Educação para quem?
- No mundo pré-industrial
Na Grécia e em Roma, educação era para os cidadãos (escravos, mulheres e estrangeiros não eram educados). Na Idade Média, o “para quem” evoluiu para os sacerdotes, soldados, alguns profissionais, médicos, teólogos, filósofos e alguns auxiliares de príncipes. A Revolução Industrial trouxe a necessidade de educar-se a população de trabalhadores, mas a educação continuou desigual e restrita a cada país.
A formalização da escola como o lócus para educar surge simultaneamente com a formalização de educação para alguns. Ao sair da educação primitiva dos povos originários por todos e para todos da comunidade, a escola passa a ser o centro de formação para dirigentes e privilegiados: os aristocratas e seus filhos, que seriam os sacerdotes, soldados e gestores. A escola e os tutores se especializaram e foram apropriados, até mesmo sequestrados, pela minoria privilegiada por ser educada e educada por ser privilegiada. Excluíram parcela da população e com isto transformaram escola na máquina de exclusão para os que não a frequentam.
- No mundo industrial
A Revolução Industrial, consequente do Renascimento e do Iluminismo, provocou uma revolução no “para quem” dar educação, sobretudo a partir da Reforma Protestante, com sua ênfase na alfabetização para ler a Bíblia, e na profissionalização de engenheiros mestres e operária para criar e manusear as máquinas. A partir do final do século XIX, surge e começa-se a praticar a inusitada ideia de educação para todos. Mesmo assim, a escola permaneceu e ainda permanece desigual na qualidade, conforme a nação e conforme a classe social dentro da nação. Inclusive, até há poucas décadas, conforme o gênero, excluindo as mulheres.
Ao promover urbanização e as tecnologias de produção, a Revolução Industrial exigiu a ampliação no número de pessoas escolarizadas. Surgiu a ideia de escola pública universal dentro dos países industriais, mas a minoria privilegiada manteve o controle da qualidade escolar apenas para seus filhos, deixando os filhos dos pobres em escolas sem qualidade. A desigualdade na qualidade da educação se mantém como uma trincheira da desigualdade social, e da desigualdade entre as nações. Em escada mundial, cada país se preocupa em formar apenas os seus cidadãos. Em alguns países europeus, aceita-se dar escola aos filhos dos imigrantes, mas não se propõe um programa mundial de educação universal a todas as crianças do mundo.
A educação ampla só surge com a social-democracia e o socialismo. Mas para dentro do país. Hoje é preciso imaginar a educação para todos, independente da renda e do país. O futuro da humanidade exige e permite assegurar boa educação para todos.
- Na Era Antropoceno do mundo global
A globalização colocou todos os seres humanos em um só mundo, separando as pessoas por uma cortina de ouro e dividindo-os socialmente, conforme indica o desenho abaixo.
A cortina de ouro divide os herdeiros dos primeiros homo sapiens e ameaça o futuro. A continuidade desta separação não apenas impede a evolução da humanidade, mas deve levar à catástrofe moral de quebra da semelhança entre todos os seres humanos. Com a permanência da desigualdade social e o uso do avanço da biotecnologia à serviço dos ricos, os descendentes dos primeiros homo sapiens se dividirão em duas espécies biológicas dessemelhantes. A divisão mantém o clima de insegurança no mundo, pela migração em massa com consequente desarticulação social da parcela rica, ou uso imoral de armas de extinção, em auxílio à tarefa dos mediterrâneos visíveis ou invisíveis que muram as sociedades, implantando o apartheid em escala mundial, dentro de cada país. O resultado será o impulso ao terrorismo, inclusive com armas de destruição em massa, desmoralização moral dos valores filosóficos da modernidade.
A derrubada da cortina de ouro em cada país e no mundo só se fará pela educação em massa de todos os habitantes do Planeta, independente da renda e do endereço. Todos em escolas que permitam aprender o que é necessário, moral e tecnicamente, para promover a evolução da humanidade em um mundo melhor e mais belo.
Como fazer a educação?
- A escola teatral
Para preparar os agentes sociais da modernidade, foi preciso a maior de todas as evoluções humanas: a escola. Mais do que a roda, a democracia, o domínio do fogo, escola foi a invenção que permitiu o surgimento de outras invenções.
Por longos séculos, os povos originários usaram a educação simbiótica, onde a sociedade era a escola, pais e filhos eram alunos e professores. O surgimento da escola modificou a educação, profissionalizando-a. Inicialmente feita por tutores, na China, Grécia, Roma, depois, por professores em escolas religiosas, católicas ou muçulmanas no período medieval. A escola era o local onde o professor profissional exercia o magistério com auxílio da lousa individual ou papiros, em turmas de poucos alunos.
No século XV, o alemão Gutenberg, de fora da escola, fez a monumental revolução educacional ao inventar a imprensa; no século XVIII, o professor escocês James Pillans inventou o quadro negro, dando o salto que se mantém até hoje: a escola teatral do professor entre os alunos e quadro, e permitir que a memória e a retórica saísse da memória e fosse às páginas de livros acessíveis a todos, mas a escola continua teatral.
- A escola cinematográfica
Esta escola prevaleceu através de séculos até há apenas alguns anos, quando a revolução científica e tecnológica, digital e informática, trouxe o desafio de transformar a escola teatral em escola cinematográfica. A pedagogia passa o desafio que a arte dramática atravessou ao avançar do teatro ao cinema.
Na nova escola cinematográfica, a lousa é substituída pela televisão e pelo computador; as imagens desenhadas em sala são substituídas pelo uso de filmes criados a partir de bancos de imagens e de informações, do tipo Google e Youtube, compostos pelas modernas técnicas e efeitos especiais da comunicação social informatizada e interativa entre os aprendentes e ensinantes. O professor cinematográfico será o roteirista da peça pedagógica, que, com o apoio de profissionais especializados na localização de informações e na programação visual, substituirá a aula teatral, ainda presente na quase totalidade das escolas atuais, para promover a transmissão do conhecimento. Além disso, o professor do futuro precisará contar com o apoio do especialista para colocar em rede a peça cinematográfica pedagógica de forma que ela possa ser atendida no lócus da escola ou qualquer parte que o aluno aprendente desejar.
A escola do futuro deverá ser cinematográfica, digital, híbrida, no presencial e no remoto, interativa, dinâmica, multidisciplinar, convivendo com as ferramentas da inteligência artificial. Em um texto de Anastasiya Jordan, estima-se em 5 milhões o número de escolas no mundo. É um grande avanço do homo sapiens até este momento, mas pode-se desejar que ao longo das próximas décadas a humanidade evolua para todas elas estarem integradas, tanto na qualidade de cada uma delas quanto na rede que as unifique. No mundo global, os bancos, aeroportos e supermercados são todos parecidos e razoavelmente integrados, enquanto as escolas são desiguais e isoladas entre elas.
Ao tempo em que a educação era para dar resiliência à inteligência do homo sapiens em relação à natureza, para fazer uma comunidade mais segura e confortável, a educação buscava dar resiliência para o homo sapiens conviver com a natureza ao redor, agora, deve ter o propósito de cuidar da Terra e da Vida, promovendo a continuidade da evolução humana de forma sustentável ecologicamente, justa socialmente em escala planetária, livre politicamente, pacífica, facilitando a cada ser humano a busca de sua felicidade pessoal.
Levando em conta o mundo onde vivemos, e os riscos para onde caminhamos, é preciso educar para que desde a escola primária se perceba as incertezas e se adote o gosto pelas dúvidas, mais do que pelas certezas. Mais do que aprender afirmações que vêm do passado, usá-las para construir novas perguntas. No lugar de respostas prontas nos livros, o professor deve transmitir o gosto por conhecimentos novos, inéditos e surpreendentes.
A educação deve ser para fazer as novas gerações viverem sem medo e com gosto pelas incertezas. Mais do que aprender a ter resiliência com uma natureza estável, que mudava apenas pelas estações do ano, agora é preciso uma resiliência com o instável mundo real que muda conforme o esgotamento de recursos e as mudanças climáticas, mundo de ideias que mudam no curto prazo da vida de cada pessoa. A educação deve ensinar a viver em um mundo fluido na realidade e nas ideias, um mundo em permanente estado de terremoto social e ideológico.
Sobretudo, a educação do futuro vai precisar conviver com o maior dos terremotos: o potencial do uso e o risco da inteligência artificial. A inteligência natural, que permitiu ao homo sapiens ter capacidade de resiliência superior aos demais animais, agora descobre que esta inteligência criou máquinas e hábitos cujo produto ameaça a resiliência e a sobrevivência da espécie, e se surpreende que inventou a inteligência artificial que apresenta o maior de todos os desafios à educação, tanto no “para que”, quanto no “para quem” e no “como fazer”.
As palavras-chave da educação no futuro
Para que | Para quem | Como |
Incerteza | Todos os humanos | Cinematográfica |
Ecologia | Todas as idades | Digital |
Sustentabilidade | Todos os países | Dinâmica |
Solidariedade | Todas as raças | Banco de dados |
Evolução | Todas as classes sociais | Imagens |
Vetor | Global | Programação visual |
Educacionista | Planetário | Dupla resiliência |
Humanidade | Interativa | |
Natureza | Integral | |
Deslumbramento | Informática | |
Entendimento | Mídia social | |
Bem-estar | Internet | |
Metamorfose | Aprendente | |
Diversidade | Ensinante | |
Tolerância |
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