Machado de Assis já nos ensinava que um método deveria “ser usado sem terno e gravata”. Os leigos em Supremo Tribunal Federal, dentre os quais me incluo, talvez busquem nas togas de nossa mais alta corte a idealização de um método ou de um rigoroso tecido platônico. Mas o nosso Supremo é “tropical”, como lembrou, com bom humor e sabedoria, Joaquim Falcão, em magistral palestra, na Fundação Joaquim Nabuco, a que tive o privilégio de ouvir não faz muitos anos.
Com um olho em Platão, mas outro olho atento em Aristóteles, Falcão — que há mais de uma década analisa e estuda o Supremo — demonstrou como um novo modo de se fazer Direito influencia a corte. Destacou como as novas Tecnologias da Informação permitem o cruzamento de milhões de dados, proporcionando aos operadores das instituições, a exemplo do Ministério Público Federal, uma agilidade e um poder de informação nunca antes vistos. Destacou ainda a contribuição de uma geração de profissionais do Judiciário que tem juventude e independência. Uma geração que chegou ao poder por concurso e que, sendo bem remunerada, tem garantida a sua autonomia.
Relembro que Falcão evocou o quanto outros “Supremos” de grandes democracias ocidentais têm também assumido um notável protagonismo. Talvez com mais discrição que no Brasil, mas com o mesmo poder decisório de ampla repercussão na sociedade.
Na semana passada, o presidente do Supremo, ministro Luiz Fux, didaticamente enfatizou que aquele egrégio colegiado só se pronuncia quando provocado. Noutras palavras, não se imiscui em nada, como alguns querem nos fazer crer. Ora, ao que se sabe, provocações, nos dias que correm, não faltam; são frequentes não só à mais alta corte do País como à própria Constituição. Daí esse novo protagonismo do Supremo e o esclarecimento de Fux à sociedade, pois forças nada ocultas querem nos fazer perceber o contrário, ou seja, que há uma hipertrofia ou abuso do poder judiciário. O cidadão de bem há de convir que os ataques ao Judiciário, de sabor inequivocamente populista e despótico, são danosos à estabilidade institucional do País. É uma evidência que infelizmente temos de repetir à exaustão. Enfim, o Supremo jamais provoca, é provocado e, uma vez questionado, responde à sociedade e dá a última palavra do ponto de vista constitucional.
A espíritos pouco críticos e a outros simplesmente oportunistas e de má-fé, o protagonismo do Supremo dá azo a opiniões distorcidas. A mais cretina dessas opiniões se escandaliza por não ser o colegiado um lugar de consenso. Mas é justamente na diversidade que está o seu vigor. Nesse sentido, as câmeras de TV que hoje tudo veem fazem um belo trabalho de luz e transparência. Com o protagonismo da mais alta corte, nunca houve tanta necessidade de os seus membros serem didáticos, “terrivelmente” pedagógicos. Às vezes, poucas e curtas frases, como a do ministro Fux, valem por uma aula à própria nação.
Ainda falando como leigo, suponho que o nosso Supremo, ainda que “tropical”, também tem o seu quociente de estresse e, de resto, não é infalível nem onipotente. Muito menos um “time” que agrade sempre aos torcedores da democracia e da justiça. Mas é ele que atualmente, mais que o próprio Congresso, tem defendido o Estado Democrático de Direito e se esforçado para fazer frente ao cesarismo do chefe do Executivo. Infelizmente, para muitas pessoas, isso parece ter virado um biscoito fino e indigesto, como se não percebessem que uma verdadeira e fatal indigestão pode estar a caminho.
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