O discurso foi afinado. Todos concordam com ele. O longo prazo é claro. Sabemos o que queremos. Problema é como chegar a ele. Nada fácil, para um mundo que apresenta interesses concretos que se rivalizam no curto prazo.

Desenvolvimento sustentável é a expressão orientadora. Todos almejam isso. Parece claro que se deve compatibilizar as visões econômicas e sociais com as ambientais. Como chegar a isso é um dilema. Como passar de um mundo em que o modo de produção era excessivamente poluidor e predatório para aquele em que haja uma harmonia entre as ações do homem e a preservação da natureza? 

Tem-se claro, como bem ressaltou Georgescu-Roegen, muitas décadas atrás, que a ação humana necessariamente traz impactos ambientais. Ele ressaltava que em qualquer atividade humana, ao se transformar recursos naturais em produtos e serviços, há um dispêndio de energia, e o sistema não se recompõe da mesma maneira, ou seja, há uma geração de resíduos e subprodutos que podem trazer impactos negativos à sociedade. O problema é como minimizar esses efeitos, fazendo com que se conviva melhor, de uma maneira em que não se ameacem os ecossistemas e se possa dar continuidade à vida com segurança no planeta.

A que vem esse discurso? Estamos numa época de transição. Em que se tem consciência dos resultados nocivos que se geraram para o ambiente, em que se tem claro que a continuidade do modo de produção industrial, em seu modelo atual, pode levar à inviabilização das condições de vida adequadas às  espécies existentes, inclusive a humana.

Nesse cenário, procura-se um caminho para um novo perfil de convivência e um novo modelo de produção e consumo. E nele, um problema fundamental é o ritmo em que se farão as mudanças, como elas impactarão a sociedade, como se viverá o período de mudanças em que necessariamente conviverão os dois perfis.

Ambientalistas radicais exigem que sejam feitas todas as mudanças de imediato, que se mude o padrão atual instantaneamente por um novo em que a hegemonia seja exclusivamente a preservação e conservação dos ecossistemas, a qualquer custo. Isso, sem concessões.

Defensores do atual sistema, que chamo de modo de produção capitalista, minimizam os estudos que são feitos, alegam que as conseqüências não são tão catastróficas, que se pode continuar com o sistema atual por um bom período sem ações extremas de devastação. Não admitem nem que sejam feitas algumas adequações institucionais ou mesmo mudanças tecnológicas que poderão mitigar problemas.

Evidentemente, entre essas duas posições extremadas há uma ampla faixa para ações que diminuam os impactos e para caminhos mais compatíveis para uma adequação a um novo modelo.

A isso chamamos de época de transição, sempre difícil de enfrentar, onde o embate se dará de uma maneira mais acirrada, constantemente.

Definiu-se a Descarbonização como a meta principal, como o caminho a ser buscado pelos mais diversos países, como o indicador de efetivas mudanças. 

Com desafios muito específicos para serem cumpridos até 2050. A ONU é o fórum em que o debate ocorreu, metas difíceis de conseguir (dificuldades com rebatimentos), que parecem bastante previsíveis de não serem alcançadas. Nesse contexto, a questão energética passa a ter relevância principal, decreta-se que a era do petróleo como fonte energética tem que acabar.

Mesmo concordando com isso, é fundamental apontar que pelo lado econômico, essa matéria prima continua sendo uma reserva de valor importante, não só como motora da matriz produtiva, mas como riqueza que pode garantir recursos para as mudanças desejadas. Esse quadro não permite ignorá-la, muito menos desprezá-la, na busca de soluções para os problemas das sociedades, para permitir a transição, inclusive para as áreas menos desenvolvidas que tem problemas sociais, como a pobreza e a fome, por exemplo, a resolver.

A preocupação atual do Brasil, de se mostrar como um exemplo de economia sustentável, de buscar novos caminhos para sua evolução, é mais que louvável e essencial na estratégia de desenvolvimento que ganhou as eleições de 2022. No entanto, difíceis escolhas aparecem nesse caminho e têm que ser enfrentadas.

Um debate que surgiu nesses dias se refere à busca de confirmação se há petróleo na Margem Equatorial, importante riqueza que pode, em muito, ajudar na sustentação econômica da Petrobrás e gerar recursos que permitirão a adequação da sociedade brasileira. Fala-se na existência de uma reserva equivalente à do Pré-Sal.

Não é fácil. Os órgãos ambientais têm negado a perfuração de um poço exploratório em águas profundas, para cubagem da reserva e confirmação de seu potencial. Não é exploração comercial ainda, deixe-se claro. Há razões técnicas para essa negação, uma bacia sedimentar vulnerável, em que se pedem garantias para conter qualquer problema que porventura possa ocorrer. Em que se exigem estudos mais aprofundados e estruturas de resolução de possíveis problemas bem próximas ao possível poço.

Cabe ressaltar que países vizinhos como a Guiana e Suriname começam a fazer a exploração em áreas contiguas, o que dá maiores garantias de haver uma quantidade significativa do óleo na região. Além de eles fazerem exigências ambientais muito menos rígidas, o que tem levado  grandes empresas multinacionais a se interessarem pelas áreas, inclusive a Petrobrás.

A Petrobrás alega que em poços exploratórios jamais teve problemas. Também mostra que, ao contrario do que tem sido divulgado, a região não é na Foz do Amazonas, fica a mais de 540 quilômetros desta, e a mais de 160 do ponto terrestre mais próximo no Amapá. Também dispõe-se a criar mecanismos de proteção mais eficazes e a aprofundar os estudos. Já foram feitos investimentos na região que devem ser amortizados e gerar os lucros compatíveis.

O problema alegado pelo IBAMA é que, se houvesse um desastre, o óleo se espalharia em menos de 12 horas para áreas terrestres vulneráveis e a assistência técnica demoraria dias.

Posições defensáveis, tanto da companhia como dos órgãos de fiscalização. O problema é não radicalizar, e manter uma atitude de negociação na busca de entendimentos que podem ser construídos.

Numa época de transição, inúmeros problemas como este surgirão. Opositores ao modelo de desenvolvimento que se procura implantar no país, ou mesmo pessoas bem intencionadas que têm posições menos flexíveis em relação à questão ambiental, apontarão como contradições irreparáveis de um governo que não sabe o que quer. Proteger o ambiente ou garantir recursos financeiros? É o que vejo todos os dias nos blogs e jornais que leio. 

Esquece-se que é um período de mudanças em que obrigatoriamente têm que conviver os dois sistemas de produção. A questão é técnica, mas também de visões de mundo. Fundamental enfrentá-la com ponderações construtivas. 

Ceder a argumentos plausíveis faz parte do processo evolutivo. Ter consciência de que se deve ter uma visão ambientalista, para preservar os ecossistemas, sem deixar de entender que é fundamental ter meios que garantam melhores condições sócio-econômicas à população brasileira no curto e médio prazo, faz parte do projeto que queremos para o País. 

Todos que estiverem envolvidos na busca de um modelo mais democrático e participativo devem ter isso claro. Não cair em discursos catastrofistas e negacionistas. Novos problemas deste teor surgirão, faz parte de uma época de mudanças rápidas. Nessa direção, a mesa de entendimento é a melhor solução.