As manifestações de 2013 completaram dez anos. Elas tiveram um sentido social. E político. Que hoje pode ser enxergado mais claramente. Produziram consequências relevantes: impeachment de Dilma Rousseff, eleição de Jair Bolsonaro, fortalecimento da direita, afirmação de novos atores políticos, congestionamento na avenida Lula-Lira.

1 A força da direita.

Os oito anos de governo de Lula, nos dois primeiros mandatos (2002-2010) e os anos da gestão Dilma (2011-2015) atenderam uma pauta de esquerda. Não só na questão pública da atribuição de cotas na educação. Mas também no quesito privado dos costumes acentuando as políticas de raça e gênero.

O espaço público foi ocupado pelos temas relacionados com as políticas defendidas pela esquerda. Reunidas em três grupos:

A. Política de raça e gênero acentuada nas cotas para negros e defesa da mulher (aborto);

B. Conformação de cenário (mensalão e petrolão) que terminou propiciando discurso de combate à corrupção e execução da operação Lava Jato;

C. Formação de opinião pública favorável a uma política de armamento civil que foi aplicada no governo Bolsonaro.

Com a eleição de Bolsonaro, o discurso e as políticas de direita viram chegar sua vez. Foram patrocinadas ações para combater o aborto e a vacinação. E para apoiar o fundamentalismo religioso, o armamento da população e a privatização.

Nesse período, entre 2018-2022, o discurso de direita foi instrumentalizado. E as correntes de opinião, afinadas com o pensamento conservador, sentiram-se valorizadas.

2 A antipolítica.

Na prática, as pautas de 2013 foram além do preço das passagens de ônibus. Envolveram a má qualidade da oferta de educação, saúde e segurança.

Por outro lado, a gestão da economia, errática nos governos Dilma e Michel Temer, não produziram frutos esperados. As taxas de crescimento do PIB foram negativas ou diferentes de zero. E a taxa de desemprego alcançou dois dígitos.

O clima de frustração social era evidente. O custo social seria debitado no endereço do PT. Com a eleição de Bolsonaro. Que já vinha acalentando o discurso de extrema direita. A atuação da Lava Jato foi destacada com a nomeação de Sergio Moro para ministro da Justiça.

O fato é que, feitas as contas, o legado político da mobilização de 2013 foi parar nos candidatos da direita. O resultado concretizou a eleição de grande maioria de deputados federais de Partidos de direita. Complicando a vida de Lula 3. Que passou a enfrentar na presidência da Câmara, fazendo as vezes de primeiro-ministro, o deputado Arthur Lira. Que recebeu uma joia de presente: um orçamento secreto. Em tempo: uma das faixas estendida na avenida Paulista, em 2013, deu o tom da reclamação coletiva: “Meu Partido é meu país”.

 

3 Os equívocos estratégicos do PT.

Em pouco mais de uma década, de 2003 a 2015, o PT cometeu dois erros sérios:

A A prática do mau uso de recursos públicos no mensalão e no petrolão;

B O apoio ao PMDB no processo de impeachment de Dilma Rousseff.

Certamente essas iniciativas não contribuíram para revolver os problemas apontados nas manifestações de 2013. Pelo contrário. O PMDB, que salvou o Brasil da ditadura pelo senso político de Tancredo Neves, em 1985, quase enterra o PT. A associação perversa entre peemedebismo claudicante de Temer e ideologismo petista não solucionou a questão do desemprego. Nem elevou a taxa de crescimento do PIB além de magros 2%.

As questões cruciais da nação foram sendo empurradas com a barriga da inépcia: não se fortaleceu o SUS; não se incrementou o orçamento de investimentos para saneamento; não se definiu uma política para tecnologia e inovação, destinada a reindustrializar a economia; não se restaurou a consciência do planejamento institucional com efeitos federativos.

Hoje, em 2023, o Brasil não está preparado para o futuro.

4. E o cardápio de futuros do país ?

O Brasil enfrentou, em duas décadas, um conflito de hegemonias. Sem chance para diálogo político de valor cívico. Sem oportunidade para a tessitura institucional de qualidade.

Primeiro, foi a hegemonia da esquerda do PT. Depois, foi a hegemonia da direita militarizada. Num caso, uma soberba que resultou num impeachment. No outro caso, uma alucinação fanática que quase provocou um golpe de Estado. Em ambos os casos, a ausente modéstia. Tão lucidamente mostrada por Voltaire, no Tratado de Tolerância.

O país passou a colocar seu temor democrático nos passos incertos de um pêndulo. Ou estatismo de esquerda. Ou privatismo de direita. Ou a pauta progressista. Ou a pauta conservadora.

Este caminho foi traçado por Barbara Tuchman, autora inglesa. No livro A Marcha da Insensatez ela relaciona uma dezena de exemplos históricos em que a falta de entendimento produziu crises fatais. Trazendo o assunto para o trópico, é possível recordar frase do ex presidente, Fernando Henrique Cardoso: “Só há duas alternativas para o Brasil: governar o atraso ou o atraso governar o país”.

Uma nação com a diversidade do Brasil não admite apenas um futuro. Ou o futuro ditado por uma corrente de sábios do Sião. São vários futuros. Correspondentes aos grupos que compõem a população. É preciso conversar, negociar, ajustar um espaço de entendimento comum. E buscar um futuro-síntese. Que contemple todos os grupos.

Nessa trilha, será oportuno observar três referências:

A. Torcer para que a regra fiscal do ministro Fernando Haddad dê certo;

B. Torcer para haja um acordo entre o presidente Lula e o presidente da Câmara, Arthur Lira. Construir uma ponte Lula-Lira;

C. Torcer para que se resgate o planejamento com prioridades definidas e alcance federativo.