A socióloga Esther Solano aponta três características do perfil social do brasileiro: patriarcalismo, machismo e religiosidade. Esse perfil poderia explicar certo traço autoritário da sociedade brasileira. Como defendem Jorge Chaloub e Pedro Luiz Lima, da Universidade Federal do Rio de Janeiro.
Mas, tem mais. Essa avaliação sociológica é avalizada, a meu ver, por um dado socioeconômico: a desigualdade de renda entre os brasileiros. Basta referir duas informações: a concentração de renda, segundo a qual os 5% mais ricos concentram metade da renda nacional. E a distância qualitativa entre escola pública e escola particular. A evasão escolar na periferia é quatro vezes maior do que as de classe média.
Essas informações representam duas pontas sensíveis da realidade. Que se tocam. A educação, início do processo de formação profissional. Que vai qualificar ou não o estudante futuramente para o mercado. E o nível de renda, resultado que expressa qualificação e preparo do profissional para o trabalho.
É conhecida a relação funcional e estratégica entre qualidade do ensino aos estudantes e patamar de renda dos profissionais ocupados. Aqui, entra a prioridade para a educação sob o ângulo da justiça social. Mas, há outro ângulo de observação menos comentado: a desigualdade social como fator de reforço ao autoritarismo.
A pobreza sofre três tipos de fragilidade: de renda, de usufruto de bens e serviços, e de acesso ao poder. Menos renda significa menos conhecimento e menos consumo. Menos usufruto de bens e serviços significa menos qualidade de vida, de saúde, de informação. Menos acesso ao poder significa menos capacidade de influir sobre decisões que interferem na sua vida, na sua comunidade, na sua corporação.
A confluência desses três tipos de fraqueza é o que propicia injustiça, num polo social. E possibilita privilégio, noutro polo social. O nome do conjunto dessas fraquezas é desigualdade. Essa é a paisagem no domínio econômico e social. Mas, há um terceiro círculo: o político. Neste, a desigualdade estimula o autoritarismo. Por que? Porque os pobres não dispõem de informação sobre as coisas, não têm acesso ao poder e não influem sobre decisões que lhes dizem respeito. Eis é o prefácio do populismo. Irmão gêmeo do autoritarismo.
Esses fatores, a desinformação, falta de acesso e baixa influência sobre decisões públicas, incentivam o surgimento do populismo. Que é discurso falso e mentiroso ao povo. O povo pouco instruído aceita mentiras. Porque não sabe exercer senso crítico. No rastro do falsete populista, vem o autoritarismo. E o que é autoritarismo? É quebra da legalidade; percepção de vantagens indevidas; bloqueio de investigações de poderosos; tentativa de golpes de Estado.
Aqui, revisamos o raciocínio para voltar ao ponto inicial do argumento: a democracia. Povo educado é povo insurgente. Ressurgente. Povo educado é povo crítico, lúcido. Povo educado é povo mais difícil de enganar. E povo mais difícil de enganar tem mais chance de viver numa democracia. Por isso, antes de ser recurso ideológico, educação é instância democrática.
O feto é o pai do homem. Por Meraldo Zisman
By Chumbo Gordo 3 semanas ago
(MENS SANA IN UTERO SANO)
Os meses que vivemos no útero materno são os mais espantosos de nossas vidas.
Existe uma ligação entre baixo peso ao nascer e o desenvolvimento embrionário fetal que acontece na vida intrauterina quando são geradas patologias que se instalam durante uma gestação humana. Um bom ambiente uterino é fator marcante para a vida das pessoas. Os meses que vivemos no útero materno são os mais espantosos de nossas vidas.
O baixo ou o aumento do peso ao nascer pode ser causado pela chamada resistência fetal à insulina, para citar um exemplo. Desequilíbrio hormonal e outros podem ser causas subjacentes de variadas nosologias que predisponham o indivíduo a diferentes distúrbios na infância ou mais tarde, como a esquizofrenia.
Percebeu-se que a fome vivida pelos holandeses no final da Segunda Guerra Mundial afetou os fetos de então. Era o inverno de 1944. Durante meses, as tropas alemãs bloquearam o suprimento de comida para grande parte do território holandês, deixando 4,5 milhões de pessoas em situação de fome extrema, o que criou um conjunto de acontecimentos, permitindo o estudo da desnutrição materna e da psicopatologia filial vividas pelos holandeses em comparação com países cujas populações eram bem alimentadas, no curto intervalo dessa guerra. Os estudos visavam a relação sobretudo entre patologias do denominado primeiro trimestre de uma gestação e outras adversidades causadas pela fome bélica.
Relacionar a desnutrição materna com futuras doenças como diabetes, vasculares, hipertensões, esquizofrenia, foi tecnicamente possível, porém não com a Fome Intergeracional, aquela que acontece entre duas ou mais gerações, muito bem exemplificada pelo que ocorre há séculos no Brasil. Denúncia que fiz através do meu livro Nordeste Pigmeu — Uma Geração Ameaçada publicado em 1987 e republicado pela Editora Paradoxum em 2022. Mais recentemente, troquei a frase A criança é o pai do Homem por esta: O feto é o pai do Homem.
Esclareço: homem com H maiúsculo significa o gênero humano, que é o único gênero vinculado ao Homem. Nada a ver com o sexo que a criança tem ao nascer.
E mais: a fome materna durante a gravidez leva a situações como a enfrentada pelo povo Yanomami, fato que uma parte da mídia esquece, ao querer apontar culpados pelo que se passa com aquele povo.