Desenvolvimento é cultura. Que cultura? Cultura de qualidade. Que instrui. Ensina. E seja exemplar.
Chama minha atenção o fascínio exercido pelo BBB. Sobre pessoas de variada formação. E talento. Detive-me a observá-lo. Por duas ou três vezes.
Para escrever este comentário, vou me servir de leituras que tenho feito. Em jornais do Recife, de São Paulo. E de livros de Jessé de Souza e Mario Sérgio Cortela.
A escravidão é a origem da desigualdade brasileira. E, a partir da exclusão histórica dos negros, surgem privilégios e alianças entre classes sociais.
Na prática, o que tem valido no país é o poder econômico. Dos que se encontram fora do Estado. Verdade que há privilégios incrustados no aparelho estatal. Mas alguns políticos são meros meios de recado.
Execra-se muito a elite política brasileira. Com alguma justiça. Mas esquece-se a elite econômica nacional. Esta é esquecida. Olvidada nas dobras de interesses profissionais. Ela se torna influência invisível.
Nesse contexto, há uma leitura dos brasileiros, feita por Sérgio Buarque de Holanda, de que somos apaixonados. O cordial dele é feito mais de paixão. E menos de cordialidade. É por essa via que se considera o brasileiro sensual, emotivo, hospitaleiro.
O fato é que, ao longo do tempo moderno, consolidou-se, na desigualdade social, a ralé brasileira. Como os franceses costumam designar os pobres. Este é o maior problema do Brasil: a desigualdade. A distância entre os poucos que têm muito. E os muitos que têm pouco.
Norbert Elias defende que a inflexão no processo civilizatório se deu no século 17. Com a extinção da escravatura. Com o olhar para o outro. No Brasil, a escravidão física terminou em 1888. Mas prosseguiu a escravidão social. No patropi, naturalizou-se o desprezo. A indiferença.
As classes médias são parte desse processo. Em grande parte, de um lado, dependentes do poder econômico. De outro lado, (des)solidárias com a ralé.
Nessa altura, entra Habermas. E a esfera do espaço público. Que não se confunde com o Estado. Nem com o mercado. É a região de domínio da opinião pública. Opinião crítica. Essa esfera pública, formada principalmente pelas classes médias, tem inspiração. E transpiração. Quer a verdade. Quer justiça. E assiste o BBB.
Instala-se, então, a indústria cultural. Shows, cinema, streaming, televisão. Onde se busca maximizar o lucro. Lógica do máximo proveito. Envolvendo bens simbólicos. Cria-se um mercado específico. Para comercializar bens simbólicos. Além do mercado da publicidade. E dos bens de consumo de anunciantes conhecidos.
Trata-se de mercado específico de personagens. Celebridades. Mas que celebridades ? Que pedagogia ? Que educação ? Como conciliar a democratização da informação e a mediocrização do lúdico ?
Meus cumprimentos ao autor pela abordagem corajosa do tema. O BBB é uma vergonha para a TV brasileira: voyieurismo, ambição, traição, desfaçatez, vulgaridade, comercialismo, que mais? Profundo efeito deseducativo para massas ignorantes.
Retificando: VOYEURISMO
Não veja nenhuma conexão lógica entre o raciocínio do autor e o programa BBB. O BBB satisfaz o velho desejo humano de curiosidade sobre a vida dos outros. Não é casualidade que o formato de programa foi inventado pela empresa holandesa Emdemol, que inventa e depois vende formatos de programas. Holanda – melhor Países Baixos – tem uma tradição protestante da forma mais purista (no norte, não no sul. que é católico) E o crente tem que mostrar este purismo, por exemplo deixando as janelas sem jalousies ou cortinas – assim se verifica a sua vida de virtude. Quem não fazia isso, tinha que pagar um imposto especial. Esta tradição é ainda viva: passando pelos bairros se pode ver o que se faz em cada casa, especialmente na tarde e noite.
Este é o verdadeiro transfundo do BBB e a fonte de inspiração da Emdemol – e fonte de sucesso comercial. Aliás, na maioria dos países o BBB nunca teve um sucesso nos canais principais, no Brasil sim. Talvez porque a Globo como maior TV escolheu o BBB apostando na curiosidade dos brasileiros e na vontade de fofoca sobre os outros?