Há quase dois anos, depois da tragédia das enchentes na Região Metropolitana do Recife, quando morreram 107 pessoas, o editorial da Revista Será? dizia: “Estes são sinais inequívocos dos eventos climáticos extremos que decorrem das mudanças climáticas globais, fenômenos insistentemente anunciados por cientistas e ambientalistas. Apesar das evidências, as cidades não estão se preparando para estes eventos que devem se repetir e mesmo acentuar no futuro”. As negociações globais para a redução das emissões dos gases de efeito estufa andam de lado, sem grandes resultados, porque ninguém neste planeta parece disposto a apoiar medidas radicais que redefinam o modelo civilizatório para salvar a humanidade. Muitos já jogaram a toalha, porque já chegamos à temida elevação da temperatura do planeta em 1,5º, acima da era industrial, que antecipa o colapso da civilização.
Resultado do efeito estufa, mesmo antes desse futuro catastrófico (que nem está tão longe), já estamos vivendo agora os tempos sombrios dos eventos climáticos extremos, provocando destruição e morte, mundo afora. O dilúvio que desabou agora no Rio Grande do Sul demonstra que as mudanças climáticas não são mais apenas previsões do futuro, este futuro já chegou com intensidade e amplitudes preocupantes. Os eventos extremos estão batendo às nossas portas e deixando um rastro de destruição e morte. No mesmo editorial, dizíamos que a “sucessão de tragédias que sacode e entristece o Brasil são o resultado doloroso e dramático de um grave passivo social acumulado por décadas de descaso político, pobreza, descontrole urbano e agressão ao meio ambiente”. O que exige uma estratégia abrangente e ousada de preparação do Brasil, especialmente das cidades, para as situações extremas da natureza.
Nosso editorial de dois anos atrás está cada vez mais atual, com o mundo sufocando com as secas e o excesso de calor, e se afogando com a volumosa precipitação pluviométrica, com desastre pessoal, prejuízos econômicos e urbanos. E o Brasil, de desastre em desastre, vai lamentando os sofrimentos e as dores, se mobilizando na solidariedade, os governos vão, às pressas, liberando recursos para proteger as vítimas e recuperar parte dos prejuízos materiais, porque as perdas humanas não têm recuperação. Mas, rapidamente cai tudo no esquecimento, até que novos eventos deixem um rastro de destruição e morte. E quanto mais recursos forem necessários para a emergência e a recuperação, menos vão sobrar para investir na prevenção, preparando as cidades para os inevitáveis eventos climáticos extremos, de modo a evitar o desastre. As tragédias que se sucedem só reforçam o que tem de pior na cultura brasileira: o imediatismo e o descaso com a prevenção.
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