O enorme descrédito dos eleitores com a política, com os políticos, e com o stablishmentem geral tem levado a maioria dos analistas a prever altas taxas de alienação eleitoral (abstenção + votos em branco + votos nulos) no pleito de 2018.
A experiência da eleição passada recomenda cautela nessas previsões. De fato, embora o ambiente daquele período fosse muito menos carregado que o de hoje, no qual se vivenciam superposições de crises, o fato é que as bandeiras empunhadas nas manifestações de rua de 2013 (rua física e rua virtual) estavam fortemente impregnadas de sentimentos de anti-política, anti-representação (“vocês não nos representam”) e anti-governo, tal qual se detecta no momento presente.
Havia uma grande expectativa de que o eleitorado fosse reverberar esses sentimentos na eleição de 2014, protestando contra a velha política, deixando de comparecer às urnas e/ou votando em branco e anulando o voto. Prospectava-se, assim, um grande aumento na taxa de alienação eleitoral (AE).
Isso não se verificou. A AE de 2014 (28,3%) na eleição para presidente foi praticamente igual à de 2010 (27,5%), ano de normalidade, computando-se a média entre os respectivos turnos. Nos pleitos para deputado federal e estadual em Pernambuco, por exemplo, também ocorreu a mesma coisa: os percentuais de alheamento eleitoral nos dois anos cotejados foram virtualmente idênticos, na casa de 32% para federal e de 30% para estadual.
Mas, quais seriam as consequências de um aumento na AE,neste ano, se houver, para a eleição de deputados em Pernambuco, comparativamente a 2014? A que resulta mais evidente é sobre o quociente eleitoral (QE). (É importante ter presente que o eleitorado pernambucano teve um incremento de apenas 3,4% de junho de 2014 a junho de 2018, passando de 6.356.308 para 6.570.070 eleitores).
Se, entre 2014 e 2018, a AEcrescer na mesma proporção do eleitorado, os votos válidos não se modificam e o QEpermanece inalterado, na casa dos 179.329 votos para federal e 93.930 votos para estadual;
Se, no lapso de tempo em apreço, a AEcrescer proporcionalmente mais que o eleitorado, como é esperado, então os votos válidos cairão e, por via de consequência, o QEdiminuirá.
Imagine-se, por exemplo, que a AEem 2018 atinja 40,0%, como se especula, o que seria 8,1pontos e 10,3 pontos de percentagem maior que a AE de 2014 para deputado federal e estadual, respectivamente. Neste caso, oQE para federal cairia para 170.900 votos e o QE para estadual para 87.450 votos.
E o que significam para partidos, coligações e candidatos esses quocientes bem menores em 2018 relativamente aos registrados em 2014?
Bem, começando pelo mais óbvio: partidos pequenos e médios ou coligações deles, cuja votação esperada se situa na proximidade do QE da eleição passada, aumentarão as chances de ascender ao Parlamento [no caso, fazendo um deputado pelo quociente partidário (QP)].
Partidos ou coligações com votações assemelhadas às de 2014, que já haviam transposto o QE de então, com mais força ainda ultrapassarão o novo quociente, uma ou mais vezes, e farão, por definição, tantos deputados quanto a parte inteira do QPindicar. As vagas parlamentares não preenchidas serão disputadas normalmente, observando-se a nova composição numérica de sobras de voto.
Em qualquer circunstância, os eleitos continuarão sendo os mais votados, isto é, um menor QEnão altera a posição relativa de votos dos candidatos dentro do partido ou coligação.
Por exemplo, antes, em 2014, um partido ou coligação com 180 mil votos para estadual, confrontando um QE de 93.930 votos, faria um deputado diretamente pelo QP e entraria na disputa de vagas por média com sobra de 86.068 votos, tendo grandíssima chance de conquistar uma vaga adicional.
Agora, com um QEmenor, de 87.450 votos, esse mesmo partido ou coligação obteria diretamente duas vagas parlamentares pelo QP.
Se nesse partido ou coligação os três candidatos mais competitivos têm 42 mil, 41 mil e 40 mil votos, respectivamente, o primeiro será eleito pelo QP, com o QEmaior ou o menor, o segundo tem alta probabilidade de ser eleito por média com o QEmaior e será eleito diretamente pelo QPcom o QEmenor. O último candidato ficará sempre como suplente neste exemplo.
Note-se que as posições relativas de votação dos candidatos no seio do partido ou coligação ficam imutáveis, pois independem da magnitude do QE. O adversário de cada um continua sendo o companheiro de chapa!
Por último, cabe verificar se um menor QE em 2018 traz alguma consequência para os partidos ou coligações face à abertura propiciada pela reforma eleitoral de 2017, permitindo que tais agremiações mesmo não tendo alcançado o QEpudessem disputar sobras de voto e terem perspectiva de ascender aos Parlamentos.
Um partido ou coligação que não atinge o QE, qualquer que seja a magnitude deste, para usufruir da nova legislação, deverá sempre ter certa densidade eleitoral, com votação nas proximidades do QE(condição necessária) e, nas rodadas de cálculo de repartição das sobras, almejar que esta votação esteja no rol das maiores médias de voto, entre aquelas que assegurem vagas no conjunto das que restam ser preenchidas (condição suficiente). Portanto, nada muda neste quesito.
Mas, enfim, a prudência orienta não alimentar grandes expectativas sobre mudança de comportamento do eleitor para 2018, como reflexo de sua manifesta rejeição à política e aos políticos. Como diz o provérbio: “eleição e mineração, só depois da apuração”.
Maurício Costa Romão, é Ph.D. em economia pela Universidade de Illinois, nos Estados Unidos. [email protected]
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