Depois do susto e da surpresa com a avalanche de votos, vantagem de mais de 11 pontos percentuais para o seu rival e em 21 das 24 províncias da Argentina, a vitória do excêntrico e controverso Javier Milei nas eleições presidenciais da Argentina deixa no ar uma grande incógnita: será que ele pretende mesmo realizar as propostas desvairadas que apresentou na campanha? E será que conseguirá aprovar no Congresso tais medidas, sem uma base de sustentação? Vale lembrar como na campanha ele gritava como um desesperado, algumas vezes ostentando uma serra elétrica, que ia acabar com o Banco Central, dolarizar a economia, romper com o Mercosul e com a China, principais parceiros comerciais da Argentina, fechar todos os ministérios sociais, privatizar quase tudo, e até liberar o comércio de órgãos humanos. Apresentando-se como anarco-capitalista, seja lá o que isso signifique, Milei propagava seu lado esotérico e quase humorístico, afirmando que se aconselhava com o cachorro (aliás, já morto) e tomava decisões baseado nas cartas do Tarô. Este, o homem que vai assumir a presidência da segunda maior economia da América do Sul nos próximos anos, e a quem os argentinos decidiram confiar o enfrentamento da grave crise econômica que vive um país que já foi um dos mais ricos do mundo.
O resultado destas eleições pode indicar mais uma derrota do peronismo que propriamente uma vitória de Milei, considerando que o candidato do Partido Justicialista era justamente o Ministro da Economia, que continuou a destruir a economia argentina e a empobrecer a população. Parece que, para além das loucuras de Milei, os argentinos tenham preferido apostar na incerteza do anarco-humorista a manter no poder os peronistas, que vinham empurrando a Argentina para o abismo. Considerando as ideias disruptivas do presidente eleito, e a polarização política com um peronismo forte no Congresso, a Argentina pode entrar num grave impasse político, que pode impedir a implementação de medidas para lidar com a crise econômica e social, uma das quais – o ajuste fiscal – faz parte do programa do governo de Milei.
Ao Brasil interessa que a Argentina se recupere e que mantenha boas relações diplomáticas, independentemente de diferenças ideológicas, em parte para salvar o MERCOSUL, ameaçado por Milei, e já enfrentando problemas com os outros dois países membros. O presidente Lula reconheceu rapidamente o resultado das eleições e, mesmo sem citar o nome do eleito, deu os parabéns e desejou sucesso. No entanto, o presidente eleito convidou Jair Bolsonaro para sua posse, e se limitou a dizer que, “se Lula vier, será bem recebido”, num tratamento ofensivo e nada diplomático ao chefe de Estado brasileiro. Um péssimo começo para as relações entre os dois principais países da América do Sul.
É incrível como um País tão orgulhoso como a Argentina esteja nessa situação.
Não sei se o novo Presidente é doido ou imbecil.
Convidar Bolsonaro e sua turma para a posse, e desprezar Lula, é uma insanidade.
Como Bolsonaro, inelegível e respondendo a vários processos, poderá contribuir para salvar a Argentina da crise em que se encontra?
Valeu o jornalista argentino que comentou que os argentinos “tiveram mais medo do presente do que do futuro”. Ao escolherem como seu candidato o Ministro da Economia que não conseguiu nem explicar nem enfrentar a crise econômica, os peronistas subestimaram o cansaço dos argentinos com décadas de “administração da economia” pelos peronistas. No artigo sobre Argentina que aqui publiquei às vésperas do 1º turno, cheguei a registrar que a crise resultava de oito décadas de gasto público maior que a arrecadação, mas não imaginei que o eleitorado chegaria a preferir um “maluquete”. Enfim, parece que o eleito está começando a ser “domesticado pela realidade”, junto com seus 4 ou 5 cachorros.