Parece que são os mesmos. Os negacionistas que rejeitam e ignoram a ciência são, na sua maioria, religiosos fanáticos. Acreditam no mito de Noé e sua arca construída para se salvar do dilúvio, mas duvidam das advertências dos cientistas que explicam e demonstram cientificamente as mudanças climáticas, suas causas e os eventos extremos que estamos vendo em várias partes do mundo e no Brasil, como o desastre do Rio Grande do Sul. Segundo o Gênesis, Deus estava com raiva da humanidade e queria, mesmo, destruir o mal que dominava, salvando apenas o fiel e devoto Noé. Naquela época, diz o mito de Noé, “a maldade do homem era grande” e a terra estava sendo arruinada, “cheia de violência e imoralidade sexual”. Por isso, Deus mandou Noé construir um enorme barco para levar a família e um casal de cada espécie de fauna, salvando os reprodutores que voltariam a povoar a terra arrasada.
Vários milênios depois, a humanidade continua cheia de maldade e violência, muito mais, até, na amplitude e intensidade, já quase se destruindo em guerras nucleares, e está se lançando no abismo do desastre ambiental. Não por uma indignação divina com a maldade humana, mas por uma corrida insana dos humanos e sua agressão, em grande escala, da natureza. Os humanos estão se condenando. E os cientistas apenas advertem para o desastre futuro da vida humana se continuarmos jogando toneladas de gases de efeito estufa na atmosfera. O que já estamos experimentando com as enchentes e secas, o calor insuportável, que tendem a se agravar com o derretimento das calotas polares e a elevação do nível do mar, com todas as consequências sociais, econômicas e urbanas.
O IPCC-Painel Intergovernamental sobre Mudanças Climáticas, que reúne 801 pesquisadores de 195 países, vem demonstrando, desde o início do século, que crescentes emissões de gases de efeito estufa estão provocando o aquecimento do planeta que, por seu turno está provocando uma profunda desorganização do clima. Para evitar um desastre, defendem que o aumento da temperatura não pode ultrapassar de 1,5º adicional à da era pré-industrial. Orientado pelo conhecimento científico, o Acordo do Clima (Acordo de Paris), assinado em 2015 por 196 países, assumiu o compromisso de contenção do aumento da temperatura do planeta aos 1,5°C até o final do século. Infelizmente, já estamos próximos deste limite e, segundo o IPCC, para alcançar a meta, teríamos que reduzir as emissões de gases de efeito estufa em 42%, até 2030. A esta altura, praticamente inviável. No ritmo atual, os vinte maiores emissores de gases de efeito estufa, o Brasil entre eles, tendem a produzir, até 2030, cerca de 110% mais combustíveis fósseis que vão ser lançados na atmosfera.
O mito do dilúvio é uma bela alegoria que pode ser aplicada ao presente, não como uma reação divina contra a maldade e a corrupção humanas, mas como uma advertência do poder destrutivo do modelo civilizatório baseado em energia fóssil. Para evitar o colapso, ainda temos tempo, embora os sinais não nos permita ser otimista. Mas, para se preparar para os eventos climáticos extremos, que já estão batendo às nossas portas, como o desastre atual no Rio Grande do Sul, estamos muito atrasados.
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