Editorial

Infelizmente, para os brasileiros de boa-fé, as notícias que nos chegam da nossa Corte Suprema continuam desanimadoras.  O ministro Alexandre de Moraes, encarregado do inquérito aberto, discricionariamente, pelo presidente do STF, para apurar a responsabilidade por difamações e “fake news” contra a cúpula do nosso Judiciário, ordenou a retirada do ar de matéria das revistas eletrônicas Crusoé e O Antagonista.  Elas estariam incorrendo em supostos crimes de injúria, calúnia e difamação contra o Colegiado, na augusta pessoa do seu chefe.  E o que temos a dizer sobre isso?  Em primeiro lugar, a interpretação do dispositivo legal do Regimento Interno do STF que embasou a instalação do inquérito (art. 43) é especiosa.  O RI refere-se a ilícitos cometidos “no âmbito ou nas dependências do Tribunal”, e não é este o caso.  Aliás, o tortuoso entendimento adotado leva a uma aberração lógica, que se contrapõe ao próprio princípio republicano da separação dos poderes: quem tem a missão de julgar não deve investigar.  A investigação é tarefa do Executivo, através da polícia, no primeiro nível, e do Ministério Público no segundo, tendo este, como um quarto poder, a missão de acionar o Judiciário, em seu duplo papel de guardião da lei (“custos legis”) e defensor do interesse coletivo.  Em segundo lugar, a publicação motivadora da radical medida de censura – que fere o princípio constitucional da plena liberdade de expressão – reporta apenas fatos declarados em depoimento prestado em inquérito corrente.  Não há como ver nisso o “animus injuriandi, difamandi ou caluniandi”, requisito indispensável à configuração dos crimes contra a honra das pessoas.  Além disso, a dignidade da instituição não é atingida por desmandos do seu presidente.  Este, aliás, já vem perdendo o respeito há algum tempo: não se considerou impedido de julgar questões que envolviam seus antigos chefes, concedeu, “motu proprio”, habeas corpus para tirar da cadeia o principal deles, José Dirceu, réu em inúmeros processos, e forma no time dos que querem reverter a orientação jurisprudencial da prisão após condenação em segunda instância.  A infeliz decisão de agora, de que são responsáveis o criador e o encarregado do “inquérito”, além de desabonadora para ambos, resulta, afinal, contraproducente: nada mais atrativo para o público do que aquilo que se quer ocultar.  A reportagem teve e terá amplo conhecimento pelos cidadãos brasileiros. E perde o STF, menos talvez pelos fatos divulgados do que pela bisonha atitude de tentar escondê-los.