Duvido do impeachment do capitão. Não o enxergo cumprindo todo o mandato, engraçado. Mas não creio que possa cair por impedimento. O Congresso fatura horrores com a fragilidade dele e o ponto de inflexão, o momento do abandono à própria sorte ainda está comparativamente longe – apesar das pautas quentes que chegam da Índia. Para Artur Lira, o punhal permanece na bainha. Quanto mais sangrar, melhor.
Acredito mais na renúncia, na alusão a forças ocultas, na tentativa de dar um golpe branco, à la Jânio Quadros. Isso dito, vamos admitir que o capitão seja candidato em 2022. De novo, acho que as chances dele são modestas, mesmo que a economia vá bem – como tudo indica que estará. Acho que dificilmente passaria do Primeiro Turno, seja qual for o instrumento da vontade popular – eletrônico ou celulósico.
Mas vamos admitir que passe.
Vamos admitir que tenhamos no Segundo Turno ele, o capitão, e o outro. O que penso? Que ele tem tudo, tudinho, para perder. Que pode estrebuchar, se descabelar, convocar passeata de moto, trator, carro de boi, arado e teco-teco… mas vai perder. Você me pergunta: não é melhor ir pela sombra e garantir uma chapa à prova de susto? Sim, eu também acho.
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É aqui que entra um pouco de cálculo político. Ora, qualquer candidato é melhor do que o capitão. Eu, você, Renato Aragão, o frentista, Narjara Turetta, Xororó, o primeiro suplente de vereador de Xapuri, qualquer um ou qualquer uma. Lula é um bom nome? Não é ruim porque é o que pontua melhor nas pesquisas. Não é bom porque provoca mais do que rejeição: é, ao seu modo, um detonador de ódio.
Convenhamos: não por ele e por seus pecadilhos – que o momento pede que esqueçamos. Mas pelo que representa seu famigerado partido, formado por um núcleo de negocistas sem quaisquer compromissos com o País. É o decantado bolchevismo sem utopia, de que fala Serra.
Responsável, em última instância, pela gestação e nascimento político do capitão, o PT é uma nódoa na vida brasileira. Só há duas que são maiores: a escravidão – que é a perfídia da perfídia. E o capitão, o maior flagelo político da história republicana, maior até do que Dilma Vana, figura que nos inspirou um misto de perplexidade com piedade cristã. Lula deixou suas digitais ali também. Mas esqueçamos…
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O que quero dizer? Para termos uma super chapa, na impossibilidade de Lula ceder lugar a José Eduardo Cardozo (nem parece que é do PT – digo parafraseando Lula na Namíbia, quando ele disse, com razão, que nem parecia estar na África), eu diria ao meu conterrâneo que se candidatasse a Vice. E que cedesse a cabeça da chapa a Tasso Jereissati. Ou seja, que reeditasse a esperteza de Cristina Kirchner que, tendo voto e prontuário (e inteligência), deu um passo para trás e foi ser Vice.
No Palácio do Jaburu, Lula seria feliz. Namoraria até tarde, petiscaria seu coelho assado com uma lapada de Salinas, nos representaria no enterro de Ortega, assistiria à leitura da sentença em Haia e, com sua experiência, estaria a postos se as coronárias de Tasso dessem outra pifada, levando-o a abrir o peito e/ou a ficar inoperante por uns tempos. Ou pior, toquemos na madeira. A presença de Tasso seria, em tese, uma garantia de que Ciro iria aprender o que é compostura – porque deve tudo a ele – e o Brasil agradeceria.
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Tasso seria nosso Biden. Perdão, sei que a fórmula é surrada, mas não é de todo ruim. Faria a transição da semi-barbárie para a democracia plena. Nos tiraria do limbo internacional e restauraria a representatividade da função. Promoveria as reformas e Lula trataria de frear o sectarismo de nossa esquerda – talvez uma das mais desmoralizadas do mundo.
Em 2026, o jogo é outro, já não cabe palpitar. Pode ser até que o capitão abençoe da Holanda a candidatura do filho mais novo, o predador do condomínio da Barra. De Bangu, o filho mais velho se tornará amigo de Sérgio Cabral – tem de tudo no Rio – e farão planos para formar o “Grisalhos do Castor”, um bloco para marcar história em 2032, quando estiverem em condicional.
Enfim, o mais difícil aí não é nem Tasso aceitar. Com jeito, a família é capaz de se dobrar porque ele é teimoso. O problema é Lula entender que como Vice presta melhor serviço ao País. E que ainda pode morrer com nossa gratidão. Estaremos prontos para aplaudir esse renascimento. É essa minha visão do quadro.
Esta chapa nos tiraria da beira do abismo. E minha geração viveria o fim da vida com esperança pelo Brasil de nossos filhos e netos.
Uma proposta engenhosa, mas racional e aceitável, amigo Fernando Dourado. Bem vindo de volta às nossas edições!
Obrigado, caro amigo.
Um abraço,
Fernando
Caro Fernando, bom tê-lo de volta.
Achei que você pegou bem pesado quando disse que só duas outras nódoas seriam maiores do que o PT na vida brasileira: a escravidão e o capitão.
Mas não quero polemizar.
Ao contrário, quero dizer que um dia desses, assistindo a uma entrevista de Tasso, pensei numa proposta ainda mais ousada e utópica do que a sua: Lula pegar um avião, ir a Fortaleza, descer na casa do senador e propor: “Tasso, vim aqui lhe oferecer a presidência! Se apresente como candidato e escolha alguém do PT, que não seja eu, para vice. Topa?”
Como vê, também estou me entregando a devaneios… Inúteis, no caso, porque políticos não costumam ter essa grandeza.
Sempre fui e ainda me considero um homem de esquerda, mas não gostaria de ter de votar em Lula pela quinta vez!
Caro Luciano, obrigado por seu comentário. Muitos consideram que Lula é incapaz de evoluir, que o personalismo está umbilicalmente ligado à sua personalidade política e individual. Eu acho que ele pode evoluir sim. E pode perceber que, se eleito, metade da base de apoio não-fisiológica, já lhe seria oposição no dia seguinte. E que, para se compor no Congresso, nós teríamos a reedição do déjà vu – o loteamento de cargos orquestrado por Dirceu e a entronização do que Serra definiu como o “bolchevismo sem utopia”. Lula podia ser o que quisesse num governo Jereissati – daria um bom chanceler. O PT é um partido sem expressão. Tem um mínimo de população governada e só concebe fazer política à moda africana: empregando parentes, embalando projetos de perpetuação no poder (isso quase sempre termina na cadeia) e drenando recursos para a militância e para os adesistas de ocasião. É um padrão, eles não concebem outro. Lula é dez vezes maior do que o partido. Lula sabe onde e por quê eles fracassaram como equipe, entupindo as celas. Lula não é mais criança. A candidatura dele poderia ser a chance do Cloroquina permanecer no poder. Sim, o PT foi uma praga. O padrão de oposição que eles inauguraram foi nefando. Mas ainda é um mal menor do que o capitão. Se o capitão desmoraliza a direita, o PT avacalhou a esquerda. Abraço, Fernando
Fernando Dourado , não sabia que essa revista era veiculo de campanha eleitoral., como também não sabia que retirar milhões de pessoas da pobreza extrema, via PT, era “a” desgraça tão grande , por você pontuada.
Luzia, Não é ponto de vista da revista. É ponto de vista pessoal meu de que não faço segredo. O PT foi um flagelo. Basta ver a indigência de quadros. Para mim, os únicos nomes que permaneceram imaculados no partido – e que nele ficaram – são os do ex-Ministro da Justiça, José Eduardo Cardoso; de quem gosto desde a vereança aqui em São Paulo; o do negocista Palocci, que, pelo menos, tem capacidade de formulação, mas que parece que caiu em desgraça com eles. E mais do que Haddad – anódino, mais vagão do que locomotiva – , o de Jaques Wagner, que tem seus motivos para querer voltar para Ondina e levar a vida em paz. Já pulou muita fogueira. A esquerda tem outros bons nomes – não no PT -, mas eles ainda não se saíram bem em eleições majoritárias. Nesse embate em torno de Lula, tiro por mim. Se o preço para tirar o Invermectina for votar em Lula, eu voto nele. Também gosto de uma branquinha, há um mínimo de sintonia, ademais de Garanhuns. Mas, no dia seguinte à posse, já tenho tudo para ser oposição. Conforta saber que temos Lula com bons números. Mas inquieta saber que é ele que o Azitromicina gostaria de ter do outro lado. Nesse ponto, Cristina Kirchner é uma mulher de grande inteligência. Brega, histriônica, populista e desonesta. Mas jogou o jogo com maestria, salvando a pele, ocupando a ribalta à espera das prescrições. Homem, no geral, é muito burro para isso. De nossa força, vem nossa fraqueza. Grato pela visita, Fernando.