Luiz Otavio Cavalcanti 

Na Segunda Guerra, no ataque aliado à cidade alemã de Dresden, morreram 25 mil pessoas. Também no final do conflito mundial, 1945, duas bombas atômicas foram lançadas sobre o território japonês: em Nagasaki, morreram 70 mil pessoas. E, em Hiroshima, morreram 140 mil pessoas.

No semestre letivo de 2018.1, fui designado para dar aulas sobre Direito Previdenciário. E, nele, comentar sobre o SUS. Estudei o sistema de saúde único do país. Aprendi várias coisas. Que o SUS é modelo francês onde funciona muito bem. Que, para funcionar bem, precisa de condicionantes relacionados à população. As condicionantes são saneamento, habitação, educação, emprego, segurança, lazer.

Na sua arquitetura, o SUS se baseia em princípios. São eles: universalização, descentralização, equidade e integralidade. Ou seja, pretende beneficiar a todos os brasileiros. Inclusive imigrantes legais. De modo descentralizado, por meio da atuação operacional dos municípios. Onde estão conselhos comunitários. O sistema atua conforme as necessidades de cada brasileiro. E busca satisfazê-las integralmente, física e mentalmente.

Aprendi muito. Gosto da medicina. Como ciência e como prática social. Sou filho de médico. Sogro de médica admirável. Afeiçoei-me ao ambiente da profissão. Observando a amizade de meu pai com seus colegas médicos: José Nivaldo, Fraga Rocha, Jameson Ferreira Lima. Convivendo com graduados e os que viriam a graduar-se no ramo de Hipócrates: Guilherme Robalinho, Oscar Coutinho, Luis Fernando Salazar de Oliveira, José Ricardo Lagreca, José Maria Pereira Gomes.

Firmei a convicção de que o SUS é estrutura bem formulada. E bem aplicada. Suas dificuldades operacionais, decorrem mais da ausência dos fatores condicionantes, mencionados acima. A maior prova de que se trata de esquema bem concebido foi certificada com o desempenho no atual episódio do coronavírus.

Ora, o governo Bolsonaro fez tudo, até o improvável, para precarizar a ação do SUS. Deixou um ministro interino (que não é médico) respondendo pelo ministério da Saúde; militarizou a gestão ministerial desorganizando a administração especializada da pasta; bloqueou a articulação interinstitucional do setor com estados e municípios por razões políticas; propalou a falsa impressão de que há tratamento apto a enfrentar o corona; promoveu imagem pública sem máscara e com aglomeração humana contra indicação sanitária; sabendo-se que figura presidencial, em princípio, é exemplar.

Na conjuntura da doença, o SUS funciona no limite de suas carências. E na ausente coordenação do presidente da República. Que se abstraiu a si próprio. Amputou o espectro da eficiência presidencial. Como se fosse dirigente de Belarus. Sem ofensa. Ou, diante de gélidas reações ao que se passa no coração da nação. Como se fosse o homem que distraidamente veio do frio.

A população brasileira está, agora, atropelada por dois problemas: um, médico, relacionado com o quadro da covid 19. Em que termos a doença vai evoluir ? De que forma imperfeita, falha, será conduzida a atuação destinada a enfrentar o vírus ? E qual o custo, em vidas, desse fazer incompleto e irresponsável ?

O outro problema é político. As Forças Armadas, tão vocacionadas para agir em defesa dos objetivos nacionais permanentes, continuarão a oferecer fiança política a governo administrativamente tão desastrado ? E moralmente tão insultado pelo ardor de nepotismo ? As Forças Armadas são órgão da estrutura orgânica do Estado brasileiro. O governo é temporal, adventício. Vem, é visto e passa.

No sábado, 8 de Agosto de 2020, assisti na tv programa de entrevista. Reunindo os ex ministros da Saúde, Luis Mandeta e Nelson Teich. E mais o ex diretor do ministério, David Uip. Em sessenta minutos de conversa, foi produzido um conjunto valioso de informações sobre a doença. Do passado, uma avaliação do que aconteceu. Do presente, um painel de como se encontra a situação sanitária do país. E do futuro, quais são as perspectivas de controle do vírus.

Oportunidade rara para que a população saiba o que está ocorrendo. Porque o ministro general, obedecendo ordem do presidente da República, suspendeu as rodadas de informação técnica sobre o desenrolar da covid 19. Ou seja, silêncio tumular.

Mas, para espanto geral, ferindo mais fundo a sensibilidade das pessoas, não faltou a agressão final, contundente. O escárnio. No dia em que se contaram cem mil mortos. E os presidentes dos demais Poderes da República lamentaram o fato. Solidarizando-se com as famílias. O presidente Bolsonaro gravou vídeo, rindo. Celebrava a vitória de seu time.