Os brasileiros querem ver Renan Calheiros pelas costas, fora da Presidência do Senado, cassado e preso. “Fora Renan” foi a nota dominante nas manifestações do último domingo, em várias capitais do Brasil. Neste sentido, a liminar emitida pelo ministro Marco Aurélio Mello, afastando Renan da presidência do Senado, teria sido uma resposta a este anseio popular. Mas as deliberações e decisões do STF, e a posição de cada um dos seus ministros, não têm que atender ao “clamor das ruas”, devem ser técnicas e jurídicas. A decisão monocrática do ministro Marco Aurélio, contaminada pelas manifestações do domingo, foi intempestiva, e atropelou o andamento da votação no plenário do Supremo Tribunal Federal, temporariamente suspenso por pedido de vistas de outro membro do Supremo, o ministro Dias Tóffoli. Não existia nenhuma urgência, nenhuma iminência de quebra da legalidade e das regras constitucionais, como a possibilidade de o presidente do Senado assumir a Presidência da República, nada que justificasse uma iniciativa isolada e liminar. A decisão precipitada do ministro incendiou o ambiente político, criando novo foco de instabilidade num momento de grave crise social e econômica, e de delicada pauta de votação no Senado. Mais grave que a destemperança de Marco Aurélio foi a reação do senador Renan Calheiros, escondendo-se do oficial de justiça, recusando assinar a notificação e, com apoio da Mesa Diretoria, ignorando a decisão judicial, num claro e inaceitável desrespeito à Justiça. Em condições normais, o senador e os membros da Mesa Diretoria deveriam ter sido presos pela rebeldia, independentemente da desproporção da decisão monocrática do ministro Marco Aurélio. A precipitação de um lado, e a desobediência do outro, jogaram o Brasil numa delicada crise institucional. Para contornar a crise, o plenário do STF desautorizou claramente a liminar do ministro Marco Aurélio, justificando implicitamente a rebeldia do Senado e do seu presidente. Como réu, ele não poderá assumir a Presidência da República, no caso de vacância e de impossibilidade por parte do presidente da Câmara de Deputados, mas pode continuar como presidente do Senado. Uma manobra jurídica com substrato político, para a correção das lambanças de Marco Aurélio e Renan, e para a restauração momentânea da estabilidade política e institucional do país.
É desse modo que se garante a estabilidade institucional do país ? Bom exemplo!
Claro que não, Lucila. Foi uma terceira lambada: tentando corrigir duas outras, mas uma lambada. Não se pode corrigir um erro com outro; mas, neste caso, a lambança foi mais para preservar o ministro Marco Aurélio da mancada do que para salvar Renan. Foi uma sequência de lambanças. De Renan não se podia esperar nada diferente mas a lambança mais absurda, a meu ver, provocando uma desestabilização sem fundamentos, foi de quem menos se poderia esperar, de um ministro do STF. No meu entendimento, se alguém no cargo não pode entrar na linha sucessória também não poderia continuar no cargo. Se estou certo, a decisão foi também uma lambança. Das três lambanças, a menos grave, sendo a mais absurda a do próprio Marco Aurélio. Entretanto, considerando a independência dos poderes, cabe à Câmara de Deputados e ao Senado escolher o seu presidente e outro poder, no caso no STF, não pode interferir. Pode até prender o senador, como fez com Delcídio, mas não impedir sua eleição pelos pares. Vale lembrar que Delcídio foi preso mas quem tirou o mandato foi o Senado e não o STF.
Expressei a mesma posição e considerações semelhantes às deste editorial, que é exemplo de prudência. Acirrar o confronto só agravaria a incerteza. Isso do ponto de vista político. Quanto ao argumento legal e constitucional, foi convincente a maioria do Supremo Tribunal Federal, inclusive a Presidente Carmen Lúcia, visivelmente preocupada com o clima de ofensas e confronto. A insegurança jurídica geral não pode ser atribuída neste momento ao STF, e sim, ao fato de que tantas leis brasileiras, e até a Constituição, permitem interpretações divergentes.
Que fazer diante de uma Constituição que suporta “canetadas”?
O artigo foi até gentil com o pró-ativo ministro, principalmente agora que se sabe que ele insiste que a Câmara cumpra uma outra liminar sua e instaure processo de impeachment do Presidente da República, iniciativa que sabidamente é exclusiva do presidente da Câmara. Para tão importante decisão também lhe ocorreu levar a liminar a seus pares.