O povo

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Na guerra aberta entre o Congresso (leia-se, Centrão) e o Executivo (leia-se, presidente Lula), a vítima é o Brasil. Enquanto eles brigam para ver quem gasta mais e onde apertam os calos, os brasileiros colherão os frutos podres de uma economia que se arrasta e de um Estado capenga.

A Câmara dos Deputados decidiu, ontem, retirar de pauta a Medida Provisória 1.303, que ampliava impostos para tapar um buraco no Orçamento de 2026, com o objetivo de cumprir as metas definidas pelo Arcabouço Fiscal. Sob o argumento de que “o Brasil não aguenta mais aumento de imposto” para financiar mais gastos do governo em ano eleitoral, a oposição se uniu para derrotar o projeto e fragilizar o presidente Lula da Silva diante das próximas eleições.

Em resposta, o governo defende a elevação da receita com “impostos sobre os ricos” para cobrir despesas voltadas aos pobres, retomando a velha polarização entre pobres e ricos. Nesta disputa, ambos os lados estão errados, e seus argumentos são falaciosos. Cada um utiliza o interesse da sociedade como biombo para esconder seus próprios interesses políticos — e os dos grupos que os sustentam.

Há uma percepção geral de que é necessário e urgente reduzir as despesas primárias, tanto para evitar uma crise fiscal aguda nos próximos anos quanto para preservar o próprio Arcabouço Fiscal. O ministro Fernando Haddad concorda com esse diagnóstico e tem feito um esforço sincero para rever gastos públicos e equilibrar as contas. Enfrenta, porém, duas dificuldades.

A primeira, e mais grave, é o apetite gastador do presidente da República e de sua base política, que não aceitam ajustes e ainda pretendem ampliar despesas e lançar novos programas sociais — uma generosidade que não cabe no orçamento e que, em última instância, tem propósito eleitoral.

A segunda é o obstáculo real da rigidez estrutural do orçamento, que restringe os espaços para cortes com resultados rápidos e sem desgaste político. A solução mais fácil e imediata é o aumento de impostos, embora o Brasil já suporte uma das maiores cargas tributárias do mundo.

Diante da derrota na Câmara dos Deputados, o governo Lula devolve a responsabilidade aos parlamentares, que controlam cerca de 50 bilhões de reais do orçamento da União (metade das despesas discricionárias do Executivo) por meio das emendas parlamentares. Como a Medida Provisória pretendia arrecadar 20,9 bilhões, os deputados e senadores poderiam, em tese, ceder metade de suas cotas. Mas não vão ceder — e o governo já antecipou que cortará parte dessas emendas, podendo chegar a 10 bilhões de reais.

A escalada do conflito entre o Centrão e o presidente Lula antecipa a polarização e as tensões que dominarão o cenário das próximas eleições. E, mais uma vez, a vítima será o Brasil.