Sérgio C. Buarque

Madona - Edward Munch ( 1895).

Madona – Edward Munch ( 1895).

Tem pessoas que são superlativas na vida, consigo mesmas e com o mundo. Não gostam de nada nem de ninguém, amam ou odeiam. Para elas, nada é normal, morno ou apenas agradável. Todo adjetivo ganha um “íssimo”, máximo superlativo, muitíssimo ou pouquíssimo, belíssimo, lindo ou feiíssimo, horrível. Quando amam, elas se esborracham numa entrega total, num absolutíssimo e apaixonadíssimo sentimento. Mas, quando odeiam se descontrolam na repulsa ao objeto detestável, igualmente apaixonadíssima. A temperatura nunca está boa ou morna, varia entre o gelado e o insuportavelmente quente, aliás, elas odeiam qualquer coisa que flutue na média. Como assim, nem belo nem feio? Ou é belíssimo ou horrível. E as ideias? Ou são brilhantes ou ridículas, verdade absoluta ou uma grandessíssima mentira ou imbecilidade. Mesmo que algumas vezes possa até inverter os qualificativos, continuará se diferenciando entre o maravilhoso e o desprezível.

 

Temperamento forte, fortíssimo, na verdade, estas pessoas não dialogam, brigam, não conversam, discutem, não relaxam nunca, estão em permanente estado de tensão para fora e por dentro. Brigam com seus próprios sentimentos, exageram na sua própria avaliação, flutuando da mais alta autoestima à total desqualificação, de maravilhosa a inútil num piscar de olhos, sem uma transição por moderada avaliação. As pessoas superlativas sofrem muitíssimo, mas também vivem intensa e fortemente as emoções e os prazeres da vida, não suportam o tédio e os momentos de suave tranquilidade. Estas superlativas criaturas não conhecem a melancolia, na tristeza preferem logo a angústia, se é para sofrer que seja a dor profunda que esmaga a alma. Em compensação, quando encontram os prazeres agarram com superlativa emoção, muito mais que feliz, felicíssimo, porque, afinal, a felicidade é sempre uma coisa suave, quase morna.

 

As pessoas superlativas são poetas na vida mas, de tão intensa entrega à existência, dificilmente conseguem escrever poemas, apenas vivendo e padecendo poeticamente. Para manifestar em verso ou prosa suas emoções superlativas precisariam de um momento de solidão, elas e uma folha de papel. Nunca! Isso é totalmente insuportável para as superlativas. Precisam de gente para amar e odiar, com quem discuta e brigue, para expressar suas angústias e manifestar suas fortes paixões. Mais vida no seu tempo, mesmo que perca tempo na sua vida. Ser superlativa não é uma escolha, é um destino. No máximo podem deixar o destino tomar conta da sua vida ou procurar moderar os impulsos superlativos. Moderar? Nunca! Moderação é a palavra mas detestável para uma pessoa superlativa, insuportável, tão horrível quanto morna, insossa, suave, melancólica.