Para Belé, Byron e Nailton, companheiros de jornadas
“O Comunismo Vencerá”
Roda Viva, letra de Chico Buarque
Tem dias que a gente se sente
Como quem partiu ou morreu
A gente estancou de repente
Ou foi o mundo então que cresceu…
Completamente perdido. Nada fica claro. Não consigo entender o que me cerca. Fundamental a alienação, a busca de introspecção, a necessidade de deixar a vida me levar, ou ser levado dela, sem muito pensar, sem querer modificar rumos, sem fazer acontecer.
A gente quer ter voz ativa
No nosso destino mandar
Mas eis que chega a roda viva
E carrega o destino prá lá …
A intenção e os limites concretos. A impotência frente ao desconhecido, ou mesmo ao conhecido. Nada surge como possível nestes momentos. Caminho pela praia. É maravilhosa. O deserto da vida humana faz com que as conchas reapareçam em quantidade. O sol me aquece as costas. A faixa larga de areia, o mar bem azul, os arrecifes na maré baixa, momentos de descontração de encontro comigo mesmo, sem pensar, sem me preocupar.
Roda mundo, roda gigante
Roda moinho, roda pião
O tempo rodou num instante
Nas voltas do meu coração…
Reclamam. Querem minha presença. Buscam o ser que deixei de ser. Não entendem a necessidade de abandonar o rito cotidiano, o deixar o coletivo não sei por quanto tempo. Chega de enfurnamento, basta de sofrimento, não aguento querer entender este mundo louco. Momentos de aproveitar a comida, de ver os queridos, de sentir o afeto que está ao nosso lado e nem percebia.
A gente vai contra a corrente
Até não poder resistir
Na volta do barco é que sente
O quanto deixou de cumprir
Lutas foram travadas. Gente me desprezou. Queriam que fosse o não sou. Achavam que os ideais eram maiores, que apagaria meus desejos. Viam o concreto apenas, não conseguiam entender as expectativas, o lúdico. Matavam meu ser indivíduo, morria o que fosse desejo.
Faz tempo que a gente cultiva
A mais linda roseira que há
Mas eis que chega a roda viva
E carrega a roseira prá lá…
O belo era desvio. Tudo centrado em subsistência. Não podia ter prazeres. Viver só fazia sentido na luta, a pândega e a boemia pecados vividos para continuar a luta. Era e ainda sou, um autômato de um mundo ideal, em que não se permitia erro, em que dificilmente se via prazer. O nobre era abdicar, inclusive, da minha personalidade burguesa.
Roda mundo, roda gigante
Roda moinho, roda pião
O tempo rodou num instante
Nas voltas do meu coração…
Pequeno em um mundo sombrio. Pensava que entendia o humano. Minhas previsões foram falhas. A turba reage, um modo diferente do que me ensinaram. O racional não coaduna com o meu ver. A busca de pão e de circo. Primeiro a sobrevivência. Querer outra racionalidade de seres que sofrem, que não sabem o dia de amanhã, coisa para intelectuais, para seres que valorizam o conhecimento, porque tem garantido o pão e os brioches no dia seguinte. O que o povo quer é sobrevivência e esperança, venha de quem vier. Se puder se identificar na mediocridade, melhor ainda.
A roda da saia mulata
Não quer mais rodar não senhor
Não posso fazer serenata
A roda de samba acabou…
Prazer vem em segundo. Passear ao ar livre, apreciar a natureza, a cerveja gelada na goela. Os que vivem nesse mundo, desconectaram-se com a realidade. Não entendem os que acreditam defender. Pessoas passam fome porque priorizam cultura, dar prazer é incompreendido. Considera-se supérfluo o que pode dar sentido. Uma sociedade racionalista, chata, sem direito à alimentação do espírito é a que se vive.
A gente quer ter voz ativa
No nosso destino mandar
Mas eis que chega a roda viva
E carrega o destino prá lá …
Perdido, procurando rumo. Momento de pausa daquilo que me sufoca. Parece sem sentido. Mas, busca sempre é assim. Sei o que me motiva, de onde sairei, não sei em que porto atracarei, não sei como chegarei. O imprevisto traz surpresas. Boas e más. Nesse mundo navegante, sou navegador sem nada saber, com a incerteza como bússola.
A gente vai contra a corrente
Até não poder resistir
Na volta do barco é que sente
O quanto deixou de cumprir
Lutar foi sempre o caminho. Muito se deixou de cumprir. Sonhos foram perdidos. Certezas, se tinha demais. Como convicção, agora, só tenho a frase do poeta:
Faz tempo que a gente cultiva
A mais linda roseira que há
Mas eis que chega a roda viva
E carrega a roseira prá lá…
Não sei fazer outra coisa. Meu mundo desaba sem a força do ideário. Se as forças eu recuperar, vou plantar mais roseiras, alguma sobreviverá ao vento, à roda viva que não me massacrará, brindarei pequenos êxitos, serei forte, algum dia.
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