As reformas estruturais previstas ou já aprovadas no Brasil, como a reforma da Previdência, não têm efeito imediato de alívio nas contas públicas como seria desejável num momento de crise fiscal aguda. Por razões políticas e jurídicas, as reformas poupam os beneficiários presentes definindo, no máximo, períodos de transição que os protegem, mas, ao mesmo tempo, antecipam parte dos seus impactos nas finanças públicas. Mas os resultados substantivos amadurecem lentamente e, portanto, ficam para o longo prazo.
Como o problema do Brasil é imediato, agravado pela pandemia, fica difícil saber como atravessar esse deserto das finanças públicas até que as reformas levem a uma efetiva e relevante redução das despesas primárias. Depois de adiamentos e dúvidas, o governo federal finalmente entregou esta semana ao Congresso uma proposta de reforma administrativa que define, entre outras medidas, a eliminação de privilégios dos servidores públicos e a garantia de estabilidade apenas para as funções exclusivas de Estado. Embora com propostas relevantes e necessárias, os efeitos da reforma serão de muito longo prazo e não contribuirão em nada para alívio fiscal no período da mais aguda crise.
Temendo o efeito negativo na sua popularidade, o Presidente da República exigiu que a reforma não incluísse os atuais servidores públicos, valendo apenas para os que sejam contratados após a sanção da lei. Ou seja, depois de algumas décadas. E até lá o Estado vai continuar com um custo elevado e crescente de salários e penduricalhos de grande parte dos servidores públicos. Neste ano, os gastos com servidores públicos no Brasil (em todos os níveis federativos) devem chegar a R$ 328,2 bilhões, valor que cresce a cada ano de forma inercial por conta das vantagens e regras de promoção e outros benefícios que a reforma deveria eliminar.
A proposta de reforma administrativa nem sequer definiu regras de transição para antecipar seus efeitos, como foi feito para a reforma da Previdência. Esse é o novo perfil de Bolsonaro que toma decisões olhando para as eleições de 2022, procurando assegurar sua popularidade, mesmo que comprometa as reformas necessárias à reorganização do Estado brasileiro. Na reforma do Pacto Federativo que já está no Congresso, Bolsonaro já declarou que vai retirar da proposta um item que prevê extinção de município com menos de cinco mil habitantes e que não consigam nem 10% de receita própria, mas têm uma estrutura, secretários e nove vereadores.
… e a montanha pariu um rato. No curto e médio prazo impacto fiscal zero. Para agora, para este momento, sequer trataram do problema do extrateto, as diferentes manobras, chicana jurídica, penduricalhos e acúmulos de função com que funcionários atualmente recebem mais que o teto constitucional de 39 mil reais. Apesar da Constituição, também a eliminação dos penduricalhos ficou para o futuro distante. Ainda a brutal injustiça de que a reforma não atinge parlamentares, magistrados (juízes, desembargadores, ministros dos tribunais superiores), promotores e procuradores, além dos militares. É como disse Flavio Dino, numa entrevista no CEBRI, há alguns meses: “governo com problema na Justiça não vai propor diminuição de salário de juiz”. Também é preocupante, no momento em que temos um PR ostensivamente autoritário, dar ao PR mais poderes para extinguir cargos e órgãos públicos por decreto, em vez de estabelecer critérios gerais. E como não vai valer para funcionários que entrarem antes de aprovação da reforma, no curto prazo vai gerar um bocado de manifestações de concursados ainda não chamados, pressionando pela nomeação.