Restaurante Adega, uma mesa de amigos. A conversa gira em torno da política e as eleições do ano que vem. Palpites são dados e caminhos vários apontados. Um, mais sábio, faz uma afirmação que chama a atenção. “Se quiserem saber o que vai ocorrer estudem o Projeto de Lei Orçamentária Anual- PLOA enviado e as modificações que estão fazendo.” Não entendi na hora, mas fui seguir o conselho.
É elaborado pelo Poder Executivo e proposto até 31 de agosto do ano anterior ao de sua vigência. Trata-se de um único documento, constituído por três partes: o Orçamento Fiscal, o Orçamento da Seguridade Social e o Orçamento de Investimento das Empresas Estatais. O Projeto de Lei Orçamentária Anual é elaborado pelo Poder Executivo.
O de 2024 vê um crescimento do PIB de 2,3%, inflação (IPCA) de 3,3% e ganho real acima da inflação de 2,9% para o salário mínimo, previsto em R$ 1.421,00 a partir do começo do próximo ano. Cenário nada ruim e aponta para rumos que eram esperados.
Diz o texto: “No PLOA 2024, as projeções de receita e de despesa totalizam R$ 5.543,2 bilhões, sendo R$ 151,3 bilhões destinados ao orçamento de investimento das empresas estatais e R$ 5.391,9 bilhões aos orçamentos fiscal e da seguridade social. Destes, R$ 1.736,5 bilhões se referem ao refinanciamento da dívida pública federal, que consiste na amortização do principal da dívida contratual ou mobiliária com recursos obtidos a partir da realização de novas operações de crédito (emissão de títulos). “
Bom notar como os credores governamentais têm prioridade e garantias nos gastos que se pretende fazer. Seu ressarcimento corresponde a mais de 32 por cento do total a ser gasto pelo erário federal.
Aprofundando um pouco, verifica-se que a maior parte dos recursos vai para despesas obrigatórias, como saúde, educação, pessoal, benefícios previdenciários, pagamento de precatórios, entre outros. Nessas, pouco se pode mexer ou alterar. Juntando com os juros da dívida, são mais de noventa por cento das despesas. Importante entender melhor as despesas discricionárias, aquelas em que é possível assumir prioridades e definir caminhos.
Nesse contexto, os investimentos são importantes. Está previsto pouco mais de 210 bilhões de reais, sendo 59 bilhões nos orçamentos fiscal e da seguridade social (leia-se Governo Federal), e 151,3 bilhões no orçamento de investimento das estatais. Estatais, como por exemplo, a Petrobrás, têm importante papel na garantia dos investimentos. Os recursos do Governo Federal estão fortemente atrelados ao Novo Plano de Aceleração do Crescimento-PAC, tendo um passivo de obras inacabadas muito grande, que devem ser priorizadas. O PLOA 2024 prevê a aplicação de 69,7 bilhões de reais sob responsabilidade direta do Governo Federal. Este é o papel do Executivo e não traz grandes novidades.
O que chama a atenção são os recursos que serão disponibilizados para o Legislativo, emendas impositivas que não podem ser negadas ou postergadas. Valor que chega a cerca de 60% do valor disponibilizado para o Executivo, e não passa necessariamente por um planejamento ou estratégia de crescimento nacional ou regional. Dispersão de recursos que podem ser viesados por interesses político-eleitorais.
Segundo a Agência Senado, “o projeto de lei enviado pelo governo ao Congresso Nacional nesta quinta-feira (31 de agosto) com a proposta de Orçamento para o ano de 2024 prevê R$ 37,6 bilhões para emendas parlamentares.” Emendas parlamentares individuais ou de bancada, de execução obrigatória, um aumento de 14% em relação a 2023.
“Emendas parlamentares são recursos do Orçamento que deputados e senadores podem determinar onde serão aplicados. Geralmente, a verba é repassada para obras e projetos nos Estados de origem dos parlamentares”. Leia-se para seus redutos eleitorais, as chamadas bases parlamentares.
Ainda deverão ser acrescidas as chamadas Emendas de Comissão, mais um mecanismo de empoderamento dos parlamentares que não estava contemplado na proposta enviada. As emendas individuais passaram de R$ 21 bilhões para R$ 25 bilhões, e as de bancada, de R$ 7,7 bilhões para R$ 12,6 bilhões.
O critério de distribuição passa por a Câmara ter 77,5% do valor e o Senado o restante. Nesse processo, o que se verifica com uma simples conta de divisão, como são 513 deputados e 81 senadores, em 2024 o valor para cada deputado, em média, será de 37,8 milhões, e para cada senador, de 69,6 milhões de reais. Um mecanismo muito eficiente para garantir apoio político e direcionar lógicas em ano eleitoral.
Sem contar, também, que o Parlamento quer mudar o Fundo Eleitoral, dinheiro que os Partidos podem usar diretamente na campanha. Quer passar de um pouco menos de um bilhão proposto na PLOA para o aprovado em Comissão Parlamentar, um valor de cerca de cinco bilhões de reais. Um absurdo que se espera não se concretize.
Muito pertinente a observação do amigo na nossa mesa de conversa. As próximas eleições estão fortemente condicionadas à PLOA 2024. Por um lado, a busca de ter sob sua direção importantes estatais, como a Caixa ou a Petrobrás, faz com que se garantam recursos de investimentos pesados, que influenciem as localidades onde forem realizados. Por outro, as emendas impositivas garantem currais cativos.
Antigamente, distribuíam-se sapatos, cimento e tijolos, agora as emendas garantem quadras esportivas, padrão de uniformes, festas populares. Pouco mudou no conceito.
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