a) O cozido; b) Grappa na praça; c) Uma voz familiar
Almocei na “Taverna di via Stella” e, para manter a escrita, fui valente à mesa. Comi com gosto o aclamado lesso con la pearà, uma versão da região do Trento para o cozido pernambucano. Alguém perguntará: qual dos dois preferes? Ora, ambos. E, nas entrelinhas do paladar, ainda haveria lugar para os primos. Ou seja, sobraria apetite para o português; o puchero espanhol; o pot-au-feu francês e, evidentemente, o de Severina, na casa de mamãe. Há de se reconhecer, contudo, que o cozido dessa parte da Itália evoca bons momentos. Aqueles quando frequentava o extinto Cá d´Oro, de São Paulo, e, pelas mãos do maître Ático – um nobre do sertão baiano -, e na companhia de convidados, eu os surpreendia. Pois para quem ignorava a versão veneziana do repasto vigoroso, ali chamada de bollito misto, era com prazer que apresentava o carrinho atapetado de maravilhas do terroir europeu. E, então, até o nível da conversa se elevava.
Na saída, acolhido pela tarde gelada, resolvi tomar uma grappa na Piazza Bra, aqui de Verona, precisamente no La Costa, bem diante da imponente arena. Aquecido pela bebida, fiquei imaginando que o mínimo a fazer era não jantar quando a noite caísse. Que tomasse uma sopa e um chá. Ou, no máximo, que encarasse uma salada de tomate com bufalina e um copo de vinho branco. Pois, depois do cozido e do pirão transcendental, picante e rescendendo a carnes rústicas e bem temperadas – zampone, língua, coelho, pato, codeghino -, sentia que a morte se aproximara rapidamente de mim e, por certo, me espreitava da mesa vizinha. Com ela, Satanás que, deliciado, se regozijava de antemão do privilégio duvidoso de ser meu anfitrião no além-túmulo. Nem que seja só para sancionar a gula e a luxúria. A bem da verdade, de ambas só sobrou a primeira, mas a pena deve ser retroativa e cumulativa na sucursal do juiz Moro.
Quando serenei com a segunda grappa, e, quase sem culpa, me perguntava se não deveria filar um cigarrinho do velhote que lia o Arena, percebi uma voz que, de tão familiar, mais parecia que a escutara na véspera. E não há quase quinze anos. Como não sou movido a ansiedades – seria fatal a meu estilo de vida -, salvo talvez quando com fome, preferi acompanhar a conversa e me certificar pela via dedutiva da audição. Superando, assim, a tentação fácil da confirmação imediata que me daria uma olhada de esguelha. Escutando-a, saberia em um minuto se era mesmo ele. Mas ora, bastaram mais duas frases, entoadas no sotaque metalizado da Lombardia, para que eu tivesse a certeza. Que sorte eu tivera pois ele não me reconheceu quando cheguei. Assim, poderia me preparar para o reencontro inevitável. E até escapar. A caminho da terceira grappa, me virei e então disse: Ciao, Enrico. Ti ricordi di me, amico mio?
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d) Flash back; e) Menino mimado; f) Paladar de puta
Conheci-o em 1985, portanto há mais de trinta anos. Tinha eu 27; ele, 32. O pai era greco-turco e fizera fama como banqueiro aguerrido no Piemonte. Domiciliado mais tarde em Monte Carlo, coube ao varão tocar adiante o legado paterno já que as duas irmãs não contavam – como reza a tradição levantina. Ornella teria feito bonito no ramo pois tinha a intuição dos vitoriosos. Até fisicamente lembrava Ana Botín, a banqueira talhada pelo pai para tocar o Santander e que hoje o preside. Mas a Ornella competia casar com um armador bem-nascido de Izmir ou Salônica e dar netos ao velho. O que vem ao caso é que foi graças a Enrico que refinei minha percepção sobre milionários entediados e italianos soberbos. Especialmente sobre peninsulares abastados, o que significa que ele, a seu modo, me preparou para um dia ler sem surpresa a alma de um sujeito atormentado, enfermiço e manipulador como Berlusconi.
Não que Enrico fosse má pessoa. Mas eram tantas as dúvidas que o assolavam que, como veria nos anos seguintes, ele se consumiria numa espiral de angústias que mesclava Oriente e Ocidente, masculino e feminino, liderança e subserviência, amor e ódio, depressão e euforia, amizade e beligerância. Das vezes que eu ia almoçar com o patriarca a sós, geralmente no Savini de Milão, este arqueava as sobrancelhas e dava a entender que não sabia o que dera errado em seu experimento. Por que Enrico se complicava com coisas simples da vida? Minutos depois, ele mesmo respondia. É porque nascera rico. Desse mal, ele não padecera. Pois teve uma infância pobre sob Atatürk e viveu as incertezas do Mediterrâneo Oriental a ponto de pensar em ser militar. Nascera para ser um leão e não uma ovelha. Um dia lancetou a bolha do drama vocacional: seria milionário. O resto é História e foi dos grandes de seu tempo.
Quanto a Enrico, secretamente protegido pelas muitas mulheres da família, cresceu como boa parte dos italianos de sua geração: mimado, choramingas, caga-regras e hipocondríaco. Até onde mantivéramos contato, ele já tinha sido casado três vezes. A última, aliás, com uma brasileira. Foi a única boda a que não compareci. E por um bom motivo. Quando ele me apresentou-a, dela dizendo que tinha sido atriz da Globo, pediu ali mesmo uma avaliação sincera porque pretendia desposá-la. Então, eu atendi à convocação com honestidade: “Enrico, mulher que pede coquetel de camarão de entrada e, de novo, camarão como prato principal, tem grande chance de ser puta. Calma, não se afobe. Dizem que uma puta convertida é bom investimento. Torna-se mulher fiel e dedicada. O problema são as recaídas”. Ali praticamente parou a amizade. Meses depois, ela ganharia um sobrado em Firenze. Ele, um pé na bunda e adornos na cabeça.
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g) À velocidade da luz; h) Atualização ; i) Confeccionando um tipo
Pois bem, lá estava Enrico com o olhar esgazeado de sempre. Com a mesma mirada clínica a me varrer e a tentar tirar conclusões em desespero: é Fernando; engordou muitos quilos; o rosto permanece igual; continua gostando de grappa; está só; deve ter ouvido minha conversa; o que dirá de mim; como conto minha vida; é a primeira vez que o vejo de sapato tênis; será que sua mãe ainda vive; como devo apresentar Francesca; é verdade que o Brasil está em liquidação; o que faz ele em Verona; onde estará hospedado; quando nos vimos pela última vez; será que já sabe da galeria; nunca o vi no Facebook; ele me parece amigável; será que quer uma carona para Milão; já sabe da morte de Marco Visconti; a barriga está saltando sobre o cinto; enfim, importante é preservar a imagem de sucesso com Francesca. Mamma mia, como eu o conheço. A verdade é que flagrar-lhe o ar aparvalhado me remeteu aos bons anos 80.
A conversa provaria que eu o lera com a proficiência dos antigos pois Enrico, na essência, continuava o mesmo e seguiu o script. Apresentou a mulher de doce sorriso e, talvez, de bons trinta anos menos que ele, como sua compagna. É feio, mas melhor do que banalizá-la como fidanzata. Disse que juntos tinham uma galeria em Modena – terra dela – e que, como eu deveria já saber, vendera a carteira de clientes do banco. Tinha vocação mercantil, não de banqueiro de investimento. O finado Visconti o acompanhara até o fim, conforme pedido do velho. O que os trazia a Verona? Não, não era para se inspirar na história de Romeo Montecchi e Giulietta Capuleti. Os amores proibidos ficaram para trás. Tinham vindo ver a exposição de Tamara de Lempicka, no Palazzo Forti. Che donna! Como galerista, doravante, era importante se inspirar. Arregalando os olhos azeviche e sacudindo uma estranha barba de lenhador nórdico, disse que eu deveria vê-la. Escravo de clichês, se saiu com “o que é a vida sem arte”?
O bate papo foi amistoso, quase agradável, mas eles precisavam ir porque ainda teriam que enfrentar o trânsito de retorno do domingo. Trocamos coordenadas e me senti feliz por vê-lo menos vulnerável. No passado, Enrico era presa fácil de modismos, coitado. Já usara trança como Baggio; tiaras como os metrossexuais da Via della Spiga. Já caíra em arapucas da homeopatia e deixara rios de dinheiro na medicina ortomolecular. Desistira de pelo menos dez terapeutas e achava que se vestisse calça amarela, camisa vermelha e blazer verde-esmeralda seria um vencedor e tudo se resolveria. Entrava e saía de spas de emagrecimento mensalmente e estava sempre venerando um novo médico. Mas o que me irritava nele era o reducionismo do pensamento. Acreditava que as pessoas eram movidas a interesse e dinheiro. E jurava que não se comia decentemente fora da Itália. Tudo que estivesse fora desse credo simplório era cabotino. Pazzo!
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j) A briga; k) Passividade; l) Coronel ou capo?
Peguei, então, o ônibus 90 para o hotel Gardenia, na periferia de Dossobuono. Ora, aqui na via Mantovana durmo à razão de 48 euros, e só mais um de taxa. Bom motivo para não ficar no Centro Histórico. Às vinte horas nessas latitudes, contudo, o momento é de dispersão geral e quase todo mundo vai para casa, tangido pelo frio inclemente. Acomodado à janela, eis que ouvi um grito e, simultaneamente, uma lata de Coca Cola passou zunindo e acertou o vidro espesso. À minha direita, discutindo num italiano estropiado, permeado de palavras ininteligíveis, dois africanos enormes trocavam sopapos com vigor. Tanto quanto lhes permitia o elevado grau de embriaguez e as roupas de frio que lhes tolhiam os movimentos. Na curva seguinte, em pleno pugilato, um deles se esborrachou no corredor, abrindo uma clareira de gente. O que vinha a ser aquilo? Acaso vivia um pesadelo? Onde achavam que estavam? Na planura da savana?
Como se estivesse num circo romano, ninguém se envolvia com a peleja. Uma moçoila sentada quase ao lado, ainda adolescente, nem se dava conta do que ocorria. De fone nos ouvidos e entretida com um chat erótico pelo celular, ela só sorria e apertava as pernas. Se uma bala lhe varasse o crânio, morreria quase feliz. Os passageiros a tudo assistiam. Que se esfolassem. Mas o ódio de alguns ao espetáculo era palpável. Tanto quanto a impotência. O contendor que se manteve de pé queria mais. Pois, de dedo em riste, saiu a insultar os testemunhos como ensandecido. “Isso aqui também vale para vocês. Tudo o que queremos é respeito. Respeito, entenderam? Respeito, cazzo.” E tome outro chute na lata vazia. Siderado pela droga, percorreu o ônibus geminado de uma ponta a outra até saltar na estação, arrastando o derrotado pela gola. Na saída, mandou todos se foderem. Alívio geral e comentários sussurrados.
Então chegou minha vez. Alforriado pelos meus 57 anos e amparado pelo muito que vi da vida, não tenho mais porque silenciar diante de certas aberrações. Em voz branda mas audível, tal como um coronel de Clemente Rosas, disse ao motorista: “Você é o único culpado por deixar toda essa gente apavorada. Somos seus passageiros. Não é possível que não tenha um celular para acionar os carabinieri. Se esses caras fossem brancos, era o que você faria sem hesitar. Você é o capo, entende, é como um comandante de avião”. Ele reduziu a velocidade e, me olhando pelo espelho, se defendeu. As coisas são assim aos domingos, já estava acostumado. Pois não deveria, rebati. Negros, brancos ou amarelos têm que ser tratados igualmente. Pelos feitos bons e os maus. E sem paternalismo idiota que termina sendo discriminatório. Uma senhora me apoiou e logo foi secundada por um jovem que vomitou a indignação que guardara com o pavor. Ele fechou a janelinha na tentativa de encerrar a conversa. Saltei na parada Sgulmero e soltei o que não queria calar: vigliacco, vigliacco.
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m) Femme fatale; n) Vida em festa; o) Dona do mundo
Na terça-feira, já refeito do cozido, do reencontro com Enrico e da covardia do motorista, fui ver a exposição de Tamara de Lempicka. Pergunto: que homem já não se sentiu tentado pela chamada femme fatale? Pois digo: elas são fonte de adrenalina, despesa, mas também de ternura. As duas condições para conviver com elas são: que seja um relacionamento curto e intenso; e que você seja o outro. Jamais o titular. Não faça como Enrico. Assim, você vai curtir a pleno as sevícias da sedução a que elas nos submetem. A bissexualidade de ocasião sequer o atormentará. Muito pelo contrário. Os casacos mink ficam por conta dos patrocinadores oficiais. Você é agraciado com contos de alcova e, sendo ela prendada, você espiará de perto uma tribo interdita às mentes convencionais. Mas jamais se apaixone a ponto de ter ilusões, pois elas são fonte de ruína. Nem faça como o motorista porque elas farejam a fraqueza a léguas. Mostre quem manda numa linguagem que elas entendam.
Tamara de Lempicka viveu no século passado e não se sabe se nasceu em São Petersburgo ou Varsóvia. Pela personalidade forte, independência e aptidões mundanas, tinha meia Europa a seus pés aos vinte e poucos anos. Dona de mais charme do que beleza, viveu em Paris, Nova York, Los Angeles e Cuernavaca, México. Poliglota, enrolou muito a língua com mulheres e, mais por luxúria do que militância, frequentou ciclos homossexuais no início da década de 30, em Paris. Festeira e refinada, casou com homens ricos e apresentava a filha como irmã, já que a tivera aos dezoito anos. Desenhou vestidos de haute couture, chapéus, sapatos e padecia de depressões pavorosas que a levaram também a conhecer as sombras. Ávida por aprender, contudo, tomou aulas de pintura depois de consagrada e refinou o ofício. Antes da Segunda Guerra, já fora citada em três continentes e expusera até nos Estados Unidos.
Ora, lugares como o Hermitage e o próprio Palazzo Forti deixam o visitante desconcertado. O que mais merece a atenção? A obra exposta ou a grandiosidade do imóvel? Sugiro que se alterne a visão para se desfrutar de ambos. Para tanto, deixe o sobretudo no vestíbulo, chegue de mãos vazias e esqueça o relógio. No caso dela, você concluirá que para tudo na vida há precedente. E que a tal Tamara era um poço de carisma, talento e cosmopolitismo. Hoje é fácil ter um pé no mundo. Espantoso era ser uma mulher globalizada avant la lettre e viver no eixo da cultura segundo regras que ela própria fixava. São dezenas os quadros de nus. A pintura se impõe pela força cromática e ninguém que se detenha diante de um quadro ficará indiferente à origem e destino da autora. Eis uma exortação para saber mais. Enfim, tive uma musa em Verona. Sem tranças nem terraço. Mas de nome forte.
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p) Lobo solitário; q) Sucata humana; r) Chá noturno e autonomia
As pessoas me perguntam se é bom viajar só. Em recente debate em Portugal, um escritor dizia com propriedade que quem viaja em grupo é absorvido por ele e que o desafio passa a ser o de acomodar as individualidades. Sinceramente, já não sei se procede porque as minhas experiências de grupo se tornaram exceção. Mesmo acompanhado de mulher e enteados mundo afora, era ponto pacífico que, em dado momento, eu me desgarraria da manada pelo dia. Ia ler jornais, sentar nos cafés e caminhar sozinho. Podia até mesmo ir comprar ingressos para um programa desportivo ou artístico. Ou seja, trabalhava para o grupo com paciência, mas nunca no grupo e com ele. Isso porque tenho aversão ao consenso, à unanimidade, aos caprichos do coletivo, às oscilações de humor dos adolescentes e até mesmo à labilidade das mulheres. De homem, nem se fala. Em qualquer viagem, um em cada três dias é meu comigo mesmo.
Longe de ser uma exceção, sou dos que contribuem para que o ser humano, no geral, esteja deteriorado. A quantidade de neurastênicos e complexados que nos aparecem pela frente é um convite a uma vida retirada. Tanto quanto possível, ao abrigo das mesquinharias e maldades deliberadas que juncam o espaço do convívio. Quando estou só, portanto, estou comigo e com o local. Ninguém vai me deitar olhares de censura porque eu não quis visitar um anfiteatro romano sob o sol do meio-dia em pleno verão. Para ninguém vou ter que explicar as diferenças entre basílico, agrião, hortelã, rúcula, escarola, alecrim, erva-doce e alho poró. Muito menos ter de saber o nome de cada uma em dez línguas. Como já não sei camuflar minha irritação como fazia em outros tempos, tenho reações que podem se confundir com desamor. A saída é me evadir. Sequer uma bebedeira me conforta porque não tenho mais tempo para purgar ressacas.
Não sei quanto tempo me resta para viver a experiência da solidão nos burgos da Europa, nos confins da Terra e onde quer que ela acabe. Aliás, ninguém sabe. Baseado nisso, vivo o presente e caso a todo instante compromissos profissionais com uma agenda descolada de outras prioridades. Passei boa parte de minha juventude rodando mundo, mas estive muito ligado a trabalho. Nesse milênio, as coisas se inverteram. E assim é que que as experiências mais banais passaram a ganhar o lugar que merecem: uma exposição, um incidente de ônibus, um prato suculento, um encontro fugaz, o abraço do frio, o silêncio das madrugadas, os diálogos entreouvidos, as noites passadas ao lado de uma bandeja de frutas e uma xícara de chá. Na outra vida, tudo isso seria nota de rodapé. Cada um tem suas manias. A única coisa que compro em viagens são livros, um remédio para a pressão e Sinvastatina. O resto, bem, são memórias que antecipo em suaves prestações.
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Segundo Monica de Bolle, a mais jovem e brilhante dentre os analistas econômicos (sem distinção de gênero), “nenhum roteirista de novela faria um enredo tão complexo como a atual situação econômica do país”. Mas esse seu “diário” levanta tantas questões que talvez v. conseguisse desmentir a Monica. Quem sou eu para saber se puta pede coquetel de camarão de entrada (tenho que rir, pois em décadas anteriores eu gostava muito de coquetel de camarão). Então vou ficar só no episódio do racismo às avessas, da tolerância que não existiria se os briguentos rolando no chão e se chutando dentro do ônibus em Verona fossem brancos: uma vez, em Frankfurt (acho que foi ano 2000) ouvi um turco, em alemão precário misturado de inglês mais precário ainda, xingando aos berros a atendente no guichê da estação de trem. Enquanto ele gritava descontrolado, sem parar, os alemães (e eu) esperavam, olhando em silêncio, e a fila aumentava. Lembro que pensei: se fosse um alemão fazendo isso já teriam chamado o guarda. O resto do seu diário, “mamma mia”: estou embasbacada, mas desisti de perguntar o que é ficção, o que é realidade, deve ser tudo junto e misturado.
Helga,
Você só me traz alegrias. Uma delas a de sentir o quanto seu ceticismo é constante. Pra que mudar? A outra é que você me acompanha onde quer que eu vá. Mas dois detalhes hoje citados pedem esclarecimento. O coquetel de camarão em si nada tem de errado. A vocação para a mais antiga das profissões se torna sintomática quando a ele se segue outro prato de camarão – este como principal. E a certeza sobe a 99% se ela pedir Crêpes Suzette flanbadas com licor Grand Marnier de sobremesa. Só vira a tempestade perfeita de Monica se, já na chegada, ela também tiver pedido Champagne, ou mesmo Kir Royal, sem que se lhe tenha sido sugerido. O Champagne é a única bebida que só se oferece, ninguém acompanhado a deve pedir por iniciativa própria. Mas tem que ser a sequência toda, entendeu? Portanto, pelo menos para mim, você continua impoluta…sem rimas.
Legal seu exemplo do turco. Parte de uma posição “aloof” dos nórdicos bem nascidos. No caso que presenciei, foi como se dois cachorros tivessem se estranhado no ônibus. Logo não mereciam ser levados a sério, entende? Em suma, foi um ato discriminatório e paternalista. Na entrelinha, a constatação de que “dessa gente se pode esperar tudo”. Obrigado, Querida.
Caro Fernando.
Agradeço a referência aos meus personagens, o que indica que estão despertando algum interesse entre meus poucos leitores.
Seus relatos, como sempre, revelam agudo senso crítico, imaginação, sensibilidade e uma adjetivação de fazer páreo com Eça de Queiroz. Dou apenas um exemplo: o “pirão transcendental”!
Já mudei o meu “mouse” para o lado esquerdo, de novo…
Clemente,
Não acredito que seus leitores sejam tão poucos. É que eles, em geral, são contidos nas manifestações de apreço e até de crítica. E um escritor de verdade como você, já deve ter se acotumado a certa solidão. Uma vez João Ubaldo disse que o leitor mal imagina o quanto um simples parágrafo foi de resolução penosa para o escritor. Tudo isso para que o leitor passe voando por ele, e não tenha a sensação de que a narrativa enguiçou. Nos dias de hoje, então, com tantos estímulos ao alcance do mouse – para usuários ambidestros ou não -, quem há de querer dar sinal de vida? A velocidade da propagação que nos ajuda é a mesma que nos soterra. Sequer viramos jornal para embrulhar peixe. Isso dito, Clemente, obrigado pela força.
FD
Muito bom, Fernando. Li num só fôlego. A narrativa nos distrai/emociona, nos ensina e nos questiona. Parabéns!
Do texto, destaco, particularmente,a densa reflexão abaixo:
“Longe de ser uma exceção, sou dos que contribuem para que o ser humano, no geral, esteja deteriorado. A quantidade de neurastênicos e complexados que nos aparecem pela frente é um convite a uma vida retirada. Tanto quanto possível, ao abrigo das mesquinharias e maldades deliberadas que juncam o espaço do convívio. Quando estou só, portanto, estou comigo e com o local.”
Gileno,
Seu destaque foi um prêmio à minha amargura. Você concebe um desses parágrafos que brotam do teclado de maneira tão espontânea que sequer nos damos conta deles na releitura? Pois bem, foi o caso desse que mereceu seu destaque.
Veja , contudo, que é da magia que se estabelece entre o autor e o leitor não-preguiçoso, que vem a revelação: você pinçou as únicas linhas que sintetizam 0 arrazoado todo. As palavras mais despretenciosas do cenário magnífico que, pensando bem, é vão.
É por isso que um sinal de vida qualificado do leitor é impagável para o masoquista do escrevinhador. É como conversar com um amigo. Num pequeno ato falho, num parágrafo que poderia ser enchição de linguiça, um olho treinado percebe a essência. Certeza que Clemente concorda.
Assim fazendo, se renovam as esperanças de que vale a pena investir tempo, energia e criatividade na próxima crônica. Da mesma forma que os monoteístas dizem que quem salva UMA vida, salva A humanidade, um escriba se dá por realizado com UMA única obsevação aguda.
É o lado benfazejo do efeito bumerangue. Dizer o que, a essa altura? Obrigado.
Abraço,
FD
Excelente. Me diverti a valer. E acredite: estava precisando dar umas boas risadas mas com algo que valesse a pena. E valeu!!!
Obrigado, Ivone. Folgo em ouvir que valeu a pena. Também acho que rir continua sendo o melhor remédio.
Abraço,
FD
Já que v. invocou o meu testemunho, Fernando, concordo sim, com toda a sua análise do ofício de escrever. E acrescento minha observação: para mim, pode ser um prazer, mas é também sacrifício. Costumo dizer que, para o escrevinhador, só há três momentos de alegria: quando damos o texto por acabado, quando o vemos publicado e quando um amigo nos telefona, ou nos escreve, dando-nos um “feed back” inteligente. V. tem sido bem aquinhoado, nesse terceiro momento.
Você tem toda razão, Clemente. Começar, de qualquer forma, é o estágio mais penoso. A tela em branco te olhando com ar de provocação e você ensaiando um começo que, no final, terminará no meio ou sumirá de todo. E, depois de tudo no lugar, vem a carpintaria a que aludia Gabo. O momento de cinzelar, burilar, polir e liberar. Sim, comentários são um grande prêmio e um só pode gratificar mais do que dez.
Abraço,
FD
Abril em Verona (2015), na Piazza Bra, diante da arena (sem a imponência do COLISEU, mas…). Transformada em teatro ao ar livre para grandes eventos, o espaço tinha que ser mesmo reaproveitado… Será? Mas o descaracterizou bastante. Conosco não acontece nada de extraordinário. Simples turistas acidentais. Se, por acaso, ocorresse, não contaríamos o episódio com tanta propriedade e desembaraço, tornando- o uma leitura tão agradável.
Apenas a origem dos ancestrais italianos nos emociona, particularmente… È vero!
Sim, presenciamos uma solenidade muito emocionante (Piazza Bra). A comemoração do fim da 2º guerra mundial. Banda tocando, soldados perfilados, ex-combatentes, muito tocante. Hoje me emociono com uma facilidade tremenda… A idade, caro primo!
Sim, os terroristas ainda não atacaram a Itália (in nomini Dei). Afinal, você bem sabe. O islamismo, a Igreja, o marxismo não podem ser responsabilizados pelo EI, Inquisição e por Stalin respectivamente.
Aliás… Vimos vários negros perambulando pelas ruas, em Firenze. .. ”Che cosa, situazione delicata”.
Abraço fraterno.
Flavio,
Imagino a beleza daquela praça numa comemoração com pompa e circunstância como são todas as alusivas à Guerra. Na falta de grandes efemérides, me virei com o que apareceu. Embora não seja um Sivini de sua estirpe, a Itália também me emociona de onde quer que a veja. Quem sabe um dia não nos encontramos por lá?
Sua presença nesse espaço me enche de alegria.
Abraço,
FD
Muito bom seu artigo!Meu irmão se Chama Romeu por causa do Romeu e Julieta.
A gente até brinca com ele que ele tem que arrumar sua Julieta.
Que alegria que tenha gostado, Renata.
A história integra hoje um livro chamado “Nos passos de Fiszel Czeresnia e outras estórias”, publicado pela Chiado Editora. É integralmente composto por narrativas publicadas em Será?
Um abraço,
Fernando