiscalizar as empresas e coibir abusos de trabalho escravo ou mesmo exploração por lucros absurdos.
Não trato minha equipe desta forma e pode perguntar a qualquer um o quanto são satisfeitos em trabalhar comigo. Conheço vários colegas de profissão que já me disseram que sonham em um dia fazer parte de minha equipe.
Acho muito importante o debate de ideias e por isto que sou bastante participativo tanto na internet, quanto na mídia escrita, apesar de ainda quererem acabar com a imprensa livre.
Precisamos sim usar a história, para que não repitamos os erros de gerações anteriores à nossa e possamos deixar um mundo melhor para nossos filhos e netos.
Abraços e parabéns pela revista.
Iramar
Iramar. Sua lucidez diante deste artigo só prova que não apenas vivestes aqueles anos de chumbo, mas também que sabias, assim como eu, que se os militares não tivessem intervido, hoje talvez não estivéssemos vivos para contar a história. Os vencidos naquele período voltaram e estão querendo apagar a verdadeira história. A Marcha da Família com Deus Pela Liberdade, varou o Brasil de norte a sul e foi uma maneira das familias, tradicionalistas ou não, pedirem aos militares que acabassem com a baderna em que estávamos vivendo. Com muito orgulho eu participei dela aqui em Recife.
Aécio,
Muito importante lembrar fatos como este. Belo depoimento. Lembro bem do dia e de meu amigo Jonas. Não estava lá no momento do tiro. Cheguei depois, e só vi a poça de sangue. Não imaginava de quem seria. A informação, e o enterro, me emocionaram. Tudo que pude fazer foi abraçar seu irmão, Carlos Augusto. Vale lembrar.
Jonas caiu aos meus pes.Até hoje me sinto mal quando me lembro do absurdo. Uma cena traumatizante e inesquecível. Fui uma das pessoas que ajudaram a levar o heroi ate o jipe que o socorreu.
Meu caro Aécio, sua narrativa a um só tempo objetiva e emocionada sobre a sua vivência naquele dia histórico, me comoveu sobremaneira. Revela uma dilacerante tragédia humana e desnuda um terror que não imaginávamos existir tão perto de nós. Abraço fraterno.
Em tempo: Parabéns aos que fazem a Revista Serà? pela iniciativa.
Grande Aécio: é muito tênue a fronteira que delimita dentro do homem os impulsos básicos da coragem e do medo. A vida nos demonstra isso em milhares de exemplos. Mas a narração que vc faz, a partir de uma vivência concreta, da passagem de um momento a outro, é um achado poético fascinante: “Mudou a luz, mudou o enquadramento, os tiros deixaram de existir, o perigo sumiu.” Simplesmente, antológico. Parabéns pelo texto. Obrigado por nos transmitir – e nos permitir – emoções tão densas, quanto verdadeiras.
êta piadinha safada essa do 1º de abril de 1964! Como custou ao país; como nos custou. O relato do Chico de Assis nos recoloca naquele cenário, naquele momento. Eu estava (como ainda estou) no Rio, mas não foi muito diferente. Talvez em Pernanbuco a repressão tenha sido mais violenta nesse primeiro momento do Golpe. O episódio do Gregório Bezerra foi aterrorizante, como diz o Leonardo Chaves e já anunciava as práticas que a ditadura iria instituir. Parabéns, grande Chico, por manter a memória ativa e alerta. Parabéns à revista Será?
Caro Aécio, confusão louca no site – li o artigo do Chico de Assis e postei o comentário, que saiu linkado ao seu (Aécio) artigo. Daí, li o seu artigo, comovente, e alguns comentários. Os de Iramar me impressionaram, porq repetem a falsa tese de que só “cruéis assassinos terroristas” se opuseram à ditadura, que, por sua vez, só prendeu, torturou e matou os tais “cruéis assassinos terroristas” por estar acuada, sem outra saída. E, mais, defendem que “os dois lados” sejam investigados e julgados pela Comissão da Verdade. Tal o sr. Iramar não saiba que a ditadura civil-militar implantada em 1964 perseguiu, demitiu, prendeu, cassou, estuprou, censurou, torturou e matou todo tipo de opositor que encontrava. Fez isso com comunistas, socialistas, democratas-cristãos, liberais e até apolíticos. Fez o mesmo com artistas, médicos, jornalistas, metalúrgicos, petroleiros etc. etc. etc. que cometeram o “crime” de atuar em seus sindicatos, com diferentes níveis de militância. Fez com donas de casa, estudantes, padres, camponeses, militantes pacíficos ou não. Fez, creia, até mesmo com crianças como o menino Carlos Alexandre Azevedo, o Cacá, torturado quando tinha apenas 1 ano e 8 meses, na sede do Departamento Estadual de Ordem Política e Social (Dops) em São Paulo, onde estavam presos os seus pais, em janeiro de 1974O. O que o sr. Iramar chama de “o outro lado” – os opositores da ditadura, independente do grau e do tipo de atuação – foi, sim, investigado e duramente punido. Milhares foram os que passaram pelos porões onde o Estado agia criminosamente. Milhares foram presos e condenados; centenas foram eliminados da maneira mais cruel e vil. Seria importante que o sr. Iramar pesquisasse e buscasse conhecer melhor essa página tenebrosa da nossa história, para que não mais repita teses ocas criadas para esconder a história.
Me impressionou a clareza com que Graça Lago colocou a questão sobre a posição de Iramar.
Forte e contundente como deve ser, entretanto, repito aqui, esse desconhecimento ou interpretação simplista da nossa história recente está relacionado ao fato de “O Golpe Militar de 1964” não ter sido bem assimilado nos bancos escolares das novas gerações. Temos muitas teses de mestrado sobre o tema, mas isso não chega à sociedade como deveria chegar. Para o grande público é coisa de intelectual barbudo.
É preciso ensinar formação política nas escolas.
Não estou falando aqui de dar uma versão vencedora ou justificar os atos da esquerda ou da direita. Falo de algo mais profundo que é o subterrâneo de um Estado de Exceção, ditatorial.
Se Hobbes e outros pensadores justificam o Estado para conter a pulsão destruidora dos homens, os subterrâneos (ou porões) de um estado autoritário é o anti-estado, no qual a pulsão perversa – sem lei, ou amparado pela ausência destas – destruidora do ser humano explode sem freios na tortura do outro. Solta-se a Besta humana com toda sua ferocidade primitiva gozando sadicamente sobre a destruição do outro.
E aí não tem ideologia ou qualquer tipo de causa, é pura pulsão.
Esta besta tem seu rastro de terror espalhado no passado, ao longo da história da humanidade e no presente onde não há liberdade de expressão.
As ideologias e o Estado são expressões pálidas de algo assustador: o horror do humano.
Foi assim com a Santa Inquisição, foi assim com o stalinismo e será sempre onde não houver sociedade livres e abertas.
O texto do Aécio é fantástico. É na verdade, um relato de guerra, de uma guerra que não houve. Se alguem o lê sem saber do contexto, pode imaginar que se tratava da Bósnia, sem dúvidas.
O Sr. Iramar comete alguns erros comuns à ditadura: aquela multidão não lutava por uma Republica Socialista, nem pela Ditadura do Proletariado. Ela queria lutar pela manutenção do mandato de um governador eleito. Esta era a luta ali, embora pudesse ter diversos militantes que queriam muito mais em outro momento. Não tivemos, em nenhum momento, manifestações populares que não fossem democráticas, republicanas. Outra coisa foram os enfrentamentos militaristas.
Outro erro tambem do Sr. Iramar, e que os militares insistem, é que a Comissão da Verdade só ouve um lado. Mas o que está em julgamento? O Estado! É o Estado que cometeu abusos, torturas, assassinatos, e o que nos interessa (e a todo brasileiro) é que o Estado seja purgado destes desvios, destes absurdos, da tortura, do terror. Do ponto de vista democrático, observe-se que a Inglaterra enfrentou o IRA durante mais de 20 anos sem precisar se tornar uma ditadura. Então, a luta democrática passa pela ¨limpeza¨ do Estado.
Senhores:
Apenas uma pequena observação:
A Inglaterra usava de legislação especial ao julgar os membros do IRA e seu braço mais radical, o temido Provisional Independent Republican Army(Provos).
Não havia a figura do habeas corpus e qualquer indivíduo que fosse encontrado com armas,artefatos explosivos ou ou mesmo panfletos era submetido a interrogatórios continuados e com tortura física e mental.
A [lúgubre]prisão de Long Kesh, situada no interior de uma base militar, foi palco de uma grande greve de fome dos presos(1981), o que obrigou o governo britânico a revisar os métodos de repressão e interrogatório adotados. Por derradeiro, a verdadeira cadeira do dragão, grandemente utilizada na Irlanda do Norte, foi rejeitada pelo governo do Brasil. (Recomenda-se a leitura dos livros do Elio Gáspari, onde este tema é tratado desapaixonadamente).
Outra lenda urbana muito difundida aqui no Brasil é que o combate aos grupos extremistas na Europa dos anos 70-80(Itália, Alemanha e França)era feito dentro das mais puras regras de um Estado democrático.(Como diriam os italianos: democratico ma non troppo).
Atenciosamente
Mas a violência continua todos os dias depois do fatidico 01 de Abril de 1964, apenas esta maqueada e coberta por uma veste mais discreta. Mesmo tendo pessoas conscientes e politizadas saindo nas ruas e reivindicando seus direitos (e um bom tanto de baderneiros inconsequentes), nada ou pouco conseguem, logo estão preocupadas com fatos mais urgentes, ligados a própria subsistência. Vivemos num torpor intelectual induzido pelos governo e midia que continuam controlando a população com factóides, mentiras, medidas polpulistas e eleitoreiras, educação medíocre, saúde de caixão e exploração do trabalho, e sim, ainda morrem pessoas em porões escuros por interesses escusos do poder. Me desculpem se não consigo conter as palavras extremadas, mas nasci em 1971 e desde então vivo em um país com um povo simplório, acomodado e obtuso governado por hipócritas e gananciosos. Queria que houvessem mais jovens Aécios nos dias de hoje, estaria pronto a levar um tiro por mudanças significativas e concretas em nosso país!
Caro Sandro
Muita coincidência; entrei hoje nesta matéria pra ver se havia mais algum comentário. Ai encontrei o seu postado hoje mesmo.
Tenho matutado muito sobre o controle social pelo poder (máquina governamental, meios de comunicação, hábitos consumistas,…) e a acomodação da maioria silenciosa. Pessoalmente, não vejo muita saída a curto prazo, pelos caminhos convencionais (eleições, instituições com legitimidade social, …), mas acredito que haverá uma evolução pela pedagogia crítica que começa a crescer em muitas escolas dos sistemas de educação público e privado, formando jovens mais conscientes e com mais informação sobre questões que, apesar de Paulo Freire, nem se colocavam na maioria das escolas no ano em que nascestes. Tenho trabalhado com professores (as), cujo objetivo pedagógico é a formação de sujeitos socialmente articulados e comprometidos com referenciais críticos e democráticos. Vejo esse poder da informação e da consciência social em meus netos de 10 e 7 anos.
Neste sentido, creio em adolescências corajosas e mudanças profundas num futuro próximo, sem que se precise correr risco de vida para isso. É preciso continuar lutando, tanto na minha geração, como na sua e principalmente na dos seus filhos e dos meus netos. Bola pra frente.
Esta certo, bola pra frente, jamais quis ver meus filhos ou o de qualquer outra pessoa ter que passar por tais horrores, todavia, não tenho tanta certeza quanto a um futuro pacifico com o número de miseráveis e excluidos aumentando com descasos do nosso governo e empresários.
Esperança é a última que morre, mas também morre!
Obrigado por suas palavras e exemplo Aécio, continuarei torçendo e trabalhando por um Brasil e um mundo melhor para nossos filhos, netos!