Luciano Oliveira

Jornaleiro.

“Uêba! Uêba!” – como diz o Macaco Simão. Esta semana, só tem crítica cultural.

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Finalmente, com vários meses de atraso, conheci, via YouTube, Jojô Todynho e seu mega-sucesso Que tiro foi esse?Transcrevo os primeiros versos:

“Que tiro foi esse?

Que tiro foi esse que tá um arraso?!

Que tiro foi esse, viado?

Que tiro foi esse que tá um arraso?!”

Discute-se se isso que aqui no Brasil é (foneticamente) chamado de “fanque” seria realmente funk. Minha filha me disse uma vez (não sei se estou reproduzindo fielmente o que ela disse) que não; que o funkoriginal é, na sua gênese e em suas expressões, um gênero de afirmação da cultura black e de denúncia da discriminação – em primeiro lugar policial – que ainda hoje pesa sobre a comunidade afro-americana. Segundo entendi do que ela me disse, algo análogo ao que foi entre nós a “música de protesto” dos anos 60, um movimento que expressava a luta por valores como liberdade e dignidade humanas contra o que chamávamos de “sistema”. Se é assim – aqui sou eu que estou falando –, o impulso “protestativo” que também existiria no “fanque” brasileiro não tem nada a ver com o que se faz por lá, uma vez que não consigo ver ou ouvir no que aqui se pratica algo além de ostentação, músculos, banhas e machismo. Geralmente numa linguagem aberta ou veladamente pornográfica. Haverá algo menos “anti-sistema” do que isso? Acho mesmo que tudo isso é a expressão mais boçal do sistema! Mas reconheço que sou suspeito para falar. Como tenho uma repulsa que chega a ser física pelo gênero (que Ariano Suassuna chamaria de “funque”), falta-me um mínimo de “simpatia analítica” que me permita ir além das reações epidérmicas e poder dizer algo que vá além de uma opinião pessoal.

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Mas já que falei em opinião pessoal… Uma semana dessas vi na TV uma matéria sobre a Bienal de Artes de São Paulo deste ano, onde predominam – claro! – instalaçõese performances. Contra uma parede, um sujeito, sentado em cima do que parecia um monte de areia, tinha as pernas dobradas e mexia freneticamente os dedos junto ao queixo. Parecia alguém fazendo “laboratório” para interpretar um doido de Antonin Artaud. Achei engraçado. E me lembrei de um outro episódio. Alguns anos atrás, numa outra exposição na mesma Bienal, um dos milhares de epígonos de Marcel Duchamps (criador da chamada “arte conceitual”) colocou junto de uma parede uma “instalação” que consistia em alguns tijolos negligentemente “esquecidos” em cima de alguns nacos de cimento. Mas, no dia mesmo da abertura da exposição, um trabalhador da empresa contratada para supervisionar os serviços, fazendo uma derradeira inspeção e defrontando-se com aquilo, achou que um colega seu não tinha feito corretamente o trabalho e livrou-se daquele troço. Me digam se não é engraçado…

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E a campanha eleitoral deste ano (certamente driblando as inextricáveis disposições da nossa legislação) já começa, aqui e ali, a aparecer nas ruas. Um dia desses, tomando minha cervejinha no “quiosque de Dona Socorro” que fica perto de minha casa, anotei no meu caderninho os dizeres de um banner pendurado num poste bem em frente:

TONHO DO CEDRO VEM AÍ!

APOIO À [sic] SERGIO MORO

Sim, assim mesmo, com “a” craseado. Não sei quem é Tonho do Cedro. Nem a que cargo ele concorre. Mas, com certeza, nele não voto. Claro: todos os que conhecem minhas inclinações de esquerda acreditarão que não vou votar no sujeito porque não morro de amores pelo judge show. Ok. É verdade que não môro… digo, morro de amores por ele. Mas, acreditem ou não, minha razão é outra. Acontece que tenho verdadeira idolatria por Graciliano Ramos. E, como todo mundo sabe, o “velho Graça” era um comunista de carteirinha. Pois bem. No romance Angústia, o alterego do autor, um áspero sujeito chamado Luís da Silva, defronta-se um dia com uma pichação nos muros da cidade: “Proletários Univos” – em lugar de “Proletários, uni-vos”. Luís fica puto da vida, porque não aceitava que a coisa fosse escrita “sem vírgula e sem traço”. E completa: “Queriam fazer uma revolução sem vírgulas e sem traços? Numa revolução de tal ordem não haveria lugar para mim.” Comigo é parecido: não voto em que não respeita a crase!