Sérgio C. Buarque

The Idleness of Sisyphus Sandro Chia (Italian, born 1946) – Acervo MOMA

The Idleness of Sisyphus Sandro Chia (Italian, born 1946) – Acervo MOMA

Aos poucos, os governos vão introduzindo na gestão pública mecanismos de avaliação por resultados, substituindo a velha métrica que julgava apenas a eficácia, ou seja, a capacidade de executar as ações. Embora correta, a análise dos resultados não é suficiente para avaliar a qualidade de um governo na medida em que os impactos das ações e projetos implementados tem, normalmente, um prazo lento de maturação no tempo. Em outras palavras, o desempenho da realidade atual decorre muito mais do que foi feito no passado, mesmo em governos anteriores, que propriamente na atualidade. Da mesma forma, o que estiver sendo implantado agora, pelo governo atual, pode ter seus resultados computados apenas alguns anos depois de uma eventual mudança de governo.

Por conta dessa defasagem temporal entre a ação e seus resultados, a avaliação do governo atual deve conter uma métrica adicional diretamente relacionada às prioridades governamentais, e em quais segmentos e áreas o governo está concentrando suas energias e recursos e quais os resultados que podem gerar no futuro. Para tanto, devem ser identificadas as prioridades e analisadas as relações delas com as expectativas de desenvolvimento de médio e longo prazo do país. Como forma de simplificação, podemos utilizar um indicador que diferencia a estratégia em duas áreas diferentes: investimento em educação – componente central de mudança social (redução das desigualdades sociais e melhoria da competitividade econômica) e gastos em assistência social – resultado imediato na moderação da pobreza e do sofrimento dos mais pobres. A educação gera resultados lentos no tempo, detectados nos próximos governos, mas promove mudanças efetivas e duradouras; a assistência social promove melhoras imediatas, perceptíveis no atual governo, mas não sustentáveis no longo prazo.

A relação dos recursos alocados nestas duas áreas indica uma postura de prioridade governamental, sendo mais estratégica e transformadora quanto maior a proporção da educação frente a assistência social. Se chamarmos esta relação de índice de postura estratégica teremos uma medida da orientação do governo que nos permite avaliar até que ponto ele está criando as bases para o desenvolvimento futuro do país.

Vamos chamar de postura estratégia um índice que mede a relação entre gastos do governo com educação e com assistência social. Qual é o pressuposto para adoção destas duas variáveis? Como podemos avaliar os últimos governos do Brasil com este índice? No ano 2000, a União gastava 2,2 vezes mais recursos em Educação do que em Assistência Social; em 2002, último ano do governo de Fernando Henrique Cardoso, esta relação já tinha caído para cerca de 1,69 vezes, iniciando um movimento de redução da postura estratégica do governo brasileiro, dando destaque crescente à assistência conservadora em detrimento da educação. Esta inversão se acelera durante os dois governos de Luís Inácio Lula da Silva e no primeiro governo de Dilma Roussef; em 2003, primeiro ano do governo Lula, a União já gastou quase o mesmo valor em educação e assistência social (relação de apenas 1,05 vezes). Desde então, os gastos com Assistência Social da União superam as despesas com Educação, flutuando a relação em torno de 0,9 vezes. O nível mais baixo registrado, em 2006, foi de apenas 0,77 vezes.

Em valores absolutos reais, nos últimos anos do governo de Fernando Henrique os gastos com Assistência Social subiram 8,19% ao ano enquanto as despesas com educação ficaram praticamente estagnadas (declínio de 0,29% ao ano); no primeiro mandato de Lula a diferença foi mais gritante: crescimento de 22,96% ao ano das despesas com assistência social contra um declínio real de 2,45% ano na educação.

As louváveis políticas sociais – que se iniciam no segundo governo de Fernando Henrique e se intensificam na gestão do PT – tiveram resultados positivos na área social mas evidenciaram uma orientação assistencialista e não estratégica. Desta forma, o efeito positivo de curto prazo pode estar sendo obtido, com resultados perceptíveis no governo atual, mas com o comprometimento dos resultados estruturadores de médio e longo prazo. Uma estratégia de desenvolvimento de longo prazo que enfrente a pobreza e as desigualdades de forma estrutural e não apenas reduzam e moderem sua intensidade e escala, pressupõe um movimento inverso ao que estamos observando: crescimento dos gastos em educação permitindo a redução da necessidade futura de assistência social, de tal modo que a relação se amplie continuamente em vez de declinar, como estamos observando desde o ano 2000.

No sentido inverso, como estamos observando, o crescimento desproporcionalmente alto da assistência social (em relação à educação), retirando recursos de áreas estratégicas, tende a perpetuar a necessidade de gastos assistenciais e adiar as medidas estruturadoras de mudança que enfrentam e combatem efetivamente a pobreza e as desigualdades sociais.