Editorial

O Contador – Giacomo Favretto ( 1849-1887)

No último domingo, o Brasil foi surpreendido por uma manobra torpe que, por pouco, não subverteu a ordem jurídica do país e o expôs à risota da comunidade internacional.  Três deputados federais impetraram “habeas corpus” em favor de um condenado pela Justiça, em segunda instância, e por sentença definitiva em seu mérito.  A demanda judicial foi promovida, com sucesso, junto a um desembargador plantonista do TRF da 4ª Região, antigo militante do partido político dos impetrantes (e nomeado por Presidente da República afastada do poder por “impeachment”, obviamente do mesmo partido), que não teve pejo de enxovalhar a sua toga para pôr-se a serviço de uma conveniência partidária.  Completando o grotesco cenário, cabe ainda registrar que outros “habeas corpus”, com a mesma “causa petendi”, já haviam sido negados pelas nossas cortes superiores, STJ e STF.  O fundamento da nova impetração foi pueril.  Teria havido um “fato novo”, capaz de fazer reverter a medida prisional: o condenado teve anunciada a sua pré-candidatura à Presidência da República.  A determinação de imediata soltura do preso bem constitui o que os juristas têm referido como uma medida teratológica (= monstruosa, aberrante).  Em primeiro lugar, porque o “fato novo” nada tinha de novidade: a pré-candidatura já havia sido noticiada desde antes da condenação pelo TRF.  Em segundo, porque um desembargador, individualmente, não pode reverter decisão tomada por colegiado de seu próprio tribunal.  E por último, segundo a velha fórmula escolástica da “reductio ad absurdum”, o precedente poderia abrir espaço para qualquer criminoso condenado candidatar-se a um cargo eletivo, e assim conquistar a liberdade.  O mais surpreendente é que a tramoia, planejada em todos os detalhes – dia da semana, autoridade judicial, etc –  como uma ação criminosa, quase teve êxito.  Não fosse o destemor e a sólida convicção jurídica do juiz Sérgio Moro, ao lado da serenidade e do profissionalismo da Polícia Federal sob o comando olímpico do Ministro Raul Jungmann, o homem hoje estaria solto, para escárnio da sociedade e desmoralização da Justiça Brasileira.  O desembargador relator do processo de condenação, advertido por Moro, manifestou-se em contrário, o presidente do TRF da 4ª Região “chamou o feito à ordem”, e a manobra foi frustrada.  Fica-nos a lição sobre o que são capazes de fazer os sectários do ex-presidente preso, para trazê-lo de volta à arena política.  E a advertência sobre os meios a que podem ainda recorrer, para realizar seus desígnios.  Desesperados, eles estarão dispostos a tudo.