Sérgio C. Buarque

Além da brilhante atuação do Ministro da Saúde, destoando da imbecilidade do seu presidente, o Ministério da Economia começou a reagir com medidas para moderar os impactos econômicos e oferecer alguma proteção à população mais vulnerável, já projetando o aumento do déficit primário para R$ 200 bilhões, seguramente subestimados. Certamente as medidas monetárias e fiscais ainda são limitadas, como comenta a maioria dos economistas. Como se trata de uma calamindade pública, o Estado é o último recurso para conter o desastre econômico, social e sanitário.

Entretanto, ninguém parece refletir sobre o outro lado da equação, vale dizer, a necessidade de assegurar receita suficiente para dar conta do crescimento das despesas primárias, evitando o desmantelo completo das finanças públicas. Com a queda do PIB neste ano de recessão, a receita pública vai declinar, exatamente no momento em que o Brasil mais precisa de recursos para uma atuação mais ousada do governo. Por isso, é necessário aproveitar o estado de calamidade para negociar e tomar decisões que permitam reduzir algumas despesas e aumentar a receita pública. Para alimentar o debate, estão sugeridas abaixo quatro ideias controversas que permitem, de forma emergencial, melhorar a capacidade financeira da União neste momento difícil para a economia e a sociedade brasileiras.

  1. Adiamento para o próximo ano da devolução do Imposto de Renda da Pessoa Física dos beneficiários que têm mais de R$ 5.000,00 a receber. Com dados de 2019, apenas 5,45% dos beneficiários seriam atingidos com a medida, permitindo uma poupança nesta crise de, aproximadamente, R$ 9 bilhões (36,4% de todo o valor de devolução).
  2. Transferência da cota das emendas parlamentares para investimento na saúde pública, representando R$ 15 bilhões de reais. Embora as emendas parlamentares se voltem, no geral, para investimentos nos municípios, não constituem prioridade neste momento.
  3. Limitação do pagamento dos salários e dos benefícios da previdência dos servidores públicos nos próximos meses a um teto de R$ 10.000,00 mensais, jogando a diferença para pagamento no próximo ano. Cerca de 29,4% dos servidores federais ganham mais de R$ 10.500,00, sendo que 18,4% têm remuneração acima de R$ 13.000,00; os beneficiários do Regime Próprio da Previdência Social que recebem também valor superior aos R$ 10.500,00 são 14,4%. Limitando, transitoriamente, o pagamento de servidores aos R$ 10.000,00 a União pode reduzir bastante os gastos com os dois (servidores ativos e inativos), permitindo a sua alocação na saúde e na moderação da recessão econômica e do desastre social resultante. É difícil estimar o valor total que a União economizaria, mas não seria nada inferior a R$ 50 bilhões de reais.
  4. Aplicação de uma taxa especial de 10% sobre dividentos distribuídos pelas empresas. Atualmente, a distribuição de dividendos é isenta e a cobrança desta taxa não penaliza a empresa, porque incide sobre os acionistas que, em geral, têm renda elevada. O resultado aproximado, com valores de 2016, pode ser maior que R$ 27 bilhões.

Diante desta dramática situação do Brasil, é necessário rediscutir o emaranhado de privilégios de vários segmentos dos servidores públicos, especialmente do Judiciário, e dos políticos, e o exagerado Fundo Eleitoral, como forma de poupança de recursos públicos para as prioridades de enfrentamento da pandemia e moderação da crise econômica. As estimativas apresentadas acima são ainda imprecisas, demandando análise e cálculos mais detalhados e rigorosos, constituindo apenas ordem de grandeza dos recursos, para orientar a reflexão. Trata-se de um chamado para pensar nas alternativas de geração emergencial de receita, para dar conta das demandas fiscais deste momento grave da vida nacional.