Outubro de 2013
O Morro de São Paulo tem à noite, na Segunda Praia, a área de shows e bares, mais para quem gosta de som alto e misturado. Um dia antes tinha havido um show evangélico com caixas de sons enormes. Se estivéssemos em um dos hotéis da área teríamos fugido da ilha, a nado, noite adentro. Ou então teriam nos convertido.
Mas na Primeira Praia, aquela do atracadouro, tem a Rua Caminho da Praia. Lembra a Rua principal de Porto de Galinhas ou de Pipa, com uma enorme diferença: no seu final tem uma praça. Sim, a rua termina na Praça. E, para mim, que vivi minha infância na Praça Cel. Porto em Caruaru, foi uma prazerosa descoberta. Caminhar sem pressa, vendo as pessoas – todas leves e simpáticas -, os restaurantes e bares alinhados com as lojas de roupas para, no final da Rua, sentar em um banco de praça e pensar em nada. Se há uma grande perda na qualidade de vida de quem vive em grandes cidades, além do isolamento em seus apartamentos e do infernal trânsito, é a perda do hábito de sentar em uma praça à noite e jogar conversa fora com amigos e desconhecidos.
Aos poucos vamos conhecendo aqueles ricos personagens (e cada qual no seu canto, em cada canto uma dor – espero que Chico Buarque não venha me cobrar por citar parte da sua música.), como o garçom argentino Ale, extrovertido e apressado, que trabalha no Restaurante El Sítio, pertencente a um chileno. Ou o famoso pastel da Praça que fica numa barraca em frente ao Restaurante do chileno. O dono, com seus quarenta e poucos anos, não se envolve na produção nem na venda dos pasteis. Toca seu violão e canta os clássicos da MPB, Rock e outras músicas que atraem, sempre, um grupo de turistas em volta dele, cantando e dançando. No carrinho de pasteis, soube depois, tem um amigo dele (pelas barrigas pensei que fossem pai e filho) que fica trabalhando, sempre sem camisa e suando que só gota, por conta do calor do fogo da carroça. Pois bem, o pastel suado vende muito!
Mais adiante encontro um simpático pós-hippie e intelectual com enormes cabelos batendo na cintura com dreadlocks. Pelo sotaque vejo que é carioca. Tem seus 50 anos, é alto, magro e culto. Uma figura! O que faz? Vende livros usados espalhados pela calçada e, pelo que observei, o único que lê os seus livros é ele mesmo. Do outro lado da rua conhecemos a simpática Lúcia, italiana com seu excelente Restaurante Enoteca Mediterrâneo.
Encontramos uma barraca vendendo caipiroska de cacau. A baiana, muito simpática, preparava incansável seu coquetel com habilidade e o servia dentro da casca do cacau, fruto que tem belas cores e textura.
É lugar para não se pensar em trabalho ou qualquer outra fonte de estresse. Planeja-se cada dia de acordo com o nosso desejo imediato de fazer um passeio, ir a uma praia mais distante ou simplesmente ler um bom livro na rede com vista para o Farol da Ilha. Naquela rua caminha-se leve junto com a população local e turistas de várias nacionalidades, todos implicitamente pactuados em viverem os prazeres da ilha, aqui e agora.
No final da rua, em direção a nossa pousada, perto de uma ladeira, tem um simpático Café com crepes, doces e tudo de bom para se encerrar a noite. Todo de madeira, o Café tem uma atmosfera acolhedora. Apelidei-o do Café da Ladeira da Preguiça (Eita, essa é de Gil), pois, depois de jantar e beber, é com um passo lento que descemos aquela ladeira em direção à nossa pousada.
P.S. Na última crônica vou contar sobre o Capitão Pipoca e nossa “fuga” pelo ar.
DITOS & ESCRITOS
João Rego
joaorego.com
Belíssima crônica, João Rego. Morro de São Paulo é mesmo um lugar para viver em paz e desfrutar de belezas inesquecíveis!
João
A descrição do acontecido nos remete a esta tb visita ao morro de SP., com alguns detalhes que facilita Ao emtendemtov
Belíssima cronica, Mestre João Rego Factta Project…muito mais gostoso de ler do que suas outras escritas…Parabéns!!! Deverias escrever muito mais cronicas. Beleza!!!