Fernando Dourado

Nessa noite de Todos os Santos, véspera do Dia de Finados aqui em Coimbra, Portugal, recebi a notícia do falecimento do ex-Deputado Oswaldo Coelho. Se a morte é quase banal em seu abraço inevitável – segundo alguns, ainda é a mais democrática das instituições -, só nos cabe, nessa hora de recolhimento, singularizar a vida de cada um à luz da obra que construiu. No caso dele, Pernambuco e o Brasil haverão de reconhecer que foi imensa e, certamente, lhe sobreviverá por gerações.

Político veterano de onze mandatos (três estaduais e oito federais), Dr. Oswaldo tinha estado com o Governador Paulo Câmara na semana passada, a quem levara uma invariável pauta de preocupações com sua região. Ademais, movido pela tenacidade que lhe era habitual, negociava uma autorização médica para se deslocar de Recife até Petrolina onde já agendara compromissos. Falar aos jovens e propagar seu Evangelho sobre o Semiárido era uma constante.

Conheci Dr. Oswaldo há trinta e cinco anos e, por um tempo, tivemos bastante proximidade. Por muitas ocasiões, recebi-o em São Paulo e, por outras tantas, privei de seu convívio em Brasília, Recife e Petrolina. Sequer diferenças de natureza ideológica, muito comuns à época, eram fortes o bastante para obliterar a admiração que todos lhe tinham, inclusive eu que o via tão de perto.

Incansável no dia a dia, o dínamo que o animava não lhe concedia trégua. De resto, é um traço de família. Nesse contexto de perfis obstinados, Oswaldo se reservava o direito de ser quase discreto. Não causava o impacto inicial de Nilo, nem destilava o carisma universal de José – não por acaso, ambos Senadores e irmãos mais velhos. Era, contudo, de uma eloquência solar nos gestos. Longe de ter o perfil do político oportunista, tudo nele emanava do exemplo vivido. O que legitimava seus atos e aspirações.

Nas ocasiões em que viajamos de carro pelos sertões de Pernambuco e da Bahia, me chamava a atenção o interesse genuíno que ele devotava à vida do homem comum. Siderado pelo compromisso – segundo ele, a raiz da atividade política -, traduzia em atitudes o que para muitos só ficava na intenção ou se volatizava no verbo. Avesso a frivolidades, recordarei sempre as tardes com o amigo Mário Clemente, em Higienópolis, a quintessência de um homem de trabalho – outra palavra que venerava.

Desses anos de convívio, tampouco esquecerei a menininha que sofreu queimaduras em ambas as mãos no interior da Bahia. Nos labirintos de sua bondade genuína, incomum em homens tão ocupados, ele tomou para si a tarefa de ajudá-la. E não o fez passando cheques nem se valendo da influência para marcar consultas. Levou-a para casa e lá brindou-a com o carinho que daria a uma filha. A cada progresso cirúrgico que ela fazia, ele sorria o sorriso dos bons. Isso, decididamente, é para poucos.

Assim sendo, são muitas as pessoas que tiveram os rumos de suas vidas impactadas pela presença desse sertanejo de boa cepa. O alcance de sua atuação só poderá ser medido com o passar de anos e, tenho certeza, Petrolina e região haverão de reverenciar alguém que se encaixava na máxima do inglês quando disse que “nunca tantos deveram tanto a tão poucos”. Madrugador, fino ouvinte e sábio nas ponderações, gostava de citar o filósofo alemão ao dizer que “a coruja de Minerva só levanta voo no fim da tarde”.

Como todo líder de envergadura, criou seguidores. Não somente colaboradores abnegados como Chico Granja, Cantalício, Honório Rocha e o meu próprio tio, o falecido Hélio Lucena – que o adorava -, mas foi também um farol para políticos mais jovens que se notabilizariam no cenário nacional. Poderia citar Marco Maciel, Gustavo Krause, Joaquim Francisco, José Jorge e já nem falo dos expoentes que vieram à baila nesses últimos vinte anos, quando os sobrinhos galgaram degraus.

Por fim, tenho uma admiração especial por Dr. Oswaldo porque ele viveu à sua maneira. Apesar dos vaticínios médicos, quase os desafiava ao mostrar que a chama do ideal supera quaisquer limitações. A motivação trazida por um novo dia era quase patológica e a agenda esteve cheia até o último suspiro, aos 84 anos de vida profícua. Oswaldo Coelho viveu com um olho na História. Que isso conforte seus familiares. Muito em particular, os irmãos Geraldo, Adalberto e Augusto – remanescentes de uma dinastia briosa que honra Pernambuco.

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