Polarização by Ricardo Cammarota.

 

Minha fonte nutriente de vida não é o civismo. Não consigo mais ver o Brasil como uma musa onde desaguam minhas expectativas. Quem teve a vida que tive e deitou âncora em tantos lugares, aprendeu a amar no vazio e no absoluto. O nacionalismo soa abjeto e o patriotismo é um pastiche. Com isso quero dizer que não é o “auriverde pendão da minha terra, que a brisa do Brasil beija e balança”, que me revira a cabeça, que me faz perder o senso de proporções, que me motiva a arregaçar as mangas. Pergunto: será que já foi assim? Em certo sentido, foi. Mas digamos que mudei. E resolvi dedicar o resto da vida a explorar o mundo a meu modo – escrevendo e compartilhando.

Mas tampouco sou um blasé. Desde que recebo um aceno, uma convocação que fuja da mesmice, quase sempre me animo. Por viés de temperamento, gosto das pautas grandes, das questões estruturantes. Venho de fábricas e elas me fascinam. Dediquei anos ao projeto de lançar um satélite geoestacionário com sócios pinçados a dedo para controlar nosso espaço aéreo – mormente os buracos negros da Amazônia – e nossa meteorologia. Estudei transposição de águas, multimodalidade de transporte fluvial, complexos de biotecnologia e fui um dos bons players mundiais em commodities agrícolas, filamentos químicos e nitrocelulose. Sou assim.

Dentro dessa visão delirante e algo messiânica de mim mesmo, fico sujeito a ciclos – como todo portador de alguma psicopatia. Nos últimos dias, cheguei praticamente sozinho a algumas conclusões: a) O capitão (me recuso a declinar o nome) não chega ao Segundo Turno em 2022, mesmo que permaneça elegível até lá; b) Lula tem tudo para chegar lá; c) O oponente de Lula será egresso da Terceira Via; d) Este adversário ganhará de Lula com folga; e) O nome dele ainda não está na boca do povo; f) Ele não virá de partidos grandes, interessados em engordar bancadas e, mais adiante, em equilibrar a governabilidade; g) Como Macron, ele virá na crista de um Movimento.

Dos que têm nome cogitado, as pesquisas a que tive acesso indicam claramente que os 25 grandes colegiados eleitorais nacionais – recortados, aliás, por um pernambucano – um candidato é visto com puro certamista, achando que o que importa é ganhar e pouco se lixando para com a empatia e a esperança. Os demais são monocórdios: saúde, educação, reforma fiscal – mercê do caos que varreu seu estado em dado momento -, justiça lato sensu, ademais dos que pleiteiam um segundo mandato eletivo majoritário ou aquele que, sempre que chega aos 12%, dá um tiro de bacamarte no pé e pula feito saci por mais 4 anos. O povo percebe isso com clareza. E os apoiadores também!

É claro que os apoiadores da Terceira Via, tão sedentos até 6 de setembro, entraram em crise depois do dia 7. Com o advento do fracasso do dia 12, a labilidade se aprofundou. Do pico, desceu para o vale. Só pode! Egressos do mercado financeiro, planilheiros por vocação, a leitura do momento é metabolizada como um sismógrafo em dia de terremoto. Até o fim do ano, o capitão vai empurrar o Brasil contra as cordas pelo menos mais duas vezes. Quem poderá articular um movimento capilar em fevereiro-março? Nem com muito dinheiro, se consegue lhe dar tração. A hora é agora! Quem é coxo parte cedo! Ver o populismo pelas costas me faz acordar cedo e dormir tarde.

Essa história de contar com a sorte e com o improviso é uma facada na água. Que eles – aqueles dois que sonham em ter o outro como adversário, por saberem que aí se esgotam suas únicas chances de se eleger – continuem fazendo pouco caso da Terceira Via. Ela virá e vai prevalecer. É ululante que o capitão é a pior opção para o Brasil. É evidente que Lula pode ter algum mérito, mas quem vem atrás verá um episódio de reparação – como se a absolvição o fizesse menos ladravaz do que foi! Fato é que ambos mergulhariam o Brasil no caos até o primeiro dia de 2027. É tempo demais. O Movimento tem que ouvir o Brasil. E encontrará a forma de fazê-lo bem até fevereiro.

Tivesse eu alguma dúvida de que não derrubaremos os populistas, já teria voltado para meu retiro dos Pirineus para curtir o outono, fazendo valer minhas vacinas. Nessas horas, embora o patriotismo seja o último refúgio dos canalhas – como consagra o ditado -, sinto um alento novo em ficar por aqui e dar uma força ao processo. Quem sabe não teremos bons ventos? Acreditem, a Terceira Via vai prevalecer.