Luciano Oliveira

Jornaleiro.

Como os sete dias de descanso que me dei da RPB (Realidade Política Brasileira) se escoaram, volto ao batente. Tanto mais que, imaginem vocês, a semana passada estive em Brasília! Não, não fui fazer política. Fui para um evento comemorativo dos 60 anos de um jurista pernambucano lá radicado faz tempo: Marcelo Neves, hoje em dia um dos nomes mais importantes da teoria do direito – e, creiam, não só no Brasil… Marcelón,como carinhosamente o chamo, é literalmente “Pernambuco falando para o mundo!” Além de ilustre, Marcelo Neves é um bravo e, vez por outra, um brabo. Junto com outros juristas, é coautor de um pedido de impeachmentcontra ninguém mais, ninguém menos, do que o ministro Gilmar Mendes. O empreendimento, claro, não vai prosperar. Mas, para usar um termo que ele gosta de usar num sentido teórico, que não tem nada a ver com briga de vizinhos, a ação pedindo o impeachment, pelo menos, provoca “irritação”. Desunidos ideológica e politicamente, ambos, no momento, estão objetivamente no mesmo lado da trincheira, pois partilham a tese da inconstitucionalidade da execução de sentença penal condenatória antes do seu trânsito em julgado. A posição de Neves data de muito tempo. A posição de Mendes, de apenas alguns meses… Como diria Machado: “Mudaria o Natal ou mudei eu?” Um dia, respondendo essa interpelação, compus um hai-kai mal feito que aqui transcrevo:

Mudamos ambos.

Eu, porque envelheci.

O Natal, porque envileceu.

Aproveitei a viagem e tirei uma folga para flanar pela Esplanada dos Ministérios. A Catedral de Brasília, que sempre me lembra o cálice da última ceia emborcado, continua sendo um exemplo da capacidade humana de transcender sua miserável condição. E, caminhando por aquela perspectiva que é uma das mais bonitas do mundo, eu e minha mulher terminamos no prédio do Supremo. Foi no dia em que uma das turmas estava decidindo aceitar a denúncia contra o senador Aécio Neves, tornando-o réu numa ação penal. Não pude assistir ao julgamento. Estava sem paletó, indumentária exigida para adentrar aqueles solenes espaços. Mas essa dificuldade até que poderia ser contornada, porque é possível conseguir um paletó emprestado de uma cabideira que lá existe para sujeitos incautos como eu, segundo me disseram. O problema realmente incontornável era que eu estava de tênis, e eles não têm sapatos para emprestar!

Na caminhada pela Esplanada dos Ministérios aconteceu uma coisa engraçada. Num dos prédios, numa quina perto do chão, notamos uma solitária letra D. Era uma letra do mesmo tamanho e formato das que, bem acima, formavam o nome do ministério em questão. (Não lembro mais qual era.) Minha esposa fez uma observação engraçada: “Será que é uma letra que deslizou?” Até que poderia ser, mas não era, porque nas letras que compunham o nome do ministério não estava faltando nenhuma. Começamos a brincar com aquilo e cheguei a aventar a hipótese de que seria a letra inicial de um novo ministério, e que, com a rapidez com que se fazem e desfazem ministérios na República dos Bruzundangas, antes que a novidade chegasse a sair no diário oficial, o Palácio do Planalto já tinha mudado de opinião. Os operários já teriam colocado a primeira letra mas, em pleno serviço, teria chegado uma ordem: “Pára, pára tudo!”. E eles, pelo sim, pelo não, deixaram lá a letra solitária. Quem sabe não poderia um dia servir?

Depois, na continuidade da caminhada, descobrimos que ela era, prosaicamente, apenas uma letra indicando que era o prédio D da Esplanada, como existem os prédios A, B, C… Coisas de Brasília, onde as “ruas” se chamam SQN 1, 2, 3… Ou SQS 1, 2, 3… Vôte! Parece coisa de repartição pública. Mas, pensando bem, Brasília não será a maior repartição do país?

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Ah… Brasília! Um sonho de Kubitschek que se tornou realidade. Sonho de “Nonô”, como era carinhosamente chamado, mas também de Carlos Niemayer, Lúcio Costa, Burle Max, Alfredo Ceschiatti…  Era também a época de Tom Jobim, Vinícius de Moraes, Carlos Lyra, João Gilberto… A mesma de Gregório Bezerra, Francisco Julião, Celso Furtado, Darcy Ribeiro… Nossa! Acho que o Brasil em que nasci e em que fui menino era melhor e mais bonito. Mas, porém, todavia, contudo, não obstante… Diabo! Há sempre uma conjunção adversativa na nossa vida. O aprendiz de sociólogo que sou lembra que foi também naquela época, na amena cidade de São Sebastião do Rio de Janeiro, que apareceram os primeiros Esquadrões da Morte no Brasil… É Lasca!