Os incidentes desta semana nos Estados Unidos, com a invasão do Congresso e o vandalismo de “trumpistas” fanáticos, são uma advertência aos brasileiros do risco que corre a nossa democracia com um presidente populista e autoritário, tão irresponsável e aventureiro quanto Donald Trump.
Na mais estável democracia do mundo, o ainda presidente Trump, ídolo de Bolsonaro, tentou impedir o processo normal de sucessão presidencial, numa tentativa de golpe de “república de bananas”, como falou um deputado norte-americano.
Depois de seguidas derrotas na Justiça e mesmo após a confirmação de Joe Biden pelo Colégio Eleitoral, Trump continuou insistindo em que a eleição foi fraudada e que ele seria o eleito, tentando comprometer a legitimidade do futuro presidente e da própria democracia norte-americana.
Num movimento articulado, enquanto onze senadores do Partido Republicano levantavam objeções à posse do presidente eleito, Trump convocou seus truculentos simpatizantes, grupos de milicianos de ultradireita, a marcharem e pressionarem os parlamentares, provocando a invasão violenta do simbólico Capitólio.
O que isso tem a ver com a democracia brasileira?
Tudo. Bolsonaro não é apenas um admirador deslumbrado do estilo e dos métodos de Donald Trump, é um descarado defensor de ditaduras, e vive falando em fraude no sistema eleitoral brasileiro, mesmo tendo sido eleito, sinalizando que, como Trump, não vai aceitar a derrota eleitoral em 2022.
Bolsonaro conta também com uma legião de fanáticos, grupos truculentos organizados, milícias armadas e virtuais. E o ex-capitão ainda acha que terá o apoio das Forças Armadas para eventuais tentativas golpistas, mesmo quando sistematicamente refutado pelos altos escalões militares.
Diante dos eventos dramáticos no Congresso dos Estados Unidos, em vez de manifestar a preocupação do Brasil com a ameaça à democracia norte-americana, Bolsonaro continua repetindo as mentiras de Trump, justificativa para o ensaio frustrado de insurreição. O fracasso do golpe de Trump pode até desestimular aventuras bolsonaristas. Mas representa, antes de tudo, um recado aos democratas brasileiros.
A Advertência que vem do Século
Visto no espaço de uma semana, Será? usou um bom titulo para seu editorial. Mas visto na perpectiva história, o título deveria seria aer outro. A crise de Trump nos EUA nesta semana é uma manifestação do esgotamento do tipo de democracia usado desde o século XVIi, para não dizer desde o século VII AC. Uma forma de funcionamento que não levava e ainda não leva em conta: a globlaização, os problemas planetários, a inteligência artificial as mídias sociais, os limites ao crescimento, a automação, a exclusão social, ( que na Grecia antiga e na escravidão negava voto universal). A democracia, esta maravilhosa invenção da humanidade, perdeu sintonia com a marcha da história. A saïda deve ser uma modernizaçao e não um retrocesso. Mas os democratas precisam entender que a maioria dos eleitores de um país no dia da eleição não representa os interesses do povo no longo prazo, nem o povo representa a humanidade em sua perspectiva histórica. Um bom exercício é pensar como modernizar a democracia para sintoniza-la com os avanços civilizatórios. Como inventar uma humanocracia.
Com todo o respeito e admiração que você sempre me despertou, amigo Cristovam, acho que não foi feliz, deste vez.
Seu sonho de uma sociedade humana perfeita levou-o, a meu juízo, a desvalorizar a luta pela democracia, com a alternativa de uma conceituação abstrata, e até certo ponto visionária, de “humanocracia”
Cabe lembrar que, para que lutemos para aperfeiçoar a democracia é preciso que ela sobreviva. E esta é a luta mais urgente.
Eu me dedico a tentar recuperar a democracia ameaçada pela reeleicao do Bolsonaro por causa da divisao dos democratas. Mas isto nao me impede de PENSAR e até ser visionário. Com todo respeito, pensar além do momento não nega a açao politica no presente. Ceistovam
Sim, a ação terrorista em Washington em 6 de janeiro é uma advertência. E está cada vez mais claro que chegou a hora
de regulamentar e responsabilizar os novos intermediários digitais, Google, Twitter, WhatsApp, Facebook e quaisquer outro novo tipo de mídia digital, assim como há nas leis a responsabilização de jornais, revistas, editoras. Não se pode permitir que os meios digitais que serviram um dia à democratização da informação sejam hoje utilizados para asfixiar a democracia aos poucos. Na Europa já se começou a discutir em sério a necessidade de regulamentar os intermediários digitais: não é para acabar com a liberdade de expressão, e sim, para não tolerar que, livre e sem leis em sua selvageria, ela acabe com a democracia.