Sérgio C. Buarque

Lost future series 26 – Ardalan Naqvi.

O Brasil atual, com essa combinação lamentável de crise econômica e forte desequilíbrio fiscal, desagregação social, pobreza e desigualdades, violência e degradação política e moral, não é o resultado de um acidente histórico ou do simples azar. É uma realidade construída pelos brasileiros, com as decisões e escolhas feitas no passado, desperdiçando e dispersando recursos públicos, sempre escassos, que deveriam ter sido alocados em prioridades estratégicas de grande poder transformador, como educação, inovação e a infraestrutura. Além disso, foram definidas muitas regras e procedimentos que amarraram e engessaram o planejamento orçamentário numa distribuição de gastos e privilégios descabidos.

Decisões totalmente equivocadas, ou graves omissões, na definição de políticas e na alocação dos recursos públicos nos levaram, ao longo das décadas, a uma posição muito atrasada do Brasil em todos os indicadores, quando se compara com o resto do mundo: somos o 81º país no ranking de competitividade das nações, nossa produtividade é apenas um quarto da produtividade da Coréia do Sul. Na educação, o Brasil está entre os últimos na prova PISA, nas três disciplinas (63º em Leitura, 69º em Matemática, e 67º em Ciências), bem abaixo do Chile e de vários países da América Latina. Convivemos com uma das mais elevadas desigualdades sociais e com um dos mais altos níveis de violência, registrando mais mortes violentas por ano que a Síria em plena guerra.

Como dizia Nelson Rodrigues, “subdesenvolvimento não se improvisa, é obra de séculos”. Ao longo das décadas, o Brasil tem sido dominado pelas emergências e priorizado as ações imediatistas e assistencialistas, preferindo as gambiarras e os arremedos simplistas e populares ao enfrentamento dos estrangulamentos estruturais. Neste período, o Estado brasileiro foi sendo capturado e corroído lenta, mas, profundamente, por diferentes grupos de interesses e corporações influentes que chamam de direito os seus privilégios, que hoje comprometem parcelas crescentes dos recursos públicos. Querem um exemplo? O Sistema Judiciário no Brasil gasta apenas em salários cerca de R$ 41,16 bilhões por ano (sem contar os vários penduricalhos que disfarçam o rendimento total), cerca de metade, gastos na Justiça do Trabalho. Enquanto isso, a União gastou com educação no ano passado cerca de R$ 100 bilhões (todas as despesas, e não apenas os salários dos servidores).

Não é possível construir o futuro do Brasil com estas flagrantes desproporções na alocação dos recursos públicos, comprometidos com “direitos adquiridos”, que resultaram de decisões equivocadas do passado, influenciadas pelos lobbies de poderosas corporações, e que precisam ser corrigidas e adequadas às novas condições e às prioridades estratégicas do país. Os economistas têm a mania de fazer perguntas incômodas mas fundamentais: “Quanto custa?”, “Quem vai pagar?”, “Qual o resultado esperado?” Para pensar o futuro do Brasil, temos que começar pela última questão: queremos uma economia eficiente e uma sociedade igualitária? Então, estamos fazendo tudo errado, há décadas. O Estado brasileiro custa muito e é ineficiente. E, mais do que isso, está alocando recursos em áreas e para atender a interesses que tendem a manter o baixo nível de competitividade, a limitada produtividade da economia e o baixo nível da educação, que reforçam a enorme desigualdade das oportunidades na sociedade.

Angustiados com a crise do momento, os brasileiros não conseguem pensar no futuro. Cada grupo social busca apenas sobreviver, e as corporações atuam para segurar seu pedaço do Estado falido. E os políticos, além de comprometidos com a corrupção, movem-se e decidem preocupados com seu próprio mandato e com a próxima eleição. Corremos, assim, o grande risco de persistir nas decisões erradas e nas omissões que devem prolongar o nosso subdesenvolvimento e o distanciamento dos países líderes.