Os russos podem até tomar Kiev e ganhar a guerra. Parecem perto disto. Mas Putin já perdeu. Política e diplomaticamente, Putin tornou-se uma figura desprezível, pela invasão de um país militarmente fraco e pelas atrocidades dos bombardeios das cidades ucranianas. Desde que as tropas russas entraram na Ucrânia, surgem os protestos indignados de quase todos os países e de amplos movimentos sociais, que crescem na medida em que vão se tornando visíveis a cara dramática da guerra e a violência dos ataques e dos cercos das cidades. Esta semana, o Papa Francisco se somou aos protestos mundiais e levantou o tom das suas críticas à invasão, chamando de “agressão armada inaceitável” e lançando um apelo dramático: “Em nome de Deus, peço-vos: parem com este massacre”. Putin poderia lembrar Stalin que, diante de críticas do então Papa Pio XII, teria perguntado, em tom irônico, quantas divisões tinha o líder da igreja católica. Nenhuma, exceto a força moral e a influência na instituição religiosa, com maior credibilidade agora, pela postura humanista e avançada de Francisco. 

Apesar da surpreende resistência da Ucrânia ao poderoso exército russo, é possível que a Rússia venha a ocupar Kiev e implantar um governo fantoche submisso a Moscou. Mas a história mostra que a invasão de um país para impor ou manter uma marionete no poder não costuma terminar bem para a potência invasora. A própria Rússia amargou uma derrota humilhante no Afeganistão, depois de dez anos de guerra e mais de 13 mil soldados soviéticos mortos, ainda durante a União Soviética, e que, segundo alguns historiadores, teria precipitado a sua dissolução. Será que Putin esqueceu? Além do mais, a sua imagem internacional (como também da Rússia) estará, a partir de agora, manchada por esta inaceitável invasão e tentativa de submissão da Ucrânia (desrespeito à autonomia das nações e uso da violência militar para resolver conflitos e alcançar seus propósitos). O contrário da simpatia, admiração e respeito internacional que vem conquistando o jovem presidente da Ucrânia, Volodymyr Zelensky, aplaudido de pé em todos os espaços públicos em que se pronuncia, do Parlamento Europeu ao Congresso dos Estados Unidos. Parece pouco, mas este contraponto moral vale mais que o número de divisões de cada um dos adversários.