Quando Fernando Grostein Andrade foi à Rocinha gravar um videoclipe de uma banda de pagode e viu jovens no tráfico segurando uma AK-47, ficou se perguntando: por que os fuzis aqui, quando na Holanda as pessoas compram maconha legalmente num coffee shop? Foi daí que nasceu a idéia de “Quebrando o Tabu”, documentário lançado no circuito comercial esse ano e que assume claramente posição a favor da descriminalização da maconha. Meses depois, publica-se uma matéria de destaque de capa sobre o mesmo tema na revista Veja (31/10/12), porém com o sinal invertido. O assunto é controverso e, tal como outros ainda mais controversos (o aborto, por exemplo), tem desviado a discussão de seu foco principal, para cair em moralismos que mais encobrem do que esclarecem o assunto. O que está em jogo é o fracasso da guerra contra as drogas pela via da proibição e da repressão. Questão nova, assentada, porém, em chaga antiga de nossa sociedade: são os pobres, são os negros e mulatos, são os moradores de favelas os que povoam as cadeias, de onde continuam o negócio das drogas, onde continuam a se drogar. A experiência de mais de 20 anos mostra que a guerra às drogas, que se espraiou da era Bush II para outros países, tem sido uma guerra perdida. Até agora só favoreceu ao tráfego organizado. Será que não está na hora de uma política mais voltada para a saúde pública sem criminalizar o usuário?
Conselho Editorial
Engraçado que na mesma revista Vesga ou melhor (Veja),tem propaganda de bebidas destiladas,cervejas e etc.Bom é não fumar e beber água,mais tanta hipocrisia, se a bebida é uma droga também!!! E a ilegalidade da maconha só trás beneficio ao traficante!!!
Obrigada pelo comentário, Flávio. Reforça nosso argumento.
comparar Brasil com a Holanda nao foi feliz!!!
Por que não, Jaqueline? A distância cultural que nos separa ainda é grande, mas nada impede que nos miremos nas experiências bem sucedidas.
Caros editores: A matéria da opinião acima, de alta e urgente importância, merece desdobramentos críticos mais particularizados, no caso do Brasil, e nuançados. É esta a única objeção que faço ao texto, isto é, ser sumário demais. Há uma poderosa barreira de preconceito cercando o assunto, descriminalização da droga, impedindo assim um tratamento mais racional e isento visando políticas mais eficazes e adequadas. Como o texto corretamente assinala, as políticas repressivas, ou o tratamento meramente policial da questão, resultaram em uma batalha perdida. Políticos e críticos culturalmente conservadores, como Fernando Henrique Cardoso e Mario Vargas Llosa, tiveram a coragem de admitir este fato e consequentemente adotaram propostas de descriminilização. É nessa direção louvável que a Opinião de Será? se coloca. Acho apenas que o assunto, como comecei frisando, merece tratamento mais amplo e discriminativo. Um abraço,
Fernando.
Meu caro Fernando: Concordamos com você que a matéria, pela sua importância, merece desdobramentos. O espaço de Opinião, que é nosso editorial semanal, não comporta um tratamento mais detalhado da questão. Mas prometemos um artigo para breve. Aguarde.
A ilegalidade da maconha remete ao passado de ilegalidade das expressões culturais negras. Essa é uma questão crucial bastante negligenciada no discurso de descriminalização da maconha. Inclusive, esse artigo, como outros desta, revista se permitem (ou não perceberam, ou tive a impressão errada, prefiro pensar) reafirmar a estigmatização do pobre e do negro.
Pouco se fala também de política internacional, dos acordos e tratados nos quais o Brasil amarrou as mãos (não podemos legalizar drogas, não podemos produzir conhecimento sobre tecnologia nuclear o quanto quisermos etc.)
Obrigada pelos seus comentários, Juliana. Quando afirmamos que “são os pobres, são os negros e mulatos, são os moradores de favelas os que povoam as cadeias, de onde continuam o negócio das drogas, onde continuam a se drogar”, não estamos estigmatizando essas categorias injustiçadas de nossa sociedade. Ao contrário, estamos apenas constatando um fato real, no intuito da denúncia e não da estigmatização. Conforme respondi ao questionamento anterior ao seu, o espaço de Opinião é pequeno para a complexidade do assunto. Mas voltaremos a ele e espero que você continue nos acompanhando.
Camaradas
Muito bom, apesar de resumido, como ressaltou FML. Lembraria que o mercado consumidor é formado principalmente por brancos endinheirados, em busca do “brilho” e sempre incólumes. Aos pobres resta o crack. Bom, extrapolei da maconha… mas o próprio texto fala em guerra às drogas, em cuja hierarquia a maconha é a menos maléfica, exceto por ser porta para entrada nesse mundo das drogas pesadas.