Mais de um milhão de pessoas numa manifestação de ruas em um belo domingo de sol tem muito mais significado político que os 51 milhões de votos da oposição nas últimas eleições. A concentração desta enorme massa de brasileiros, convergindo para uma concentração em torno de bandeiras, mesmo difusas e até contraditórias, requer a mobilização de uma grande energia social que, por outro lado, depende de uma clara motivação política. A última pesquisa do Datafolha sobre a aprovação do governo parece confirmar a indignação ou o desencanto com o PT e com a Presidente Dilma Rousseff: em apenas três meses, a rejeição ao governo – classificação como ruim ou péssimo – saltou de 24% para 62%. No Nordeste, reduto petista seguro, que deu 70% dos votos a Dilma, esta rejeição chegou a 55%. E o mais significativo, para derrubar certos argumentos, foi a avaliação da população mais pobre (renda de até 2 salários mínimos): em dezembro, 60% avaliava como ótimo ou bom, percentual que despencou para apenas 15% neste mês de março. O governo federal não parece ter entendido o recado, a julgar pelas declarações do ministro Miguel Rossetto, representando a presidente, de que os manifestantes eram aqueles que não votaram em Dilma. O fator central de mobilização foi o protesto contra a corrupção que domina o país, corrupção essa que hoje está claramente identificada com o PT e o governo Dilma. A insatisfação com a presidente é reforçada pelo descontrole da inflação e pelo sentimento de traição com as promessas de campanha. A mobilização do dia 15 expressa também uma desconfiança geral para com os políticos (outra pesquisa Datafolha realizada durante a manifestação indica que 14% estava nas ruas protestando contra os políticos e 20% diretamente contra o PT). Agora, passada a comoção dos protestos, emerge uma inquietante pergunta: que lideranças ou forças políticas podem capitalizar e organizar esta indignação geral e imprecisa para promover as mudanças políticas e sociais no Brasil? Aparentemente, nenhuma. E este é o dilema do Brasil neste momento. Faltam lideranças responsáveis e reconhecidas para organizar o sentimento coletivo em torno de um projeto de futuro do Brasil.
temos que passar o brasil a limpo!
fechamento do congresso banimento de
todos os políticos um presidente escolhido
pelo povo para o povo.
Apenas um reparo. O domingo foi de chuva em São Paulo,
Abraham
Chuva intermitente, e fraca na Paulista. Na maior parte do tempo não choveu.
O que de fato precisamos é de reforma política mas, feita com dignidade, com vistas para o futuro e não por esse congresso que aí está que, tido que for votado, será sempre em benefício próprio.Que se convoque uma constituinte, só para essa finalidade e que, após, se dissolvida e não fique como a nossa Cosntituição que ainda tem mais de 20 itens a serem regulamentados.
O que se faz necessário é uma reforma política, desde que não seja por esse congresso que aí está, que só votará em benefício próprio. Que se convoque uma constituinte para essa finalidade e se dissolva depois de tudo pronto.
Começo com uma discordância: não concordo com a afirmação (espécie de “a priori” para o que se segue no editorial)de que mais de um milhão de pessoas nas ruas é mais significativo do que 51 milhões de votos depositados nas urnas. Não se trata de nenhuma afirmação revolucionária. Ao contrário, chega a ser conservadora: é uma rendição frente às inocências da minha própria juventude (a mesma dos meus queridos amigos da Será…) e um reconhecimento maduro das qualidades positivas da democracia representativa. Multidões nas ruas não me comovem mais. Como, por exemplo, não me comovem os milhões nas ruas nas paradas gays frente ao que de fato é importante: o reconhecimento de uma identidade homossexual, que a meu ver tem muito pouco a ver com os gays cheios de trejeitos e línguas de fora que a imprensa gosta de destacar nessas paradas… Me lembram “as virgens de Olinda” – uma brincadeira de carnaval, a que não dou nenhuma importância quando penso no que de fato está em jogo.
Enfim!
Isso dito, essa história de “passar o Brasil a limpo”, e de que precisamos de um “presidente escolhido pelo povo e para o povo”, como diz um dos comentadores, é muito inocente. Ninguém passa a realidade a limpo; e essa história de governo “pelo povo e para o povo” é discurso (no caso, no bom sentido da palavra) de Lincoln. Nenhuma das duas coisas se realiza na realidade (a tautologia é proposital). Historicamente falando, as tentativas modernas de fazê-lo terminaram em tragédias terríveis, com muito som, muita fúria, e muito sofrimento. A democracia é isso: um regime “frágil”. As tentativas de torná-la musculosa só deram em m***!
A democracia brasileira está funcionando. As instituições brasileiras estão funcionando. Deixemo-las fazer seu trabalho.
Uma última coisa: não estou defendendo Dilma. Estou defendendo as instituições brasileiras que elegeram Dilma. Se foi com a ajuda do meu voto, isso não tem a menor importância. Foram essas mesmas instituições que (obviamente sem meu voto, pois não sou senador nem deputado) elegeram Renan Calheiros e Eduardo Cunha. Pessoalmente, acho isso deplorável. Mas isso também não tem importância em termos agregados. São as instituições que estão funcionando. Deixemo-las funcionar.
Quanto ao resto… Que fazer? Fico no meu canto escutando (quando tenho saco, o que não é frequente) a “tagarelice da caverna”, como disse um dos grandes pensadores do século XX, Heidegger, que quando se meteu na política fez isso mesmo: m***!
Luciano Oliveira
Luciano
Acho que não interpretou corretamente a afirmação de que um milhão de pessoas nas ruas tem mais significado político que 50 mlhões de votos. O significado político, evidenciado pelas preocupações dos políticos e do governo, decorre da energia necessaria para a mobilização, muito superior a uma ida à urna num voto, alem do mais, obrigatório. Dizer isto não se está pensando rejeitar a democracia representativa por alguma forma de democracia direta que, rigorosamente, so existe e funciona em pequenas comunidades, nunca num pais do tamanho do Brasil. Além do mais, excetuando alguns manifestantes isolados, nao houve nenhuma proposta de desmonte das instituições democraticas. Mesmo que, pessoalmente, nao acho adequada a proposta de impeachment, este é um instrumento democratico, tanto defender quanto realizar. Os protestos foram contra as distorções evidentes das instituições democráticas, sem querer destrui-las mas questionando a corrupção que domina nestas instituições, o negócio em que se transformou a politica no Brasil.
Pura bobagem tanto entusiasmo com o mais de um milhão! Qualidade é o que importa! E na sexta-feira, 13, os parcos números de cinquenta e cinco mil pessoas noticiados pela nossa tão “maravilhosa” imprensa, dizem incomparavelmente mais do que os arranjos globais! Saca? “Vocês vão ter que me engolir”!!!! Quem falou isso? Lula, quando foi eleito, quando mesmo? Vocês viram as fotos das pessoas na manifestação convocada pela CUT, com guardas-chuvas e capas numa vibração torrencial? Dia 13! 13, número inconfundível!Nem mesmo com mais de um milhão!!!! Pode demorar um milhão de anos, mas que chegaremos lá, disso estou certa. Talvez até antes!
Oi, Sérgio!
Obrigado pela atenção.
De fato, mobilizar um milhão de pessoas, que não têm a obrigação de estar em praça pública (diferentemente do comparecimento eleitoral, que é obrigatório), pode parecer mais significativo do que uma eleição.
Continuo, entretanto, com uma pequena, sutil, dúvida: será realmente tão significativo assim mobilizar pessoas para irem a uma manifestação nesse mundo em que, via redes sociais, o esforço de mobilização já não é o que era antigamente?; e para um evento em que todo mundo sabe que será hiper-mediatizado?…
Além do mais, lembro que essas últimas eleições foram tão polarizadas, os nervos (inclusive alguns ódios…) estiveram tão à flor da pele, que a obrigação do voto adquiriu um sentido talvez ausente em outras eleições passadas. Aliás, achei a polarização uma coisa boa: ela trouxe à luz alguns rancores da sociedade brasileira normalmente jogados embaixo do tapete da nossa velha cordialidade…
Quanto ao resto, meu amigo, estamos no geral de acordo. Achei infeliz a observação de Rossetto etc. Quanto à traição das promessas de campanha… Ah! Lembrai-vos de Sarney, lembrai-vos de Collor, lembrai-vos do segundo FHC… Lembrai-vos até de Obama e, agora, dessa figura horrorosa cujo nome nem sei escrever direito: acho que é Nethaniahu.
Enfim, aqui estamos diante de uma das grandes enrolações da política institucional no mundo moderno, razão pela qual, como sabe o amigo, num certo sentido detesto-a; e noutro, infelizmente, adiro, porque não vejo o que colocar no lugar.
“O importante é que nossa emoção sobreviva”, como diria o poeta.
Luciano Oliveira