Luiz Otavio Cavalcanti

 

A história é mestra. No século XVIII, a Revolução Francesa foi reação a uma realeza inconsciente descolada da realidade. No século XX, a desagregação da União Soviética foi reflexo do processo de liberalização política que dominou a Europa nos anos 80.

Na América Latina, o neo bolivarianismo de Chavez, espraiado pela Bolívia e Equador, foi produto de secular desigualdade social no Continente. Que alimentou revolta e propiciou chance de consolidação de superada política populista.

O colapso fiscal da Venezuela enfraqueceu o modelo bolivariano. As dificuldades financeiras da PEDVESA diminuíram o apoio às economias equatoriana e boliviana. O capitalismo de Estado ficou fragilizado. O liberalismo político retornou no Chile, na Colômbia, no Peru, na Argentina e no Brasil. E o sistema de mercado voltou a ser estimulado.

Moral da história: quando há esgotamento do modelo político, ocorre a mudança. Em favor de sistema de poder alternativo.

Aqui, no Brasil, são exemplos históricos: o fim do ciclo de Vargas ditador (1930/45) a que se seguiu a redemocratização; o encerramento do período militar (1964/85) substituído pela Nova República; o esgotamento do populismo fiscal de Lula/Dilma (2006/2015) dando lugar a modelo que acentua a democracia liberal.

Ou seja, o exercício do poder, nos regimes democráticos, depende de dois fatores: vitória eleitoral e legitimidade no desempenho político-administrativo. Quem não se legitima no fazer, perde o poder.

E Trump ? O que significa ele nesse cenário?

Trump é resultado de conjunção de quatro elementos:

Primeiro, mesmo com as conquistas de seu governo, o ex presidente Obama não foi capaz de atenuar a desigualdade de renda na sociedade americana;

Segundo, o governo Obama não conseguiu recuperar a economia nos estados integrantes do círculo da ferrugem que desativou indústrias automotivas e de aço no Noroeste do país;

Terceiro, os núcleos mais conservadores da América profunda do Meio Oeste queriam dar o troco pela eleição do primeiro negro para a presidência dos Estados Unidos;

Quarto, o discurso radical e populista de Trump está amparado por reconhecido vigor carismático, o qual soa à perfeição aos ouvidos do americano médio antipático ao cosmopolitismo nova-iorquino. E às negociatas de Washington.

Trump encarna um tipo de populismo caipira. Coberto por verniz corporativo. Trump é a América calada. E armada. Trump soube vencer uma adversária combalida por um elitismo sem ideias. O problema para ele é que esse feitio desabridamente ofensivo talvez funcione em empresas com políticas desatualizadas de gestão de pessoas. Mas não tem durabilidade na política.

Por três razões:

Uma, a política fiscal defendida por ele, de endividamento crescente, dá resultado a curto prazo. Mas, num triênio, acaba em inflação;

Duas, o populismo precisa, para se sustentar, de sólido suporte na sociedade. O que será complicado para Trump manter a médio prazo;

Três, o populismo necessita, para ser politicamente viável, de ampla base de apoio partidário e parlamentar. Ele não parece dispor de unidade no Partido Republicano. Nem de forte lastro parlamentar no Congresso americano.

No plano externo, ele vai certamente buscar estabelecer um eixo de entendimento geopolítico com duas pontas de lança:

A primeira, de natureza comercial, com a Inglaterra, tradicional aliada dos americanos, agora fora da União Europeia;

A segunda, de natureza estratégica, com a Rússia, de modo a fixar complementaridades nas políticas de áreas de influência.

Para Trump, a América Latina não existe. E a Ásia existirá na medida da formlização de acordos bilaterais convenientes aos parceiros da hora.

Se este modelo funcionar, Trump se candidatará à reeleição em 2020. Se não funcionar, ele corre o risco de sofrer impeachment até 2019.