Assembleia dos metalúrgicos – by Hélio Campos Mello.

 

No Brasil, a ideia de sociedade civil cresceu com José Bonifácio. Reformista, foi ele quem apresentou o projeto mais radical pelo abolicionismo.

Bonifácio entendia que “o mulato deve ser a raça mais ativa e empreendedora, pois reúne a vivacidade impetuosa e a robustez do negro e a sensibilidade do europeu” (Bonifácio, Projetos para o Brasil, pg. 60).

Bonifácio apontava também os equívocos dos brancos sobre a política para os índios. Lamenta a morte de 2 milhões de indígenas no país. E acentua: “Newton, se nascera entre guaranis, seria mais um bípede, que pisara a superfície da terra; mas um guarani criado por Newton talvez ocupasse seu lugar”.

Na campanha presidencial de 1910, eram candidatos Rui Barbosa e o marechal Hermes da Fonseca. O Brasil vivia um clima caracterizado por conceitos militares. A República fora proclamada em 15 de novembro de 1889 pelo marechal Deodoro da Fonseca. Sucedido, na presidência da República, pelo marechal Floriano Peixoto.

Opondo-se à corrente militar, Rui Barbosa fez uma campanha baseada na ideia civilista. Defendendo a importância do constitucionalismo e do liberalismo. Perdeu.

Em 1977, no rasto do AI 5, de 13 de dezembro de 1968, após as mortes do jornalista Vladimir Herzog (1975) e do operário Manuel Fiel Filho (1976), a sociedade civil voltou a mobilizar-se. Na Carta aos Brasileiros, em 1977, entidades e figuras representativas da sociedade subscreveram documento em defesa da liberdade e da democracia. Firmaram a declaração representantes da Ordem dos Advogados do Brasil – OAB, da Associação Brasileira de Imprensa – ABI, da Sociedade Brasileira para o Progresso da Ciência – SBPC, da Conferência Nacional dos Bispos do Brasil – CNBB, da Comissão Justiça e Paz.

Além de figuras como dom Paulo Evaristo Arns, Raymundo Faoro, Dalmo Dallari, Hélio Bicudo, Franco Montoro, Mario Covas, Ênio Silveira, Carlos Heitor Cony, Tristão de Ataíde, Otto Maria Carpeaux, Barbosa Lima Sobrinho, Audálio Dantas, Goffredo da Silva Teles Junior, José Carlos Dias e José Gregori, entre outros.

Estamos no século 21, ano de 2020. Portanto, há quarenta e três anos daquele episódio. Muita coisa aconteceu. A nação viveu uma distensão segura, lenta e gradual, patrocinada pelo presidente Ernesto Geisel e pelo chefe da Casa Civil, general Golbery do Couto e Silva. Empossou um presidente da República civil depois de vinte e um anos de presidentes militares. Aprovou a chamada Constituição cidadã, em 1988. De lá para cá, o eleitor brasileiro elegeu cinco presidentes. E o Congresso Nacional aprovou o impedimento de dois deles.

Não é pouca coisa. Os fatos continuam mudando. Embora em outra direção. Há imprevista politização do Supremo Tribunal Federal – STF. Como disse Joaquim Falcão, temos onze supremos. O Poder Legislativo tornou-se um conjunto de parlamentares com pouca expressão. Sem energia cívica e sem talento para se afirmar. E o Poder Executivo apresenta duas características: um presidente da República despreparado, que banaliza as instituições e auto desrespeita o poder por continuadas agressões a jornalistas e uso de palavras de baixo calão.

A segunda característica do Poder Executivo é a ocupação indistinta de cargos por militares. Sem nenhuma correspondência entre a natureza da função e a formação do ocupante. Bastando, para tal, que seja militar. E cumpra as ordens do chefe. Como ocorre com o ministério da Saúde. Com agravante de que o país vive uma pandemia.

O cenário não conteria o risco à democracia, que exibe, se o presidente da República fosse ponderado, equilibrado. E expressasse a dignidade e a responsabilidade próprias do cargo que ocupa.

Diante das circunstâncias, tomemos a lição de José Bonifácio, de Rui Barbosa e de quantos assinaram a Carta de 1977. Melhores exemplos. Pelo civismo.