Dizem. Quem compra qualquer pedaço de terra, granja, chácara, casa de campo, como segunda opção de moradia/recreio, tem duas felicidades: uma quando compra, outra quando vende.
Já sabia disso quando comprei a casa num condomínio de Aldeia. Mas não imaginei que o processo comigo seria tão rápido. Como uma paixão fugaz, que não tem paciência para esperar o amor.
Minha fantasia, na verdade, era mais ousada do que uma simples casa num condomínio. Queria uma terra no Agreste para cuidar de cabras. Cuidar? Enganei-me no verbo. Já que é fantasia, vamos rasgá-la de uma vez. Meu desejo era ficar deitada numa rede no alpendre da casa olhando as cabras passarem, apascentadas pela pessoa que delas cuidasse, um pastor, como nos tempos bíblicos. Só isso. Ouvir chocalhos e passarinhos.
As cabras teriam nomes, pois não eram para comércio. Leite somente para fazer queijo e para consumo. O terreiro na frente de casa teria uma baraúna e um juazeiro. Daria um estatuto superior aos velames, que teriam canteiros bem estrumados, como se fossem roseiras, para eu sentir o perfume de suas folhas de inverno a verão. Um caramanchão para trepadeiras de jasmins e bouganvilles. E ao redor do alpendre, muitas flores coloridas, entre cravos de defunto e Marias sem vergonha.
O sonho não resistiu ao primeiro impacto de realidade. Mas foi substituído. Mudou de Bezerros para Aldeia. Como se fosse a preparação de uma viagem, em que a gente sente um prazer antecipado, fui ver casas para comprar. Dizem também, os corretores: pode demorar, mas toda casa tem o seu dono. A de Aldeia pela qual me encantei estava à venda há meses, justamente esperando a futura dona.
É uma casa grandona e esquisita, porém com três atributos ao seu redor que me levaram a uma paixão à primeira vista. Encravada na mata pelo terraço de trás, a casa tem uma bica ao lado e um grande terreno na frente e nos oitões que a deixa em total privacidade em relação aos vizinhos.
A cada melhora, a cada reforma, as alegrias se renovavam, como se a casa estivesse me retribuindo o que eu lhe proporcionava em seu embelezamento. Passei a freqüentar os armazéns de construção com um gosto semelhante a quem escolhe presente para alguém especial. Arrumar cada espaço da casa me dava o sentimento de estar brincando de casinha.
Compartilhei esse prazer com meus convidados para almoços e festas, que a casa recebia satisfeita como eu.
Ela se fez bonita pelas minhas mãos e gosto, com a colaboração de Marília, arquiteta e amiga. Um deck na bica; bancos de madeira no terraço; cimentados decorados com ladrilho hidráulico; a sombra perfumada do jasmim trepadeira; revestimento de muitas áreas externas com vegetação cor de vinho roubada da mata.
Nela tenho uma gatinha branca chamada Mimi. Nela acendi fogueiras para Santo Antônio. E nela comecei a escrever ficção. As primeiras personagens nasceram e se criaram na casa, com as janelas abertas para canteiros floridos ou noite escura.
Por que acabou o encanto? Por que o prazer de brincar de casinha em um momento passou a obrigação em outro? Tão parecido com os desenganos de amor…
Bonito, Teresa.
Triste conclusão…
Que pena que seu encanto acabou. O meu encanto transformou-se em luto, tenho de sair de lá, procurando um outro canto para encantar-me…
Não pelas baraúnas, ou juazeiros, ou voluptuosas bicas, na borda da mata colorida e tropical. Não pelos pastores, nem bíblicos, nem contemporâneos, com ou sem caprinos odores. Quanto a felicidades, paixão fugazes, e amores que não se firmam, sugiro para o caso de amar na compra e venda dos sentimentos pelo espaço e o viver; volto a recomendar: o mercado de capitais, lá se manipula com certo encanto, ordinárias e preferenciais, diariamente aos bilhões.