Wanderer above the Sea of Fog (1818) by  Caspar David Friedrich.

 

Minas não tem apenas centralidade geopolítica. Minas tem o semblante sereno de montanha. Não será por outra razão que Minas deu Juscelino Kubitschek, Tancredo Neves e Milton Campos.

Talvez por isso, um poeta mineiro, geração de 45, Paulo Mendes Campos, escreveu: “Da aurora do Brasil -bezerra parida em dor – apesar de tudo, quero a violência do parto (meu vagido de esperança).”

Num país em que morrem mais de 2.000 brasileiros, diariamente, é preciso falar em esperança.

A decisão, desta semana, do ministro do Supremo, Edson Fachin, acentua três aspectos: o jurídico, o político e a lógica do confronto.

No aspecto jurídico, alguns pontos estão evidentes. A decisão de Fachin não entrou no mérito. Foi decisão no âmbito processual. Na prática, ela ressalta questão de foro. O ministro disse que o foro competente para tratar dos assuntos que ele relaciona na decisão não é Curitiba. É Brasília.

Isto trouxe repercussões práticas. A mais importante é a tentativa de tais processos não seguirem para a Segunda Turma do STF. Que quer declarar a parcialidade de Moro. Se o fizer, o edifício da Lava Jato estará demolido. Então, Fachin não quis salvar Moro. Fachin quis manter de pé a construção ética e judicial da Lava Jato. Basta ver as declarações do presidente da Câmara e do senador Renan Calheiros. Ambas contra Moro. Porque ambos são investigados pela Lava Jato.

No aspecto político, a solidão noviça de Jair Bolsonaro ganhou a companhia experiente do ex presidente Lula. A paisagem política estava marcada por personagens de baixa vivência, se comparadas a Lula: João Dória, Sérgio Moro, Eduardo Leite. Sem falar em Luciano Huck. Nesse sentido, o panorama mudou. Ganhou em densidade eleitoral. Em cabelos brancos.

Por outro lado, a campanha de 2022 poderá assumir sedimentação. Porque Lula confere ao pleito escala que não tinha. Desse modo, a disputa pode registrar geologia não observada. Porque, sem Lula, a tendência da esquerda seria fragmentar-se. Repercutindo no espaço de centro. Com Lula, o processo traz fermento capaz de cimentar o polo esquerdista. A disputa Lula / Bolsonaro reduz o risco de liquefação bonapartista.

Por sua vez, a lógica do confronto é a via preferencial de Jair Bolsonaro. É no campo conflituoso de ofensas que o atual presidente alimenta seus ativistas radicais. E que acentua discurso construído em dialeto próprio. Bem compreendido por machistas, por setores armados e por segmento menos instruído da população.

A lógica do confronto pode ser arguida em duas hipóteses: antes e após a eleição. Antes da eleição, se as pesquisas de intenção de voto começarem a favorecer Lula. Aí, o STF passa a ser novamente alvo de ataques de extremistas de direita? E após a eleição, se, na derrota, Jair Bolsonaro argumentar com improváveis falhas na urna eletrônica. Pode tentar o autogolpe?

De qualquer modo, as instituições brasileiras ganham nova chance de serem testadas. E o Exército ganha oportunidade de falar por si. E de retificar a expressão de Bolsonaro de que o Exército é dele: “Meu Exército não vai obrigar o povo a ficar em casa”.

A paisagem nacional, nesta noite transcendente de março, relembra palavras de notável brasileiro.  Responsável pela costura da unidade territorial do Brasil: José Bonifácio. Quando ele disse: “No Brasil, a esfera do possível é maior do que a da realidade”.