A Venezuela está em crise, grave crise. Mas o discurso ufanista do governo bolivariano apresenta outro país ou simplesmente responsabiliza os outros (oposição, imperialismo, mercado e imprensa) pelas mazelas que não pode maquiar e esconder. O abismo que separa a versão governamental da realidade da Venezuela é o que mostra artigo do sociólogo e intelectual venezuelano Ignacio Ávalos publicado no El Nacional neste 12 de fevereiro (antes das manifestações e da violência política em Caracas). Numa tradução livre ele comenta: “Dizem que avançamos no caminho da soberania alimentar, mas a realidade mostra que serão gastos milhões de dólares em importações porque, do contrário, não comeremos. Que houve avanços notáveis na diversificação da economia, mas os fatos mostram que nunca dependemos tanto do petróleo. Que está sendo implementado um novo modelo econômico e, no entanto, a realidade afirma que temos apenas um vulgar capitalismo de Estado. Que nos orgulhamos do bolívar forte quando, na verdade, a economia gira em torno do dólar paralelo. Que nossa democracia é um exemplo no planeta e a realidade denuncia que, ao contrário, o poder não tem contrapesos institucionais. Propaga-se a honradez socialista, mas a realidade diz que a corrupção cresce como alface. Que a classe operária é a vanguarda da mudança, quando a realidade demostra que continua crescendo a burguesia socialista. Que apontamos em direção ao século XXI, porém a realidade diz que estamos politicamente mergulhados em velhas ideias, deixando de lado as reflexões feitas pela esquerda após a queda do muro de Berlim”.
O fato é que os governos populistas, assim como os partidos e governos salvacionistas, não só na Venezuela, não têm qualquer compromisso com a verdade. E se os fatos se rebelam, que os prendam, ora, porque devem estar a serviço da burguesia, do neoliberalismo e do imperialismo americano. Ou então amordacem os meios de divulgação que ousam dar voz aos incômodos e teimosos fatos. Se a inflação dispara e não é suficiente maquiar os números para esconder o que os cidadãos sentem nas compras, basta encontrar um inimigo e reprimir o mercado, esta invenção demoníaca.
A Venezuela vive uma grave crise econômica, resultado de voluntarismo na condução da política macroeconômica, típica de governos populistas que acham que podem tudo com o grito. A inflação, o desabastecimento e o mercado negro (de mercadoria e de dólar) desorganizam a economia e corroem o poder de compra das famílias, combustível que acelera a insatisfação da sociedade. O desequilíbrio econômico e a insatisfação social acentuam o confronto político, chavismo e anti-chavismo, numa violenta disputa de desdobramentos imprevisíveis.
O presidente Nicolas Maduro, populista sem nenhum carisma que recorre ao fantasma de Chavez para sobreviver, continua lavando os seus erros com o “detergente ideológico”, na expressão utilizada por Inácio Ávalos, e jogando a culpa do próprio fracasso na oposição e no inimigo externo, o perverso imperialismo americano, ou criminalizando a imprensa portadora das más noticias. Este desgastado e anacrônico “detergente ideológico” ainda confunde muita gente mundo afora, incluindo muitos brasileiros sérios e honestos que, olhando a Venezuela de longe, preferem se orientar pelo velho palavreado, tão agressivo quando ingênuo, do bolivarianismo.
Caro Sérgio:
Sua análise sobre o populismo na Venezuela está muito boa. O que vejo de mais grave, não apenas na Venezuela, mas em todos os partidos populistas da América Latina – em sua grande maioria fundado em teses esquerdistas, obsoletas e anacrônicas – é o enorme prejuízo causado às importantes correntes históricas revolucionárias cujo veio central vem do marxismo.
Como você cita, confunde as novas gerações de militantes idealistas envolvidos com as lutas de emancipação social, e porque não falar dos velhos militantes, que frustrados pelo fim da experiência socialista ( há quantos sonhos! quantas vidas!) impossibilitados de elaborarem este luto do fracasso histórico estão algemados com suas mentes a alça do caixão que resistem em enterrar.
Penso sempre que se Karl Marx estivesse vivo, hoje ele estaria mergulhado em seus estudos tentando compreender ( talvez em Harvard ou na London School, ou onde Engels pagasse) este capitalismo da era da sociedade da informação, onde a mais valia foi pras cucúias (pelo menos em mercadorias constituída de puro conhecimento ) e as relações entre capital e trabalho são invertidas em favor da segunda e, onde o principal ativo das empresas do conhecimento desce de elevador todos os dias, pois estão na cabeça dos empregados e não nas máquinas.
Cabe a nova esquerda (onde estão?) aprofundar-se na compreensão do capitalismo e explorar suas contradições, forjando políticas públicas estrtuturadoras que atenuem os impactos perversos do capitalismo.
Isto que está aí: Venezuela e outros exemplos são extrato de pó de m…. do lixo da história. Não servem prá nada como experiências históricas políticas,apenas como piada para a direita gozar e “se achar” sobre o que outrora moveu gerações de idealistas que sacrificaram suas vidas por um mundo mais justo.
A omissão dos países da América, a cá de baixo, é lastimável. Agora é tipo não me meto no problema dos outros por respeito à soberania nacional.
E a intervenção no Paraguai, já foi esquecida?
Quando nos livraremos dos mais diversos “ismos”, sobretudo do cucarachismo?
Espero que o oportuno artigo de Sérgio Buarque gere muitos comentários. Apresso-me, pois hoje é o baile do Siri na Lata, honra e glória da resistência nos anos setenta e mesmo agora engasgadas por patolas diplomáticas na goela.
Evoé.
Venezuela é caso agudo na AL. Caracterizado pela conjunção perversa entre neo populismo e capitalismo de Estado. Ocorre que, no caso, falta a Maduro o talento de outros líderes regionais que souberam usar carisma e corporações. De Peron a Getúlio. Então, usa as milícias que mataram a bela miss veneuelana.
Por outro lado, o capitalismo de Estado, apoiado na monoprodução de óleo, esgotou-se. E distribui a escassez de bens na economia nacional. O cenário é desalentador não porque sem saída internamente. É desalentador porque os organismos regionais latinoamericanos estão crivados ideologicamente. E não cobram as mortes que acontecem entre a população. Nem pressionam pela normalização democrática do país.
A região é espaço agreste de liberdade. Onde pigmeus ideológicos, vestidos de Evos, Dilmas e Maduros, colocam a AL nas cavernas do tempo político.
Sempre seu, Sérgio.
vejo que os comentários acertaram na mosca, o imperialismo o egoísmo e que são o causador de todos os problemas do mundo, se fossemos menos egoísta, não teríamos fome no mundo. eu gostaria de ver, comentários sobre nossos problemas, de saúde habitação educação segurança .