Editorial

Na mesma semana em que nomeou a ex-deputada Fátima Pelaes – evangélica que rejeita o abordo mesmo em caso de estupro – como secretária da Secretaria Executiva de Políticas para Mulheres, numa aparente provocação ao movimento feminista, o presidente Michel Temer apoiou aumento de salários dos servidores públicos federais, na contramão do esperado e prometido ajuste fiscal no meio de uma grave crise econômica e enorme déficit fiscal. A decisão da Câmara de Deputados deve provocar uma despesa adicional de R$ 8,5 bilhões neste ano de déficit fiscal autorizado de R$ 170,5 bilhões, com desdobramentos em várias categorias na União e nos Estados, a começar pelo aumento do salário dos juizes do Supremo Tribunal Federal (dos atuais R$ 33.76,00 para R$ 39.293,00). Mesmo que o projeto de aumento salarial tenha sido anterior à sua posse, caberia ao presidente interino mobilizar a base parlamentar para derrotar esta irresponsável decisão. Para ser coerente com o anunciado e urgente ajuste fiscal, e considerando a gravidade da crise do setor público no Brasil, o governo deveria dar o exemplo de austeridade. A contrapartida do aumento de salários foi a aprovação pela Câmara de Deputados da DRU-Desvinculação da Receita da União para dar flexibilidade na gestão fiscal. Em certa medida, a coincidência das duas decisões mostra a desvinculação da receita serve para apertar gastos em algumas funções públicas, liberando recursos para viabilizar o aumento dos salários. Pelo visto, o presidente Michel Temer decidiu governar cedendo aos pedaços diferenciados do Congresso, aos desejos das bancadas corporativas – quase nunca convergentes com o interesse nacional – e distribuindo benesses aos servidores públicos, incluindo os próprios parlamentares. Provavelmente espera, com esses movimentos, construir uma base de apoio para a transição. Será? E o ajuste fiscal, Presidente?