Era esse o nome do cavalo favorito do meu avô paterno, mantido na propriedade de Marés, onde ele criava gado e explorava um engenho de cachaça. A fazenda ficava no vale do Sanhauá, hoje região metropolitana de João Pessoa e parte do município de Bayeux, que ganhou esse estranho nome em 1944, como homenagem à primeira cidade francesa libertada do jugo dos nazistas. Quanto ao cavalo, assim foi “batizado” pelo meu avô, hiperbolicamente, em razão de sua rapidez. Coisas da minha terra.
Ora, aconteceu que, numa bela manhã, constatou-se o roubo de Pensamento. E meu avô recebia, na ocasião, a visita do seu irmão, João Viriato, senhor do engenho Utinga, das bandas de Alhandra, ao sul de João Pessoa. Joca Viriato, como era conhecido, sempre foi homem disposto, forjado na criação de Dona Sérvula, minha bisavó, cujos padrões podem ser avaliados pelo conselho dado a ele, em outro episódio de sua vida. Motivado por uma querela qualquer, teve que esconder-se para não ser preso. Aconselhado a entregar-se à polícia, com a promessa de um “arranjo das coisas”, o que, de qualquer modo, não deixava de ser, naquele tempo, uma desonra, dela recebeu o seguinte recado:
– “Diga ao meu filho que, se for o caso, vou ter muito gosto de enfeitar o caixão dele. Só não quero que ele se entregue”.
Sabia-se que o destino dos ladrões de cavalo, naqueles anos, era a feira de Itabaiana, grande centro de compra e venda de animais. Uma vez vendido lá, o cavalo roubado estaria definitivamente perdido para o dono. E Joca Viriato, em favor do seu irmão Mateus, resolveu tentar recuperar Pensamento. O compadre Cassimiro ofereceu-se para acompanhá-lo.
Picando as montarias, recorrendo a atalhos, depois de muitas horas de cavalgada, divisaram, à distância, dois cavaleiros. E meu tio-avô, mesmo de longe, reconheceu, pela andadura, um dos animais: era Pensamento.
Pondo-se a galope, os dois aventureiros emparelharam com os fugitivos, um dos quais ele identificou: era malandro velho, conhecido nos arredores das terras do meu avô. (Peço desculpas a quem me lê por haver esquecido o nome dele. Meu pai, que me contou essa história, já não vive, para lembrar-me). E entre perseguidores e perseguidos travou-se o seguinte diálogo:
– “Pra onde vai, com tanta pressa, Fulano?”
– “Vou pro inferno!”
– “Então, eu vou junto…”
-“Mas eu não sou puta, sou homem. Eu vou sozinho!”
– “Vai não!”
_ “Então, a gente resolve isso agora.”
Desmontou, apanhou da sela uma arma curta, jogou para o comparsa:
– “Toma, que eu tenho outra.”
E começou o tiroteio. Uma das balas riscou o pescoço do cavalo de Joca Viriato, que, por sua vez, conseguiu acertar o segundo bandido. O primeiro, que havia desmontado e teve a arma, uma garrucha de dois canos, falhada, tentou embrenhar-se no mato a pé, perseguido pelo meu tio-avô a cavalo, e voltando-se, para tentar detonar o seu segundo tiro. A tudo, o compadre Cassimiro assistia, passivamente. Até que o fugitivo foi derrubado pelo cavalo do seu perseguidor, que, desmontando, lhe pôs no peito o joelho, de revólver em punho. Só então o compadre Cassimiro se aproximou, meteu o cano do revólver na boca do vencido, e perguntou:
– “Eu mato, compadre?”
– “Agora mais não”, respondeu o compadre.
O ladrão chefe foi amarrado com as mãos nas costas e posto em cima de um cavalo. O outro, ferido e gemendo, foi acomodado de barriga para baixo, pernas para um lado, cabeça para o outro, na sela do outro animal. Não houve, é claro, preocupação sobre não ser aquela a posição ideal para se transportar um ferido. E assim empreenderam o retorno. A chegada a Marés ocorreu alta noite, com o ferido já morto e seu companheiro subjugado.
No curso do interrogatório do processo judicial, meu avô, que, além de senhor de engenho e mestre-escola, era rábula, querendo aliviar as coisas para o irmão, apresentou o enredo de que o bandido morto teria sido atingido pelo tiro do sobrevivente. Mas este, macaco velho, interveio:
– “Não foi assim não! Assim eu vou pegar trinta anos! Eu atirei no seu Joca Viriato, não matei porque não pude. Mas quem matou Fulaninho não foi eu não, foi seu Joca Viriato.”
Mesmo assim, como era de esperar, meu tio-avô foi absolvido e o ladrão condenado. E Pensamento, devolvido à sua querência, viveu ainda muitos anos, e, mesmo já sem fazer jus ao nome, ainda serviu ao meu tio João Américo, sobrinho do protagonista desta história, em vaquejadas. Morreu de velhice, sem que nada lhe faltasse, no sossego dos verdes pastos e das águas tranquilas de Marés.
Clemente Rosas, v. praticamente passou uma ordem para que eu lesse seu texto, e assim o fiz, por ora. Sim, é bem escrito. Eu sou resenhista de uma seção da revista Política Externa que se chama “O Mundo na Ficção” e assim sou mais interessada no mundo das relações internacionais do que no mundo dos coronéis e jagunços (ou de mocinhas sorridentes). Perdoa-me.
Outro dia não quis continuar uma conversa porque ela de certo modo invadia a página de Fernando Dourado, mas tenho uma correção: fui checar, e foi em 1963 que estive no Recife (e não em 1962). Não lembro do episódio que v. mencionou, e se esperei a reunião terminar deve ter sido por ordem do meu irmão, que atendi por estar no espaço dele. Naquela época eu já não estaria interessada nesse tipo de reunião, pois já estava decepcionada com as “antiques” do assim chamado Partidão, depois de ter passado 9 meses em Moscou.
Tem razão, Helga, o episódio foi em 1963. Em 1962 eu ainda estava na UNE e concluía o meu curso de Direito em João Pessoa. Mas não tinha esperança de que v. se lembrasse dele, pois foi significativo apenas para mim, pelas razões já explicadas.
Mas lamento que tenha tomado a minha veleidade manifestada de merecer um comentário seu como uma “ordem”, o que explica o tom da sua nota. Quem sou eu para isso… Minhas desculpas..
Mais uma observação: a personagem da minha crônica “O Sorriso no Elevador” não era mocinha. Era uma jovem senhora. A beleza das mulheres não tem idade, tudo depende de quem as vê, como disse um gentil comentarista àquele meu texto.
Ao escritor desta historia eu sou Edrisio andrade neto de joca viriato pai de Agricio Gomes Ribeiro (MEU PAI)
senhor do engenho da utinga, nos arredores da vila do conde cidade proxima a joão pessoa,esta historio ouvi muitas vezes…
Prezado primo,
Para mim, foi uma grande e agradável surpresa ver o seu comentário à minha crÔnica, quase seis meses depois de sua publicação nesta revista eletrônica.
Uma curiosidade: como tomou conhecimento dela? Quem lhe falou da “Revista Será?”? A divulgação de textos pelas redes informáticas é imprevisível!
De minha parte, apresento-me: meu nome completo é Clemente Rosas Ribeiro, sou filho de Evandro Carvalho Ribeiro e neto de Mateus Gomes Ribeiro. Sobrinho-neto, portanto, do seu avô Joca Viriato. Moro no Recife.
Na mesma revista eletrônica (www.revistasera.info) tenho outro texto sobre Joca Viriato e sua descendência. Na barra superior da página de apresentação da revista, clique em “Será?”, abrindo a lista de colaboradores, e clique no meu nome. Você verá a lista dos meus trabalhos publicados. Clique em CAUSOS PARAIBANOS – V, e você verá outras histórias sobre o seu avô e seus tios. E quando o fizer, me dê notícia.
Um abraço.
Clemente
CARO PRIMO, EU EDRISIO DE ANDRADE, FILHO DE AGRICIO GOMES RIBEIRO, NETO DE LUCINDA LUISA DA CONCEIÇÃO,ELA ESPOSA DE JOCA VIRIATO.
FIQUEI MUITO FELIZ EM SABER QUE ALGUÉM DA FAMÍLIA CONTA ESTAS HISTORIAS COM
FERVOR, PORQUE AO MEU VER ESTAS HISTORIAS FAZ PARTE DA CULTURA PARAIBANA,E TAMBÉM DA FAMÍLIA DE QUAL PERTENÇO.MEU CARA PRIMO CLEMENTE É MARAVILHOSO SEU TRABALHO.
MORO EM SÃO PAULO, SOU MUSICO E COMPOSITOR, PODERÁ ME ACHAR NO GOOGLE
DIGITE EDRIZIO ANDRADE.
Tomei conhecimento pesquisando o nome joca viriato ou João viriato foi quando direcionado ao roubo de pensamento
Caro primo, mais uma vez obrigado pelo retorno.
Renovo o convite para que leia, na Revista Será? (www.revistasera.info) as outras histórias envolvendo seu avô e seus tios, Edson e Ananias. Eu lhes dei o título geral de “Causos Paraibanos”, e são em número de cinco. A que fala dos seus parentes é a última, de numero cinco.
Caro primo Clemente Rosas,estive em João Pessoa com a tia Bela Filha de meu Avô Joca Viriato, em conversas com nosso primo Douglas comentou – me que esteve por lá, fiquei feliz em saber que está indo beber na fonte das boas informações, e nas raízes da nossa histórias enriquecer os detalhes que poucos conhecem. Mais uma vez obrigado primo, eu Edrizio Andrade.
Olá primo continue com suas pesquisas e relatos sobre nossa família, estive em João Pessoa. E estive na casa da tia Bela filha do meu avô Joca Viriato, também com nosso primo Douglas fiquei feliz em saber que esteve por lá, assim comentou-me o Douglas. Primo é prazer ver que se interessa por nossa história de família. Edrizio Andrade.