No jogo de xadrez, um lance que sempre considerei arriscado é o roque. Gosto de fazê-lo. Aproxima-se a torre ao rei, peça principal, e este a pula ficando numa posição menos vulnerável. No entanto, se for feito antes do tempo, ou, se não se abrir um pião adequado evitando o isolamento, pode ser uma debilidade para o jogo futuro.

Dia 8 de março de 2021, Dia das Mulheres, segunda feira, geralmente um dia calmo para preparar a semana e reservado para a comemoração com nossas companheiras de jornada. Nada era esperado para mudar a rotina e trazer mais complicações para um país em que a pandemia já o tornou muito complicado.

Uma decisão de Ministro do STF gera uma grande agitação no mundo político e financeiro. Facchin resolve anular os procedimentos e conclusões que Curitiba tinha tomado em relação aos casos que envolviam o ex-Presidente Lula. Não entra no mérito, apenas na ritualística, não extingue os processos, apenas os transfere.

Analistas de política consideram uma jogada de mestre. Com isso, tiraria do foco a suspeição do julgador, o ex-juiz Sérgio Moro. Não haveria fato concreto a analisar.  Seria uma jogada para salvar os rescaldos da Lava Jato, para não julgar desmandos que porventura tivessem sido cometidos.

A situação de Lula não seria tão cômoda, os processos não foram extintos, apenas transferidos. Uma faca sobre a cabeça que a qualquer momento poderá cair. Dizem que a burocracia judiciária é lenta, concordo, apenas completaria com os termos, quando se quer. Um julgamento em primeira e até segunda instância pode ser agilizado dependendo de interesses objetivos. Ano é meio pode ser tempo necessário para essa acomodação. Pressões podem existir e seria ingenuidade ignorá-las.

Além disso, pode-se criar clima de destemperança. E, se for verdade o dito pelo mandatário mor atual do País, utilizará o “meu (dele) exército” em atitudes pouco democráticas. Afinal, seria provado que o Exército é realmente dele.

Reações tem havido. A classe média se manifesta freneticamente contra a bipolarização que, politicamente, esta situação pode gerar. Com uma rapidez absurda. “Os extremos se enfrentarão. Não temos alternativas.” Frases que correm pelas mídias da internet.

Acho estranho, pois, até o momento não tinha surgido nenhuma outra força com densidade eleitoral capaz de enfrentar o establishment, as forças que ora governam o País. Parece que estão satisfeitos e que a mensagem que dão é que preferem o líder do governo atual. Não ressaltam que surge uma alternativa com chances concretas, com possibilidades reais de êxito no enfrentamento.

Não sou contra, seria muito bom termos mais forças com real peso para se apresentarem como opções a serem analisadas. O debate permitiria uma construção que, sem dúvida, seria mais aderente aos anseios nacionais. Mas, não tendo, eu fico exultante da possibilidade de mudança por uma via progressista que efetivamente beneficiou as camadas populares em seus mandatos. Viva a bipolaridade em contraposição a um cenário unipolar.

Vejo nos noticiários, hoje, dia 9, que outro juiz do Supremo, Gilmar Mendes, ignorará a decisão tomada e pautará a suspeição do ex-Ministro da Justiça. Talvez, o roque tenha sido antecipado. Sem dúvida foi jogada de risco. Se assim for, todos os atos tomados anulados e pode-se ter um julgamento com um mínimo de imparcialidade, além de expor à opinião pública os possíveis desmandos cometidos

Perigos há e lances arriscados foram dados que podem encobrir situações incompatíveis com a democracia.

Nesse cenário, devemos jogar consolidando posições democráticas, evitando perigos de inverdades que foram incrustadas no seio da sociedade brasileira sem fatos reais. Denunciando posições despóticas de lideranças autoritárias, desmistificando cenários irreversíveis que excluem a maioria de nossa população. Não renunciar à luta por mudanças, estratégia a ser seguida. Aprendamos a jogar o jogo com as limitações que temos. Mas, não o abandonemos antes de ser disputado.