A concorrência de empresas e países pela produção de uma vacina segura e eficaz contra o Covid 19 gerou resultados excepcionais num intervalo muito curto de tempo, demonstrando o enorme avanço da ciência mundial. No entanto, a concentração do conhecimento científico e do poder econômico leva a uma profunda desigualdade no acesso às diversas vacinas testadas e produzidas.
O Reino Unido saiu na frente, os Estados Unidos e a Europa seguem logo atrás, China e Rússia também vão iniciar o próximo ano com uma vacinação em massa da sua população. Se a OMS – Organização Mundial da Saúde não entrar em cena com a aquisição e a distribuição das vacinas nos países de menor desenvolvimento, milhões de pessoas no mundo vão ainda conviver por mais tempo com o virus.
O Brasil tem vantagens pela competência científica e pela parceria com dois dos principais laboratórios de pesquisa, e tem pressa, no momento em que mergulha numa nova onda. Mas, a concorrência no nosso país tende a atrasar a vacinação, por conta de uma contaminação ideológica ridícula do presidente da República e uma disputa política com o governador de São Paulo, seu potencial concorrente às eleições presidencais.
Bolsonaro diz que não vai comprar a “vacina chinesa”, e o Ministério da Saúde anunciou a compra de 100 milhões de doses da vacina da Astrazeneca – Universidade de Oxford, prevendo a vacinação no primeiro semestre do próximo ano. O Instituto Butantan deve chegar primeiro. Começa, na próxima semana, a produção de 46 milhões de doses, prometendo iniciar a vacinação em janeiro, desde que seja aprovada pela ANVISA. Boas perspectivas para 2021. Mas desde que a disputa volte aos limites da racionalidade e do rigor técnico que merece a saúde pública. Dá para acreditar?
O que esperar da ANVISA? Bolsonaro nomeou o presidente da ANVISA, o contra-almirante Antonio Barra Torres, que é médico e cirurgião, mas provoca dúvidas sobre sua independência porque em março apareceu ao lado de Bolsonaro em ato político em Brasília, os dois sem máscara. Também nomeou diretora a médica e ex-diretora de hospital Cristiane Jourdan, que o apoiou na campanha pela cloroquina para tratar Covid. Agora, em novembro, Bolsonaro encaminhou ao Senado a indicação do tenente-coronel reformado do Exército Jorge Luiz Kormann, para chefiar a unidade da ANVISA encarregada dos imunizantes. Os funcionários da ANVISA e das agências de regulação denunciaram a falta de experiência relevante do tenente-coronel, que deverá substituir a farmacêutica Alessandra Bastos Soares, cujo mandato termina 20 de dezembro. Esperemos que o Senado cumpra o seu papel exigindo competência correspondente ao cargo.