Fernando Menezes defendeu sempre Hugo do Peixa, boêmio famoso e personagem do Recife. Quando perguntavam, indignados, qual a razão?, respondia que era por ser seu “Professor de Maravilhas”. Bela imagem. Assim também tenho Eduardo Galeano. E outros, como ele, que mostram caminhos. Na última coluna, escrevi sobre mais essa estrela que se apaga. E o melhor, para quem escreve, é a reação dos leitores. Que se manifestaram, mais uma vez, com observações interessantes. Entre tantas, seguem umas poucas.
ANTONIO CEZAR PELUSO, ministro do Supremo. Quando uma pessoa como ele se vai, o mundo fica menor. Galeano, um dia, jantou em nossa casa. Sentado no chão.
– Não por falta de cadeiras, espero.
CRISTOVAM BUARQUE, ministro da Educação. Jantar no escritório de Fidel. No meio da conversa, fiz raiva a ele ao dizer que o problema não eram as “veias abertas”, como dizia Galeano, mas os “neurônios tapados”. Se os colonizadores tivessem levado todo ouro, mas deixado o povo educado, o ouro não faria falta. Ele não gostou, pela admiração endeusada dos cubanos pelo Galeano. No outro dia, ainda mandou dizer “que eu exagerava na prioridade à educação”.
– E nem mandou junto um charuto?, que me poderia repassar.
HILDO AZEVEDO, presidente da Academia de Medicina. Quando escrevo, minha primeira ideia também tem que ser a mão no papel. Depois é que passo para computador.
– Prova de bom senso, dinossauro (como eu). E de bom gosto.
IGNEZ BARROS, escritora. Intenso, eclético, entregava-se de corpo e alma à sua escrita apaixonante e combativa. Tinha sede de justiça. Lutava contra o poder opressor, defendendo as causas andinas, ameríndias, os escravos, as mulheres… sem perder de vista a sua poética humanista.
– Vai fazer falta, com certeza.
JORGE GEISEL, escritor. Momo, a deusa da ironia, protetora dos escritores e poetas, era detentora do sarcasmo. E acabou, por isso, expulsa do Olimpo.
– Diga a ela para procurar emprego em algum blogue.
JOSÉ MARIA ARAGÃO, presidente do BNH. Galeano foi um dos colunistas regulares do jornal O Semanário. Publicado regularmente, no Brasil, durante a ditadura militar. E que, curiosamente, fechou logo depois da restauração da democracia.
– Na contramão da história.
LUZILÁ GONÇALVES, escritora. Há meses, uma figura veio me entrevistar. Olhando os livros, perguntou quem era esse Galeano. E na mesma ocasião, vendo na estante Octavio Paz, perguntou se era parente de Ana Paz.
– Recomende a ela (e muita gente mais) voltar à escola.
ONÉSIMO ALMEIDA, professor da Univ. de Brown (USA). Robert Frost, creio, também disse que escrever era a arte de cortar palavras.
– Ele e Onésimo.
Padre PEDRO RUBENS, reitor da Univ. Católica. Fiquei curioso para saber o que Galeano teria escrito em 11 de setembro.
– Nesse dia, escreveu contra o terrorismo. E no seu aniversário (26/8), pastor, sobre Ivan, O Terrível.
JOSÉ TOLENTINO MENDONÇA, cardeal. Prosa saborosa, o amigo nos serve em suas crônicas. Lembrei de você, em especial, porque o Papa declarou esse ano que começa o Ano de São José. Que auspício tão luminoso para os Josés!
– Para todos, José. Fraternalmente. Com os nomes que tivermos – Antônio, Francisco, Luiza, Letícia.
E ninguém observou a autocrítica de Galeano? Eu li em “El País”, 04.05.2014: “Mais de 40 anos depois, Galeano revelou que não leria novamente seu livro de maior sucesso [As Veias Abertas da América Latina]. “Eu não seria capaz de ler de novo. Cairia desmaiado”, disse, durante a 2ª Bienal do Livro de Brasília, realizada entre 11 e 21 de abril na Capital Federal, como noticiaram os jornalistas que fizeram a cobertura do evento. “Para mim, essa prosa da esquerda tradicional é chatíssima. Meu físico não aguentaria. Seria internado no pronto-socorro”, disse o escritor, de 73 anos, durante uma coletiva de imprensa em registro feito por veículos como a Agência Brasil e o blog Socialista Morena.” Ou seja, o próprio Galeano foi, muito antes, o mais “maluquete” desses comentaristas todos.