Editorial

É cediça a observação, atribuída a Marx, de que a História não se repete, ou apenas se repete como farsa.  Mas, no momento que vivemos, cabe, na linha desta revista, a dúvida: Será?  Soubemos agora da decisão do presidente dos EUA, Donald Trump, de recambiar para os países de origem todos os imigrantes irregulares, após processá-los e condená-los pelo “crime” de fugir da miséria, em suas pátrias, e tentar uma vida melhor, para si e para seus filhos, no “país da liberdade e da esperança”.  E o mundo todo, pelos canais de TV, viu o pungente espetáculo de crianças, aos mais sentidos prantos, sendo separadas dos seus pais, prisioneiros, e lançadas em uma creche qualquer, até o incerto dia de sua deportação, junto com eles.  Tão dolorosa foi a cena, que a própria primeira dama, com seu coração de mãe, desaprovou publicamente a medida, em tudo comparável às práticas nazistas.  Ora, sempre se soube da truculência e da insensibilidade do primeiro mandatário americano, lídimo representante do grupo social do seu país classificado como “wasp” (white, anglosaxon, protestant), grupo esse que não representa, salvo melhor juízo, a maioria da grande nação, uma vez que o homem foi eleito sem a maioria dos votos computados.  Mas não se imaginava que chegasse a tais extremos.  E o que resta, agora, à comunidade internacional, que assiste, impotente, a semelhante regressão civilizatória?  Manifestar o seu repúdio, e lamentar a teratologia do sistema eleitoral americano, de “colégios eleitorais”, que concede ao candidato que ganhe, por um voto que seja, a eleição em uma unidade federada, a totalidade dos seus “votos eleitorais”, e, já pela segunda vez, dá a vitória ao concorrente que, em termos do país como um todo, recebe menos sufrágios. E nós, que tantas críticas temos feito às deformidades do nosso próprio sistema, que, no entanto, não abriga tal aberração?  Será que nos serve de consolo?  No mais, cogitar que o nome do carrasco das criancinhas bem poderia sofrer uma leve alteração, para Donald Tramp (Vagabundo), e que o lema que o levou à vitória eleitoral no seu país – America First – poderá passar, para comunidade internacional, ao seu inverso: America Last.

P.S Este editorial já havia sido escrito, quando Trump, pressionado pela sociedade organizada do seu país e pela reação da comunidade internacional, revogou a medida.  mas há situações consumadas de crianças separadas dos pais – inclusive crianças brasileiras – que dificilmente serão revertidas.  O juízo sobre a desumanidade do presidente da mais poderosa nação do planeta, portanto, permanece.