Elimar Pinheiro do Nascimento[1]
Meu único aluno que se preocupa com a politica, gosta de politica e a valoriza, vive sempre em dificuldades pelo fato de pensar de forma lógica, e a realidade parecer ser avessa a esta postura, rindo de seu pobre raciocínio. Por isso, procurou-me afobado, quase desesperado. Professor, não estou entendendo mais nada. Tá tudo virado. O que houve, Rodrigo? Por que você está assim tão preocupado? Rodrigo, que é meio cartesiano, respondeu-me assim:
Veja bem, professor. Primeiro: sempre li e sempre me disseram que a esquerda defende os pobres, perseguidos, explorados, excluídos, e se opõe aos exploradores, reacionários e ricos. Tou certo? Sim, lhe respondo, creio que é mais ou menos assim. Segundo, a prisão em segunda instância prejudica os ricos, pois, em sendo em quarta instância, como eles têm muito dinheiro e advogados bem pagos, conseguem protelar o julgamento até que o processo prescreve e eles não vão presos. Os pobres, coitados, vão presos logo na primeira instância, pois não têm dinheiro para recorrer, e cerca de 250 mil estão presos mesmo sem jamais terem sido julgados. Portanto, terceiro ponto, a esquerda deveria estar defendendo a prisão em segunda instância, como ocorre na maioria dos países do mundo. É, disse-lhe, você está certo. E qual é o problema?
Veja quais são os candidatos a presidente que estão a favor da prisão em segunda instância, que vai prejudicar os ricos e corruptos, disse-me: João Amoêdo, do “Novo”; Flávio Rocha, do partido da Igreja Universal (PRB); Jair Bolsonaro; Geraldo Alckmin e Rodrigo Maia.[2] E quais os que são contra, beneficiando os ricos e corruptos? Lula, Ciro, Manuela, do PCdoB, e Guilherme Boulos, do Psol. Há duas exceções: Álvaro Dias e Marina, que são a favor. Como explicar que os partidos de esquerda, que deveriam estar a favor da prisão em segunda instância, estão contra?
Aluno arguto e menino que quer saber de tudo são o cão chupando manga. Perturbam. Agora mesmo, eu estava tão sossegado com minha leitura de Roberto Machado sobre Foucault. Como explicar esta aparente incongruência? Apenas por interesse em evitar a prisão de Lula? Mas, Lula preso não seria um mártir, candidato a novo “padin Cícero”, com direito a milagres? Medo do PT em ter outros de seus membros condenados por corrupção? Mas o PSDB não deveria ter mais a temer? O DEM não é um partido mais identificado com os empresários ricos do que o PSOL? Ou é ainda a permanência do stalinismo no âmbito da esquerda, inclusive PDT, mantendo a tradição de que os princípios devem ser desprezados em função do poder? Ou é a estratégia dos lulistas empedernidos em mantê-lo longe da prisão e na cabeça das intenções de voto, e assim constranger o TSE, ganhar as eleições e voltar ao poder?
Não sei, mas todas estas respostas me parecem insuficientes. Creio que devo consultar os meus parcos leitores. Pode ser que um deles tenha mais discernimento do que eu e saiba a resposta, com segurança.
[1] Sociólogo, professor da Universidade de Brasília.
[2] Fernando Collor de Mello, Michel Temer e Henrique Meirelles não foram encontrados ou não quiseram responder. Mas pode-se facilmente inferir que Temer seria contra.
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